06/05/06

O SINAL, por Baltazar

O secretário de estado da Educação, Valter Lemos, negou ter assinado o que só ele podia ter assinado. Eu não lhe chamo mentiroso. Recordo os factos. Há poucos dias, os jornais deram conta de um despacho da Direcção Regional de Educação de Lisboa que mandava regressar às escolas de origem os professores que se encontravam destacados noutras escolas desde o início do ano lectivo por motivo de doença devidamente comprovada por certificado médico e com autorização superior. Agora, a escassos dois meses do final do ano lectivo, a DREL considera essa mobilidade ilegal e fundamenta a decisão num despacho assinado pelo senhor secretário de Estado. Ele nega. Se não é mentiroso, então que demita imediatamente, por incompetência, toda a cadeia hierárquica que decretou esta ordem tão disparatada. Recordemos que Valter Lemos, aquando da greve dos professores, fez sair uma nota oficial (terá sido ele?) em que acusava, por grosso e genericamente, os professores de faltarem 9 milhões de vezes por ano! Eu não discuto o número, ainda que seja muito discutível. Acho até que a abstinência dos docentes é um problema e que os prevaricadores devem ser punidos. Não sinto dores corporativas. Mas acho também que cada um, individualmente, deve ser responsabilizado pelos seus actos. Por isso, acho que a atitude do senhor Valter Lemos foi cobarde. Além de demagógica e inoportuna. Porque incluiu todos na mesma suspeita, sem distinções nem respeito pelas situações merecedoras de respeito e porque esquece um facto decisivo: as faltas estão justificadas nos termos da lei! Se não estão, a sede é discilpinar. Se a lei está mal feita, faça-se lei bem feita! Face a isto, a revolta levou alguns sindicatos a lembrar que, no passado político de Valter Lemos, quando fora vereador da Câmara Municipal de Penamacor, perdera o mandato por faltas injustificadas! O senhor Lemos argumentou que não, que pedira a suspensão do mandato, que o não perdera. Preciosismo formal que o salva. Os jornais locais davam conta do contrário, o Presidente da Câmara local veio defender o secretário de Estado cuja assessora é filha do presidente! A história é rocambolesca e indigna. Sigam o link se quiserem. Eu não me ocupo de misérias.
Este mesmo Ministério da Educação anuncia agora uma medida que acha revolucionária e, nas palavras da senhora ministra, a decisão enquadra-se num conceito de acção política que não faz mais do que generalizar as boas práticas observadas nas escolas. Ou seja, o Ministério faz-se um Grande Observador e dá forma de lei às práticas que entende boas. Incrível! Por este peculiaríssimo método, o governo decretou que os professores quando prevejam a ausência devem deixar um plano de aula. Não vou discutir o alcance da medida, nem sequer a sua pertinência ou a sua exequibilidade. Vou apenas lembrar como este minstério navega à vista, improvisando e sem estratégia. Lembro que os despachos sobre as aulas de substituição foram publicados em Agosto e previam que todas as horas de redução, mais a diferença entre as 22 horas lectivas semanais e as 26 horas de serviço, fossem ocupadas em aulas de substituição. Ou seja, um professor com 30 anos de serviço, tendo 14 horas de actividade docente, teria mais 12 horas de aulas de substituição! Os protestos imediatos lembraram ao Ministério que tais despachos transformariam professores em substituidores. Uma espécie de pastores alemães encartados! Os sindicatos lembraram ainda que, nos termos do Estatuto da Carreira Docente, as aulas de substituição, de acordo com a determinação do Parlamento e do Governo eram entendidas como actividade lectiva suplementar, cabendo por isso remuneração extraordinária. Em face disto, o governo recuou e sugeriu que não fossem aulas, mas actividades de substituição, fazendo mais uma vez método do preciosismo formal. Quais? Perguntaram todos. Por exemplo, ler poesia, respondeu a ministra. O ridículo instalou-se e a ministra sacudiu a decisão para os órgãos directivos das escolas. Pouco depois, determinações posteriores dispensaram os professores com 22 horas lectivas atribuídas de prestarem serviço de substituição e, das horas de redução, só metade seria aplicada nestas actividades. Vejam como as ordens foram evoluindo à medida que se iam revelando absurdas. Agora, vem com esta medida que contradiz o despacho inicial e os remendos posteriores. Não são actividades de substituição, não é poesia, voltam a ser aulas. Planificadas pelos ausentes quando prevejam a ausência. Aposto que não vai ficar por aqui. E profetizo. No ensino básico, os alunos apercebem-se já da completa inutilidade de um sistema de substituiçlão que lhes veda o usufruto da escola como espaço de convívio e sociabilização e que supõe uma concepção punitiva e penitenciária da escola. Quando no próximo ano lectivo este sistema for generalizado ao secundário, antevejo vagas de insurreição e indisciplina. E não me venham dizer que são os professores que não querem trabalhar. Eu até peço que me marquem 35 horas semanais no horário. Com duas condições: não me peçam mais nada além dessas 35 e, por favor, deixem os miúdos em paz.
Para concluir, lembro que esta ministra é a mesma que já anunciara o fim dos exames do 12º a Língua Portuguesa aos alunos do ramo de ciências. O escândalo rebentou e o ministério recuou. Este ministério é o mesmo que mandou que as Direcções Regionais elaborassem listas com os nomes dos professores que aderiram à greve. Esta ministra foi aquela que, no início do mandato, proferiu uma das maiores enormidades que já escutei quando, a propósito dessa greve comentou um despacho judicial emitido num tribunal açoriano e que declarava inconstitucional essa elaboração de listas, afirmando sem pudor que os despachos dos tribunais açorianos não eram válidos em Portugal! (sic) Ninguém se indignou. Acharam que era um deslize, uma gaffe, um lapso. Não era. Era um sinal!

Foto: http://www.eb1-cambas.rcts.pt/anossaescola.htm

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