28/03/07

O Regime E O Ti Armando, ou Salazar, Parte 2, por Porco&Mundo

O Ti Armando foi convocado por nota oficial para se apresentar no prédio da PIDE-DGS, ali por trás da Praça da República, pouco tempo antes do 25 de Abril. Ao Ti Armando, calmeirão e pachola, velho rendeiro de courelas alheias, jamais passou pela cabeça em desobedecer a uma convocatória da polícia. E na data e hora marcada lá se apresentou. Confirmaram-lhe o nome e levaram-no para um dos calabouços.

Aí durante um dia e uma noite inteira levou vergalhada de cavalo marinho, dada por um meia-leca de bigodito que jamais aguentaria uma talochada do Ti Armando, quanto mais criar 8 filhos à força da enxada e farpão. Da vergalhada, o Ti Armando recordava três coisas: a primeira eram as duas costelas fendidas e a lesão permanente num tendão do calcanhar que o meteram a coxear para o resto da vida; a segunda era que só lhe falavam e perguntavam por um tal de “Regime” (diz ele que gostava de lhes agradar e responder, mas não conhecia o moço…), e a terceira era que no dia seguinte o puseram na rua, dorido e manco, explicando-lhe que não era nada, que não ligasse pois que se tratou de um engano. O Armando era outro. Era o de Vilarinho e do mesmo nome. Tinham-se enganado na terreola.

Esta história é verdadeira. Foi-me contada pelo próprio quando em 1978 com 15 anos servia de aguadeiro aos dez ou doze cavadores, que o meu velho trazia de volta dos torrões da vinha. Perante mais um dito que elogiava o bom Salazar-Que-Não-Roubava e que romanceava o antigo Regime, o Ti Armando poisou o tinto e a broa com sardinha, e mostrou as costas tisnadas do sol, mas marcadas com as vergalhadas que um miserável lhe fez em nome de um Regime que ele desconhecia existir, quanto mais ser contra.

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