04/07/09

Brasil de John Updike, por Tó Negão


«O ar dos trópicos sugere, durante o dia, que nada se pode realizar, que a decadência e a lassidão são próprias do homem. Mas à noite o ar parece cheio de emoção e acção em potência. Há uma promessa húmida e perfumada à espera de se realizar.»
John Updike

Updike concilia uma dimensão densa e poética na sua escrita com a clareza e a precisão meridianas da linguagem objectiva. Ele realiza uma espécie de quadratura do círculo literária porque consegue harmonizar estas duas características da escrita que são frequentemente exclusivas uma da outra. A linguagem clara costuma ser o contrário da linguagem entrópica, mais própria da poesia. Updike é dos escritores que melhor consegue conciliar esses dois pólos frequentemente opostos.

O livro é um fresco muito interessante do Brasil, das suas contradições, da sua história e evolução (?) recentes. Trata-se de um livro que exigiu trabalho ao seu autor, um livro que não é resultado, apenas, da inspiração do daimon. Pessoalmente gosto de livros assim, não costumo apreciar literatura mandriona, por mais brilhante que seja. Mas para além do trabalho de pesquisa por ele realizado – e declarado no posfatio com a referência aos nomes de Levi-Strauss, Assis, Freyre, etc – há ali uma potência vital que só pode sentir e transmitir alguém que viveu e se apaixonou pelo Brasil.

Brasil começa com uma história de amor que a princípio parece banal – o cliché Tristão e Isolda transportado da Idade Média Gótica para o Brasil contemporâneo tropical – mas que depois conhece variações inesperadas. Tristão é o negro favelado das praias de Copacabana; Isabel a filha da alta burguesia dirigente. E há na sua história uma moral principal: é que o amor de Tristão e Isabel vive apenas na adversidade, enquanto são excomungados e perseguidos; quando esse amor é finalmente aceite pela classe social e familiar de Isabel, isto é, quando passa a comprazer-se na facilidade de uma vida burguesa, acaba porque Tristão desiste

8 comentários:

Dog disse...

Boa sinopse. Updike é um grande escritor, sem dúvida.

Anónimo disse...

Não fazia ideia de que gostsavas do Up,Dog. Que livros é me aconselhas dele? Já cá teho o S., Casais Trocados e o Corre Coelho, directamente requisitados na Fnac dos Fornos ali prós lados do rui dos leitões. Leste algum?
(entretanto meti-me no Neil Gaiman que, enfim, não é mau mas...)
Tó Negão

Dog disse...

o Corre, Coelho é obra-prima.
tudo o que apanho dele, compro e leio.

Anónimo disse...

este não é um autor americano, mais um, daquele país cujos escritores nada têm para dizer e que em regra não se gosta?

ass: digo eu de que

PS: é que já ouvi isto tanta vez e depois é roth é updike, etc

PSS: e ainda um dia o hei-de ver a descobrir Bellow, Salinger, Ellison, West ou Pynchon

PSS: Faulkner e McCarthy já se tentou e o bicho cuspiu fora.

Dog disse...

Updike é grande. O Heller do Catch 22 também. o Roth também. o zamericanos também têm coisas boas e grandes e fantásticas, claro que sim.

Anónimo disse...

à conta desta crítica comprei o livro. Se não gostar exijo devolução do mesmo ao Tapor !
A fazer fé nos primeiros capítulos creio que não me arrependi. Já agora Updike tem um livro divertidissimo e demolidor para os novos gurus da new age e do yoga que é o "S". É um dos meus favoritos e é irresistivelmente mordaz.
Saúde ao Tapor que parece estar outra vez em grande forma, por exemplo, o postal do Michael Jackson é de antologia. Só lamento que o Kzar tenha desertado deste blog...logo ele que é um talento de sagacidade e ironia.
JNAS

Anónimo disse...

Ganda JNAS: bem vindo a casa!

Fica desde já prometido: se não gostares do livro eu devolvo-te o dinheiro!

Curiosamente tenho o S. em lista de espera e só ainda não o comecei porque entretatno peguei na Sinfonia Patoral do André Gide que achei FABULOSO e sobre qual sairá post brevemente, assim a praia mo permita... Entretanto avancei para o Porta Estreita do mesmo Gide, pelo que o S. será a leitura seguinte.

Quanto o abandono do ilustre Kzar tocas num ponto que é para mim uma autêntica dor de alma. Eu sou o fã nº 1 dos posts dele e fiquei com imensa pena do abandono do gajo. Na altura ele comunicou que se ia dedicar ao Catilinário que fui seguindo com gosto e que julgo ter falecido. Mas sempre lhe dissemos, a malta daqui, para continuar a mandar bocas no tapor. Dissemos-lhe mil vezes, mas ele parou. Estávamos na disposição de lhe dizermos mais mil vezes mas depois pensámos que podíamos estar a ser chatos e que era melhor deixá-lo à vontade. E foi assim que o Kzar nos abandonou. Nunca mais o vi na blogosfera. E é uma pena...
Tó Negão

Anónimo disse...

o Kzar é volúvel nas suas paixões excepto no que respeita à Kzarina e à bicheza subaquática ! Uma perda para qualquer leitor.
JNAS
(Recomendo mesmo o "S" - Conhece também John Irving ? "Viúva por um ano" é também um livro delicioso apesar do seu volume tijolesco...bom para ler na praia)