27/02/09

Chico Buarque – Budapeste, D. Quixote, por Pássaro Dodot


Comecei a medo, praticamente forçado por um berro do Grão que me espetou com o livro na cara e gritou: «LEVA!». Li as primeiras páginas cheio de preconceitos – afinal um músico genial não pode ser também, um escritor brilhante, há princípios, o Criador não pode deixar que o mesmo homem reúna tanto génio disperso em artes tão diferentes. Mas não é que Budapeste é um excelente livro? O músico Chico acaba por fazer sombra ao escritor Chico – mas este não sai diminuído do confronto e sabendo nós o que o músico vale, imagine-se em que patamar coloco o escritor Buarque. Deixo-vos com a banda
http://www.youtube.com/watch?v=wFPPawLq_5Q&feature=related

25/02/09

E Se Os Nazis Tivessem Ganho a Guerra?, por Ultra Violeta


Ouvi falar de Fatherland de Robert Harris (1992, edição Bertrand) por causa do seu fantástico argumento e comprei o livro. Ficou por aqui esquecido durante anos e, quando desesperei de o encontrar nas estantes cá de casa, eis que dou com ele quando menos espero. É sempre assim, as coisas nunca aparecem quando queremos e eu já tinha até procurado Fatherland na Fnac. Sem sucesso, felizmente…

Agora acabei de o ler e, não sendo um mau livro, soube-me a pouco. O que me atraiu, desde logo, neste livro foi o seu argumento, uma ideia genial. O escritor Inglês, Robert Harris, parte de um pressuposto verosímel: e se os Nazis tivessem ganho a II Guerra Mundial? Como seria o nosso mundo hoje? Seria a nossa vida muito diferente do que é agora? A acção decorre no ano de 1964 deste universo paralelo em Berlim, capital do Reich, por altura da comemoração do aniversário do Fuehrer. Depois de uma guerra esgotante, Joe Keneddy, o presidente americano vai encontrar-se com Hitler para estreitar as relações entre as duas nações. O Império alemão vive em permanente sobressalto com ataques terroristas levados a cabo por resistentes polacos, checos, moldavos e outros - «O terrorismo é óptimo,defende Hitler, para manter a Nação saudável e alerta». Entretanto a guerra com os Bolcheviques prossegue na frente Leste. Mas há um segredo, descoberto pelo oficial das SS Adrian March, que pode pôr em causa a eventual aliança germano-americana. Será que o Holocausto nunca existiu?

A ideia que está na génese de Fatherland é notável e o livro enfileira ao lado de outras Utopias Negativas concebidas no século XX, como 1984 de Orwell, Farnheit…, de Bradbury ou O Admirável Mundo Novo de Huxley… Pensei que, como aqueles autores, Harris explorasse o filão que descobriu mas, infelizmente, este brilhante argumento pouco mais é do que o cenário de fundo de um policial. Com efeito, o autor concentra-se, a meu ver em excesso, nos pormenores e enredos do trama policial, esquecendo-se de explorar mais o verdadeiro tesouro que é a sua intuição original. É chato fazer uma crítica a um livro com base no que ele não é e não com base no que ele é. Mas a minha expectativa não era ler um simples thriller mais ou menos cinematográfico… Quase que diria que é um desperdício gastar assim uma ideia tão boa. Como policial, para quem gosta do género, Fatherland é excelente. Mas não correspondeu às minhas expectativas. Harris não explorou devidamente o mundo que abriu. Até porque, suspeito, se um Orwell, um Huxley ou um Bradbury voltassem agora para pegarem no argumento de Fatherland, , desconfio que chegariam a uma conclusão perturbadora: é que se Hitler tivesse ganho a guerra, talvez o nosso mundo não fosse assim tão diferente do que é hoje.

20/02/09

Autoritarismo Abécula, por Grande Irmão

O Público deu a notícia: «A Direcção Regional de Educação do Norte (DREN) contrariou hoje uma decisão do Conselho Pedagógico do Agrupamento de Escolas de Paredes de Coura – que decidira fazer a festa de carnaval dentro do estabelecimento – e ordenou ao Conselho Executivo que convoque os professores para fazerem o desfile pelas ruas, amanhã à tarde.»

Sublinhe-se que a câmara lá da terra é de maioria xuxialista. O corso carnavelesco tem, para aquela gente, uma enorme importância e daí a decisão da directora da Dren, margarida moreira, já famosa por outras decisões mais ou menos absurdas, como aquela do caso charrua que lhe deu a notabilidade que merece. A decisão de obrigar os professores de PC a realizarem o desfile mostra até que ponto é perigosa a satelitização da escola aos interesses locais de pequenos tiranetes. Num país em que aprender português, matemática, história ou filosofia é considerado uma chatice, importante memso é o desfile do corso carnavalesco pelas ruas da santa terrinha.

Esta atitude da sra da dren, Deus lhe valha, vem juntar-se a outra tanto ou mais surrealista passada em Torres Vedras. Neste caso o Ministério Público entendeu que as fotos de «mulheres nuas» patentes numa sátira de entrudo ao computador magalhães eram pornográficas e vai de proibir a rábula. O caso de Torres Vedras é mais do mesmo.
Neste último é hilariante que o Ministério Público se considere competente para classificar o que é pornográfico e o que não é. George Bataille, Rolland Barthes ou Giogio Agamben, tudo pensadores de craveira insuspeita, andaram às voltas com o tema que está longe de ser simples. A nudez será pornográfica? Os cartazes da CK serão pornográficos? E os filmes, as telenovelas e os decotes da Soraia Chaves? E não deixa de ser irónico a censura moralista a propósito do carnaval, famoso pelas suas gajas em cuecas da Mealhada a Loulé. O carnaval do Rio de Janeiro será pornográfico? Ainda bem para os brasileiros que o ministério público de torres não trabalha no Rio ou fechavam a maior instituição carioca ao seguir ao futebol... No entanto desconfiamos que o que chocou o diligente ministério público não foi a alegada pornografia das imagens mas o ataque ao sacrossanto magalhães do regime. Terá sido o choque de ver uma mulher nua mais traumático que o de ver o magalhães parodiado? Heresia moral ou política? Seja como fôr, este caso classifica-se numa única palavra: rídiculo!
Nos dois casos é o mesmo desmazelo politiqueiro que se manifesta. Em ambos estamos perante uma espécie de proto-fascismo pequenininho, de autoritarismo abécula que é a marca registada do regime pinocrático. Os fascismos históricos a sério caracterizaram-se também pelo autoritarismo e pela intransigência que são típicos desta gente. Mas os fascismos históricos eram ou pretendiam ser grandiosos, cultivavam a decisão trágica, a arquitectura dos grandes monumentos e das mega avenidas, o estilo épico e as óperas de Wagner. Nietzsche era o filósofo do regime nacional socialista; o do nosso pequeno autoritarismo deve ser o Badaró. Em 2009 episódios como estes são marcas de uma espécie de fascismo kitch que, ao contrário do original, se caracteriza pela pequenez, pela parolice, pela pequena comédia... Triste sina a de Portugal: nem a imitar tiranos conseguimos ser sérios!


18/02/09

O Dia da Defesa Nacional, por Sargento Tainha

O João já tem 18 anos e anteontem ,por ocasião do Dia da Defesa Nacional, foi à tropa cumprir a sua obrigação cívica. Mas parece-me que alguma coisa não está bem nesta comemoração destinada a incentivar o orgulho pátrio e militar.

É que principal preocupação das centenas de jovens que seguiram com o João nas camionetas para prestarem culto à bandeira nacional não é terem de acordar às 6 da manhã. A preocupação deles é outra: não se desmancharem a rir durante a cerimónia! Não estou a gozar, é mesmo assim. Os putos vivem aterrorizados na expectativa de chegar lá e rebolarem-se a rir porque existe neste país uma estranha lei que pune severamente os cidadãos que desrespeitarem os símbolos nacionais, como a nossa ilustre bandeira. Ora há sempre dois ou três desgraçados menos resistentes que são apanhados a rir e lá têm que se deslocar ao quartel outra vez no dia seguinte. Isto senão lhes espetarem com uma multa que pode ir dos 600 aos 2000 euros... É por isso que o pessoal vive em pânico de se desmanchar a rir no dia da defesa nacional.

O João contou-me que é, de facto, difícil resistir às cerimónias. Começa logo na camioneta onde o cheiro a ganza faz lembrar um bar antes da lei do tabaco às 4 da manhã. Depois é o ritual no quartel: primeiro mandam-nos formar e apresentam-lhes umas raparigas um pouco mais velhas que eles, vestidas de uniforme militar e que se dão por nomes como «sargento Alberto», «sargento Fagundes» ou «sargento Silva». Ainda sob o efeito das ganzas, o pessoal mal se contém. Depois chegam dois tropas a marcharem, um com uma bandeja com um pano dobrado lá dentro e outro ao lado do primeiro. Nesta fase, diz-me o João, é essencial não olhar para nenhum conhecido que se encontre algures no meio da formação, o que pode ser fatal. Depois o segundo militar retira o pano - que afinal é a bandeira - da bandeja e iça-a no mastro. O mastro range com a falta de óleo nas espias. Aqui é esencial que o mancebo pense em desgraças e em aulas de matemática e na manela ferreria leite senão quer estragar o enorme esforço que o levou a chegar até àquela fase sem ter sido ainda detectado. Para finalizar em beleza vem um corneteiro que desafina que não é brincadeira e toca uma música. Diz-me o joão que esta fase só se aguenta fechando os olhos com muita força. Mas chegados a este ponto já só os mais sérios se aguentam, que a tropa não é para meninos! Nesta parte já a maior parte da malta tá rebentar de riso. Para o sargento ou sargenta que lidera é só escolher as duas ou três vítimas que deram gargalhadas mais estridentes. A tropa não é brincadeira nenhuma e os valentes mancebos que aguentam isto tudo sem se desmancharem a rir são dignos sucessores dos nossos melhores militares. Viva a Nação! Viva!

Aldra!, por Dengue

Aqui há uns tempos atrás, o governo anunciou que, durante o seu mandato, o desemprego tinha baixado uns milhares largos na classe dos professores. O socas veio logo muito contente regozijar-se para as tvs. O anúncio foi tão rídiculo e as mentiras são tantas que ninguém lhe ligou, simplesmente, porque o homem tem a credibilidade do Pinóquio e já ninguém o leva a sério. Mas vale a pena percebermos como é que o governo fez as miraculosas contas que permitiram uma conclusão tão estapafúrdia. A estatística nas mãos de gente desta dá para tudo, já sabemos...

Uma das medidas deste governo, na área da educação, foi acabar com os estágios remunerados dos professores recém formados. Antes desta legislatura um jovem que acabasse o curso era colocado numa escola e fazia o seu estágio orientado. Tinha algumas turmas a seu cargo e era, naturalmente, remunerado pelo seu trabalho. Vem a excelente equipa do ME do socas e acaba com isto. Agora os jovens recém formados que saem das universidades vão para as escolas onde são colocados, dão umas aulas sob orientação, mas deixaram de ser remunerados e deixaram de ser considerados professores. Agora são considerados alunos das faculdades e as despesas dos estágios são por conta própria (por exemplo, um jovem recém licenciado pode acabar o curso em Coimbra e ser colocado numa escola em Odemira e as despesas é lá com ele).

O governo xuxa conseguiu assim que aqueles milhares de jovens professores recém licenciados que todos os anos engrossavam a lista do desemprego docente porque não arranjavam colocação deixassem de figurar nas estatísticas. Ou seja eles continuam a contar na lista do desemprego nacional, mas já não são professores desempregados apenas porque lhes mudaram a nomenclatura: de professores estagiários passaram a ser designados por estudantes em conclusão de curso. A medida em si é de uma injustiça flagrante. Mas a jigajoga de virem anunciar que conseguiram reduzir o emprego docente em muitos milhares à custa de uma artimanha deste género é, simplesmente, abaixo de cão! É por estas e por outras - como o relatório OCDE que afinal era tipo OCDE, como aqueles queijos que não são bem serra mas «tipo» serra - que devemos ter presente que não estamos a lidar com um cenário democrático, digamos normal. O debate político actual não vai lá com salamaleques e retórica democrática. Estamos perante gente que não tem qualquer pudor em realizar operações deste tipo cuja qualificação fala por si. Isto, meus senhores, é do piorio, é um insulto aos jovens professores, aos desempregados em geral e à inteligência e à seriedade de todos nós!

14/02/09

O segundo assalto de Mickey Rourke, por Mangas

Quando no dia 21 de Fevereiro Mickey Rourke subir ao palco para receber a estatueta de Melhor Actor Principal pela sua actuação em The Wrestler (2008, Darren Aronofsky), o Diabo, algures escondido no cimo da colina atrás do grande letreiro Hollywood, vai soltar uma gargalhada sonora que se há-de ouvir às portas do Inferno. Foram quinze anos de travessia no deserto saltando entre filmes de péssima qualidade para sobreviver e o boxe profissional ao qual regressou, diz que para ajustar contas com o passado, que por paixão, que por ser um jogo limpo, que por conseguir, no ringue, soltar toda raiva acumulada contra alguns produtores e executivos do meio. Com The Wrestler, Rourke, o amaldiçoado, reencontra o talento que nunca lhe faltou e protagoniza um dos mais convincentes regressos da história do Cinema.

Domínio perfeito de expressão perante as câmaras aliada a uma forte atitude. Presença e magnetismo. Estilo próprio. MR era assim nos anos 80. Imagem iconográfica criada a partir de personagens como John de 9 ½ Semanas, Motorcycle Boy de Rumble Fish, “Boogie” de Diner, Charlie de The Pope of Greenwich Village, Johnny Angel de Nas Portas do Inferno, Chinaski/Bukowski de Barfly, ou Stanley White de O Ano do Dragão. Sobre Noites Escaldantes de Lawrence Kasdan diz apenas que apareceu por lá, fez o que lhe mandaram, recebeu bom dinheiro e foi-se embora comprar uma casa para o irmão que estava a morrer de cancro. Depois, veio o abismo: os combates profissionais, as companhias pouco recomendáveis dos gangs de motoqueiros, a carga de porrada nos tipos que vendiam heroína à mulher e lhe valeu a primeira detenção, o divórcio de Carre Otis, a falência, os medíocres filmes de acção que considera tão maus que nem sequer os viu alguma vez. Fiz esses filmes pelo dinheiro, afirma com o mesmo à vontade com que jurou um dia mijar na campa do todo-poderoso Samuel Goldwin Jr., o produtor de A Prayer for the Dying por ter transformado um filme supostamente com mensagem política numa vendetta-à-Chuck Norris. Rourke colou-se aos independentistas irlandeses, lamentou a desvirtualização do argumento, tatuou o IRA no ombro e desapareceu.

Impulsivo e não conformista, o homem refém de demónios privados sobrepôs-se ao actor politicamente correcto e criou o mito de um selvagem perfeccionista, difícil de aturar, seduzido por processos de marginalidade social, auto-destruição e desprezo para com os jogos de poder dos grandes estúdios. A ovelha negra de uma geração de estrelas que trocaram o compromisso sério de serem actores pelas capas de revistas e pelos milhões em bilheteira das mega-produções à Spileberg-para-toda-a-família-incluíndo-ETs. De nada lhe valeu ter trabalhado com Coppola, Michael Cimino, Alan Parker, Kasdan, Barry Leavison, pois acabaria rejeitado por Martin Scorsese, entre outros, por ser considerado problemático. Ele próprio teve péssimas opções de casting e rejeitou o papel de Butch em Pulp Fiction que lhe foi oferecido por Tarantino e que acabou por ser para Bruce Willis, naquele que marcou o regresso em grande de Travolta. Nesses anos, a julgar pelas suas palavras, é bem possível que Rourke sentisse falta do anonimato para não aparecer nas capas dos jornais cada vez que esmurrava alguém. A única aparição fugaz que merece ser vista aconteceu em A Promessa (2001) de Sean Penn. Dois minutos e meio com Jack Nicholson sentado em frente a escutar e Rourke em monólogo, mastigando nas palavras o sal da perda irreversível, invisível, ali, acanhada aos pés descalços de um homem perdido no Inverno. Um cameo de dois minutos e meio absolutamente transformistas e carregados de Método.

Mas Tarantino voltou a dar-lhe a mão em Sin City (2005). Marv é o melhor personagem de um filme brilhante que respeita visualmente o traço e a mancha inconfundível de Frank Miller. Em The Wrestler, o sorriso desapareceu-lhe. Emerge-lhe, na linha descendente do olhar desencantado, um rosto de retalhos e cicatrizes das cirurgias reconstrutivas que lhe roubaram para sempre o tal sorriso promocional. A sua actuação é de uma honestidade pungente. Não há ali lugar à remição, não há concessões e segundas oportunidades são para quem as tem. Atente-se à cena do discurso no ringue antes do último combate naquele registo evocativo e subliminarmente biográfico como se de uma despedida e, ao mesmo tempo, de uma apresentação se tratasse, antes do derradeiro salto. Na verdade, ninguém mais poderia fazer o papel de Randy “The Ram” porque nenhum outro actor é de corpo tão imenso e de espírito tão devastado.

Sean Penn teve mais um enorme desempenho em Milk, e Frank Langella até a voz gutural de Nixon captou em Frost/Nixon. Qualquer um destes dois poderia ser o premiado, mas o Diabo está mortinho para soltar uma gargalhada porque não é todos os dias que um Hell Angel ganha o Oscar.

11/02/09

P.S. I Love You, por João Lenão

Ainda a propósito do corajoso artigo de Mário Crespo que está aí em baixo, fui alertado por um comentador para a existência de um blog - mais um! - daqueles que se dedicam à defesa esganiçada do governo e do ingenheiro socrates. Trata-se do blog da namorada do senhor ingenheiro, de seu nome fernanda câncio. Passei por lá e nem acreditei no que a senhora escreveu. Câncio ousa adjectivar a cabeça de Crespo e duvidar do seu estatuto de jornalista, da sua deontologia e da sua imparcialidade.

Mas a dona cancia não se enxerga? Uma pessoa com o envolvimento público e notório que ela tem com o primeiro ministro, devia pura e simplesmente abster-se de se pronunciar sobre matérias que envolvem o seu mais que tudo. Isto é o bê a bá da deontologia da sua profissão. Uma namorada do primeiro ministro e alegadamente jornalista (das sérias) vir clamar contra a falta de imparcialidade de um colega num caso que envolve o namorado da primeira é absolutamente PATÉTICO! Qualquer profissional de qualquer profissão que avalie os méritos de um irmão, de um namorado, de seja quem for com quem tenha uma ligação afectiva forte, como é o caso, deve manter a reserva e respeitar - por mais que lhe custe - uma espécie de nojo na matéria. É elementar. Mas a senhora não só defende acerrimamente - e não é a primeira vez que o faz - o namorado, como ainda tem a audácia de classificar a cabeça, a deontologia e a seriedade de Crespo... Mas tá tudo maluco?


De qualquer modo esta falta de pudor no que toca ao envolvimento de familiares e entes queridos nestas questões, nem é novidade por aquelas bandas: basta recordarmos a proliferação de familiares ligados a pinto de sousa no famigerado caso fripor. Se é normal que familiares de um ministro a quem compete decidir sobre concessões que envolvem milhões, estivessem ligados ao caso fripor, como é que a sra câncio, se há-de aperceber de como é patética a sua posição de apassionata ofendida em relação ao Mário Crespo? Esta redução do governo a uma espécie de núcleo duro afectivo e familiar que cerra filerias em defesa da vítima das «campanhas negras» é mais uma característica engraçada da governação mais bizarra de que há memória no Portugal pós 25 de Abril.



09/02/09

Com a Devida Vénia, por Citador

Com a devida vénia, aí vai o excelente artigo de Mário Crespo, saído hoje no DN. É um bom diagnóstico da situação em que vivemos. Condidero-o incompleto, mesmo assim, já que Crespo nem sequer menciona as deploráveis políticas deste governo para a saúde (fecho de centros de saúde e hospitais, maternidades-ambulâncias, etc, etc), nem para a educação (das trapalhadas dos exames de física repetidos, das ilegalidades e abusos cometidos contra os professores, da política de falseamento de resultados escolares, do trabalho para as estatísticas, da morte de disciplinas capitais, etc, etc), da Justiça ou do Ambiente (o pins, a co-incineração, o fripor)... Mas nem é preciso. O que aí vai, dito lapidarmente pelo Mário Crespo, chega e sobra para termos a noção preciso do estado deprimente a que chegou a democracia em Portugal. Parece que é um artigo sobre governo. Mas não é. É sobre os Portugueses e a sua deplorável imaturidade cívica e democrática. Pois um povo que consente nisto tudo e que, ainda por cima, apoia, não é um povo, mas um capacho submisso.
Está bem... façamos de conta

Por Mário Crespo
(in "Jornal de Notícias" de hoje)

Façamos de conta que nada aconteceu no Freeport. Que não houve invulgaridades no processo de licenciamento e que despachos ministeriais a três dias do fim de um governo são coisa normal. Que não houve tios e primos a falar para sobrinhas e sobrinhos e a referir montantes de milhões (contos, libras, euros?). Façamos de conta que a Universidade que licenciou José Sócrates não está fechada no meio de um caso de polícia com arguidos e tudo.

Façamos de conta que José Sócrates sabe mesmo falar Inglês. Façamos de conta que é de aceitar a tese do professor Freitas do Amaral de que, pelo que sabe, no Freeport está tudo bem e é em termos quid juris irrepreensível. Façamos de conta que aceitamos o mestrado em Gestão com que na mesma entrevista Freitas do Amaral distinguiu o primeiro-ministro e façamos de conta que não é absurdo colocá-lo numa das "melhores posições no Mundo" para enfrentar a crise devido aos prodígios académicos que Freitas do Amaral lhe reconheceu. Façamos de conta que, como o afirma o professor Correia de Campos, tudo isto não passa de uma invenção dos média. Façamos de conta que o "Magalhães" é a sério e que nunca houve alunos/figurantes contratados para encenar acções de propaganda do Governo sobre a educação. Façamos de conta que a OCDE se pronunciou sobre a educação em Portugal considerando-a do melhor que há no Mundo. Façamos de conta que Jorge Coelho nunca disse que "quem se mete com o PS leva". Façamos de conta que Augusto Santos Silva nunca disse que do que gostava mesmo era de "malhar na Direita" (acho que Klaus Barbie disse o mesmo da Esquerda). Façamos de conta que o director do Sol não declarou que teve pressões e ameaças de represálias económicas se publicasse reportagens sobre o Freeport. Façamos de conta que o ministro da Presidência Pedro Silva Pereira não me telefonou a tentar saber por "onde é que eu ia começar" a entrevista que lhe fiz sobre o Freeport e não me voltou a telefonar pouco antes da entrevista a dizer que queria ser tratado por ministro e sem confianças de natureza pessoal. Façamos de conta que Edmundo Pedro não está preocupado com a "falta de liberdade". E Manuel Alegre também. Façamos de conta que não é infinitamente ridículo e perverso comparar o Caso Freeport ao Caso Dreyfus. Façamos de conta que não aconteceu nada com o professor Charrua e que não houve indagações da Polícia antes de manifestações legais de professores. Façamos de conta que é normal a sequência de entrevistas do Ministério Público e são normais e de boa prática democrática as declarações do procurador-geral da República. Façamos de conta que não há SIS. Façamos de conta que o presidente da República não chamou o PGR sobre o Freeport e quando disse que isto era assunto de Estado não queria dizer nada disso. Façamos de conta que esta democracia está a funcionar e votemos. Votemos, já que temos a valsa começada, e o nada há-de acabar-se como todas as coisas. Votemos Chaves, Mugabe, Castro, Eduardo dos Santos, Kabila ou o que quer que seja. Votemos por unanimidade porque de facto não interessa. A continuar assim, é só a fazer de conta que votamos.

06/02/09

«Eu cá gosto é de malhar», por Gabiru

O ministro da propaganda do regime santos silva, afirmou um destes dias aos microfones da rádio, num tom de voz tão raivoso que metia medo às criancinhas, que:

«Eu cá gosto é de malhar na direita, e gosto de malhar com especial prazer nesses sujeitos e sujeitas que se situam, de facto, à direita do PS. São das forças mais conservadoras e reaccionárias que eu conheci na minha vida, e que gostam de se dizer de esquerda plebeia ou chique. Refiro-me, obviamente, ao PCP e ao Bloco de Esquerda». (sic)

Se tivéssemos um raivómetro para medir o ódio contido nestas frases, o homem tinha rebentado com a escala. Ele «gosta de malhar» e, pelos vistos, gosta tanto que malha em praticamente tudo o que não é propaganda oficial do governo. Chama nomes à direita do PS (ao CdS e ao PSD, pelo menos, presume-se) e aos plebeus e chiques do PC e do Bloco. Ele malha à esquerda e à direita, é chumbo para todo o lado, ele gosta tanto... Ainda por cima esta pérola do vómito político pretendeu atingir os militantes do ps que criticaram as políticas pinocráticas. O que resta, afinal, se nem os próprios militantes do seu partido lhe escapam? O silva himself e mais umas quantas vozes do dono?

Ou seja, este gabiru «malha», afinal, em tudo o que é vida, em todo e qualquer vestígio de resistência, ainda que tímida, à propaganda xuxialista. Nada de novo: estas declarações são uma simples reformulação- 2009 da máxima número 1 do pensamento xuxa, formulada de modo axiomático pelo grande filósofo jorge coelho: «quem se mete com o pê esse leva». É pena que esta gente de dimensão menor não consiga perceber que são coisas deste tipo que afastam cada vez mais as pessoas da política. Isto é pestilento!

A política, na versão deste troglodismo ideológico, era bonita se fôssemos todos como o silva e passássemos o tempo a louvar hossanas ao ingenheiro. Isso sim! O azar é que não somos. Mas a raiva deste espécime é tanta que ele não desdenharia adaptar a monumental frase de outro ministro da propaganda, Goebbels de seu nome:
«Eu quando ouço falar de pensamento saco logo da pistola». E ainda por cima «gosta»!

04/02/09

DO PATRIOTISMO E ARREDORES, por Cão

O patriotismo é a fórmula que o inconsciente colectivo encontrou para amar a merda.
Posso dizê-lo de outra maneira – e tenho-o feito – mas fica esta: amar a merda.
O inesgotável filão de imbecis desta puta-pátria tem o seu quê de transcendente, de quase divino, por tão humano e imanente e imbecil.
Eu deste país de merda só queria meia dúzia de oliveiras, talvez nem tanto.
Manhãs rentes ao mar, ele há muitas noutros países.
Isto é tudo tão merdoso, que nem me cansa.
Para me cansar, teria de correr – e estes paços não merecem um passo sequer.
Falo a sério, chiça.

Os insuficientes mentais da rádio-televisão, a quadrilha dos bancos, as seitas evangélicas, os poetas, os de Braga, os actores, os engenheiros, os anais e os menstruais, os cancerosos, os que alugam barcos, os à esquerda da direita e os do avesso da esquerda, os solícitos solicitadores, os abstémios, os não-fumadores, os de Setúbal, os filhos-da-puta em geral e as mães deles em particular, os sindicalistas que não fazem boi e os bois que vão para sindicalistas, os bulímicos, os químicos, os de Abrantes, os que usam cachecol, os que usam o Estado, o estado do uso, o estudo do abuso, os coimbrinhas, os que só dão o cu mas aparecem de piça à lapela, os tónico-capilares, os bic-laranjas, os rosa-cristal, os ciganos e os cigmeses e os cigsemanas e os cigdias e os cigminuto-a-minuto,, os lopes, os palopes, os motores, os promotores, os disto e os daquilo, os reformados, os reformistas, os reformadores, os formadores, os dores, os de Beja, os taxistas, os utentes, os entes, os doentes, os hirsutos, os mansos e os brutos, os anémicos, os da Pampilhosa, os que tossem, os que rumorejam, os do cinema de produção nacional, os nacionais de produção teatral, os que cortam árvores, os que rotundam, os que se arredondam, os que vendem a salvação em brasilês, os que dizem é-assim de cinco-em-5 segundos, os que dão aulas e os que faltam às aulas, os que superbockam, os que acham bem tant’auto’strada entre nenhures e sítio algum, os que amocham com o andor nas procissões, os que mesmo não sendo mulheres não têm colhões, os que tendo mulheres as deixam ir a pé a Fátima ou sabe-se lá aonde, os de Leiria, os cabeleireiros mais fêmeos do que o elástico dos soutiens, os que já redigem sutiãs, os que se pudessem não deixariam ninguém poder, os suinicultores, os que mexem nas partes dos netinhos, os netinhos, os de Tavira, os que mordem a haste dos óculos, os que bebem o vermute com o mínimo esticadinho até à unhaca de tirar cerume dos pavilhões capiloso-auditivos, os dentistas, os aut(omobil)istas, os que têm o cu virado para África, os que nos venderam a Bruxelas, os que estão em Bruxelas a vender-nos ao resto da Bélgica, os que estão em Bruxelas mas voltam, os que rogam por-obséquio, os que pedem tenhamos-a-fineza, os que nunca leram o Nuno Bragança, os que lêem o Torga, os que vomitam, os que crocitam, os que caganitam, os que gritam, os que se vêm mas não se vêem, os que compram nos chineses camisolas para levar à manifestação contra o desemprego, os secredromedários de Estado, os mais altos camelos da Nação, os do Porto, os do FC do Porto, os que têm cataratas no olho-do-cu, os que têm dois-olhos-do-cu na cara, os que fumam mentol, os que dizem cagalhão com boquinha francesa, os que estão sempre a falar no exílio de Argel, os que expectoram pescada, os das poupanças-reformas, os pais-natais, os meninos-jesuses, os das rifas, os do vê-mazé-se-te-abifas, os do torrão-de-Alicante, os de Nelas, os da tropa, os da Europa, os que põem as filhas no ballet ao dispor dos pedófilos que dão Religião & Moral, os que põem os filhos na heroa, os que dolcegabanam e os que só abanam, os que confundem os canhões de Navarone com a ponte do rio Kwai, os que são mágicos, os trágicos, os que são marítimos, os histamínicos, os cómicos, os noz-vómicos, os da Covilhã, os que trocam a rata da mãe por duas embalagens de bacalhau pré-demolhado, os que são trocados pelas mães, os de Bragança, os de Silves, os do Funchal, os do Pico, os de Cantanhede, os de Viseu, os de Peniche, os de Évora, os de Aveiro, os de Pinhel, os de Newark, os de Portalegre, os de Goa, os da Trofa, os de Sacavém, os de Berna, os só-de-taberna, os de S. Paulo, os de S. Paulo de Frades, os de Oliveira de Azeméis do Hospital de Frades do Bairro, os que paulocoelham, os que siddhartam, os que se peidam que nunca se fartam, os que dizem ámen e os que amenizam, os que vertem e os que entornam, os que tornam, os que se encornam, os que se autorretratam e os que nunca se retractam, os que vêem o telejornal, os que já viram ovnis chamados ufos, os bufos, os tartufos, os alecrínicos e os manjerónicos, os que blogueiam, os que bloqueiam, os que manoeldoliveiram no pátio das cantigas, os que nunca se movem, os que se comovem, os que bradam, os que ladram, os que votaram neste cabrão mas agora juram que não, os não foram eles, os que são outros em vez deles por não ter sido o pai deles a foder a mãe deles, os que mandam nas urgências, os médicos, os que têm tétano por profissão, os que fazem do tédio negócio e os do ódio ócio, os ósseos, os seminais, os seminaristas, os sacerdotais e os chupistas, os que foram às urgências para morrer em casa, os que nascem em ambulâncias, os que nem casa têm onde cair mortos, os de Alenquer, os sibaritas, os hermafroditas, os foditas, os jesuítas, os juristas, os naturistas, os que chupam cabeças, os da bandadalém e os que ficam sempre aquém, os de Sintra, os da Madragoa, os porteiros, os parteiros, os excêntricos, os teocêntricos, os dos amanhãs-que-cantam-quando-a-galinha-tiver-cáries, os de Pombal, os que anoitecem de manhã, os que tonycarreiram, os que encarreiram, os que encarneiram, os do poder local, os do foder boçal, os que vendem meias a paraplégicos, os que ladram Deus ao domingo, os que arrolam testemunhas na esquadra de Jeová, os holocáusticos de David, os do tremoço e os da pevide, os que não comem carne de porco sabe Deus porquê, os que dão sangue mas só o do fim da borbulha, os do Estoril e eu também – tudo merda.

Tudo.

02/02/09

Guerras e Campanhas Militares da História de Portugal, por Viriato dos Santos

Apesar de ser um leigo na matéria, a História sempre me interessou. Infelizmente o sistema educativo e mediático português tem desconsiderado e muito esta importante disciplina, ao ponto do português culto comum ( se é que isso existe) ser, hoje, pouco mais que um ignorante na matéria, mesmo quando falamos em História de Portugal. É uma evidência. A generalidade do português comum não faz a mais pequena ideia de quem foi o Infante Santo, D. António Prior do Crato, D. João II ou os Távoras e acha que as casas de Avis ou de Bragança são palacetes algures ali para o Norte. Os responsáveis por este estado de coisas não são os nossos concidadãos, é claro, que são mais vítimas que outra coisa. Os responsáveis são sim a chusma de governos e políticos ignorantes que se têm sucedido e que têm promovido a desvalorização da formação humana em nome de uma noção neo- positivista e imbecil que identifica a cultura com a tecnocracia (vide os actuais episódios do famigerado Magalhães). Pode ser que um dia seja a própria História a julgar estes ininputáveis que nos governam...

Neste contexto de verdadeira pobreza franciscana é assinalável o esforço de algumas entidades privadas que teimam em remar contra a maré. É o caso da Academia Portuguesa de História que se vem distinguindo pela edição de um conjunto de obras que merecem aplauso. É o caso da excelente colecção dedicada à História de Portugal intitulada Guerras e Campanhas Militares. Os autores são especialistas portugueses que estudaram algumas das campanhas mais importantes da nossa história. Li dois livros desta excelente colecção (e tenho mais alguns em lista de espera) que aconselho vivamente: Aljubarrota de Luís Miguel Duarte e aquele que julgo ser mais recente título da colecção, A Perda da Independência - de Alcácer Quibir aos Açores, 2008, da autoria de Carlos Margaça Veiga.

Esta colecção, parece-me, pretende superar alguns dos problemas que o leigo, como eu, interessado em História, encontra em alguma da bibliografia que se publica entre nós, nomeadamente o seu academismo excessivo, a sua tecnicidade e o preço elevado. Ao contrário de uma certa tradição editorial, os autores desta colecção escrevem para o público e não se limitando a publicar as suas teses de doutoramento. Pelo contrário nota-se nestas edições um esforço notável de traduçlão de conteúdos mais técnicos para uma linguagem mais acessível ao leitor comum. Há a consciência clara de que receptores diferentes exigem linguagens diferentes. Trata-se ainda de edições simples, graficamente cuidadas que incluem imagens de boa qualidade e num formato quase de bolso. Muito diferente dos calahamaços enciclopédicos com mil e um anexos de grande interesse académico mas pouco ou nenhum interesse para o leitor médio. Além disso, last but not least, o preço destes livros é extremamente acessível: 4.90 euros na Fnac!

Nos países anglófonos há muito que este trabalho de edição histórica acessível se efectuou, existindo, hoje, um vasto público consumidor deste «género literário». Em Portugal está tudo por fazer e o esforço da Academia Portuguesa de História é um passo importante que merece ser assinalado. No país das licenciaturas tiradas aos domingos de agosto, se estivermos à espera das medidas do governo dos magalhães bem podemos esperar sentados... Mais facilmente alteram a Zona de Protecção Ambiental de um qualquer estuário perto de si.