14/01/05

Seinfeld Quê?, por Automotora

Sem qualquer espécie de ironia, nunca percebi o fenómeno de popularidade do Seinfeld. Para mim o êxito da série é um fenómeno tão estranho como estar no Times Square rodeado de néons a publicitar os Batanetes. Consta até por aí que é o maior acontecimento televisivo desde que apareceu a primeira voz no écran a fazer “alô, alô, teste”, e estão mesmo a pensar substituir a Estátua da Liberdade pelo Seinfeld, acção que se irá espalhar por todas as regiões do planeta onde haja Cristos-Reis. Ora eu, sinceramente, não sei o que é que justifica isto tudo, tanto que parece que já estão a preparar um filme em Hollywood com a minha história. Vou ser o outro irmão autista do Tom Cruise. Bom, um dia sentei-me à frente do televisor, a tremer de emoção, e a pensar “vou ver o Seinfeld, vou ver o Seinfeld!”. Fui vendo, um, dois, três ou quatro episódios e bocados de outros (cada vez mais curtos). Este sistema de amostragem, meio aleatória, é mais do que suficiente para descobrir genialidades. Mas eu não vi nada, zero. É verdade que o Grunfo diz que tem lá um episódio que me vai converter, mas eu acho isso estranho, porque ninguém se lembraria de dizer “achas que o leitão está mal assado? Prova lá então este bocado”. Ora bem, comecemos então pelo conceito geral do fenómeno: Um apartamento, um café, três ou quatro gajos, incluindo o típico gordo de óculos, uma gaja, com um penteado esquisito, todos a mandar bocas uns aos outros, a zangarem-se e amigos para a vida inteira. Até aqui, temos a descrição de dezenas de outras sitcoms. É o lugar comum mais utilizado na televisão. Aliás, os personagens das sitcoms são mesmo obrigados por contrato a serem amigos para a vida, pelo menos durante o período que dura a série. É como diria o Vinicius: O Amor é eterno enquanto dura o contrato. O genro do Archie Bunker, por exemplo, foi obrigado a partilhar o mesmo espaço com o sogro durante anos, como se fossem amigos inseparáveis. E os fantoches também são obrigados a andar à porrada dentro de um pequeno teatrinho e não deslargam nunca. É uma exigência logística, digamos. Até aqui, não há originalidade nenhuma, portanto. Vamos lá então ver se acontece alguma coisa nos diálogos e nas situações, que é onde neste tipo formatado de sitcoms se pode fazer a diferença. Lembro-me deste, completamente hilariante, genial, até às lágrimas: Um gajo deixa a porta aberta do apartamento. Vem alguém e rouba uma televisão. Seinfeld diz ao outro: olha, eu tinha comprado uma fechadura nova e tudo. Mas acontece que para a fechadura funcionar a porta tinha que estar fechada! É o clic! Sai uma gargalhada do enlatado e o planeta sacode e muda a rota com o impacte das gargalhadas gerais! Eu só achei vagamente engraçado, o que imagino seja um crime de Lesa-Seinfeld. E pronto, de repente não me lembro de mais nenhuma cena... Eu, em matéria de humor sou mais da escola inglesa. Não falo sequer dos Monthy Python (de joelhos!). Vejam o Big Train, para mim o maior da última década, ou o Liga de Cavalheiros, o The Office, ou o Coupling, noutro registo, mais “americano”. Americanos mesmo, não perdia, por exemplo, o The King of Queens, que passou cá com o título parvo de Eu, Ela e o Pai, sem nada de especial ou original, mas com diálogos inteligentes e bem escritos que me faziam rir às gargalhadas. E não me puxem pela língua senão ponho-me aqui a falar dos Sopranos, esse grande clássico da máfia psicanalítica….não, deste acho que não falo. Prezo muito a amizade dos meus amigos.

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