30/04/08

Azuis Malvados, por Judeu

E prontos - com a vitória do Chelsea sobre o Liverpool na meia final da Champeons League, lá vai mais uma machadada no mito Mourinho. A verdade é que o Génio do Sobretudo teve três-épocas-três para atingir esta final, dispôs dos maiores orçamentos do planeta para comprar os jogadores que quis e o resultado foi pífio. Apesar das vitórias no campeonato britânico, Mourinho falhou o prinpcipal objectivo para que foi contratado - a conquista da Champions. Pois bem, Avram Grant acaba agora de conseguir melhor que Mourinho, batendo a bêtte noire do Chelsea, o Liverpool, no melhor jogo de bola que vi este ano. E a duas jornadas do fim, está em igualdade pontual com o Manchester e ainda pode ganhar a liga Inglesa. Essa é que é essa.

Tenho para mim que a passagem de Grant para treinador da equipa não é por acaso. Tenho para mim que não foi por acaso queAbramovich escolheu um homem com um curriculo igual ao meu, isto é zero, para liderar os Blues. Não. A ausência de curriculum de Grant foi um risco calculado de Abramovich, como quem diz, «com esta equipa, o difícil é ficar pelo caminho durante três anos consecutivos». Se a coisa corresse para o torto, podia sempre mudar, mas a convicção do russo era que correria bem, como está a correr. E mais: o Chelsea melhorou muito com Grant, joga de um modo muito menos mecânico e calculista, com mais gana, vontade e criatividade

Mas dizer que o rei vai nu é muito complicado neste país em que estamos sempre à espera dos novos heróis tugas que hão-de espantar mundo. Ainda hoje ouvi um gajo qualquer na rádio a dizer que sem o Mourinho esta equipa não era a mesma, mas (não fosse dar-se o caso do Chelsea passar à final como passou há sempre um mas) «é uma equipa construída pelo Mourinho que joga à sua imagem». Este comentário é espantoso, é em si mesmo, a síntese da mitomania-mourinho que impede os idólatras de discernimento. Note-se a paráfrase Genesíaca - «feita à sua imagem»... Como quando Deus fez o homem, onde é que eu já ouvi isto?
Apesar disto soar escandaloso é preciso repetir a esta gente que NÃO, esta vitória não é do Mourinho! e SIM esta vitória é do Abramovich, do Grant sem curriculum e dos jogadores, precisamente quando o Mourinho é corrido. Para os profetas do apocalipse blue depois da saída do Mourinho aí está a resposta: ele sai e o Chelsea tá na final! Essa é que é essa e o resto é mito...

26/04/08

Notas soltas sobre democracia e partidos por ocasião de um feriado que passou, por Gajo das Notas Soltas

Ninguém diria, mas ontem foi 25 de Abril. Lá atrás no post do artigo 8, alguns comentários suscitam algumas pistas para assinalar a data. Uma delas é o diagnóstico do sistema. Vinte e oito anos depois, que democracia é que estamos a construir? Que República é que andamos a fazer? Algumas notas soltas.

Em novecentos anos de História, Portugal apresenta um registo de três décadas de liberdade democrática, o que perfaz, se não me engano nas contas, menos de 3 por cento da tal história. O que significa que somos, enquanto país, uma criança em termos de maturidade democrática. O papel dos EUA no mundo é outro tema igualmente fascinante, mas não é disso que gostaria de tratar neste dia pós-25. Para responder aquelas questões iniciais, no entanto, gostaria de me centrar na experiência histórica democrática dos EUA, que, ao contrário da nossa criança, já tem barbas. Apesar de assentar num esquema presidencialista, não deixa de ser um caso de estudo interessante para nós. Não vou explicar como funciona a democracia norte-americana, eram precisos muitos livros e eu não domino o assunto assim tanto, mas apenas suscitar reflexões no sentido de começarmos a olhar para fora com mais humildade e tolerância, aprendendo com a experiência dos outros.


Os pilares da democracia norte-americana são europeus, reflectem sobretudo os ideais da Revolução Francesa e de pensadores britânicos como John Locke ou Thomas Hobbes (pai do conceito de “contrato social”) ou franceses como Rousseau e Voltaire. A Democracia norte-americana, fundada num contexto de libertação colonial, por um lado, e de protestantismo, por outro, reflecte, aprofunda e coloca em prática pela primeira vez na história da humanidade um sistema político verdadeiramente revolucionário, assente no primado da liberdade individual e da igualdade de direitos. A Declaração de Independência, a Constituição e as suas dez adendas (os “ten amendments” que constituem a “Bill of Rights”) são expressões máximas dessa revolução na forma de fazer política e exercer o poder, que continuam actuais e em vigor.


A Europa, incluindo a França, pátria-mãe dos ideais, andou entretida ainda uns séculos com totalitarismos monárquicos, imperiais ou ideológicos, ou com chacinas como duas guerras que se tornaram mundiais, enquanto do outro lado do oceano, se desenvolvia uma sociedade pujante, fervilhante, mais livre mas profundamente contraditória e até desigual, à imagem dos indivíduos que compõem as sociedades, e que constitui ainda hoje uma espécie de íman carismático para milhões que em todo o mundo aspiram à liberdade ou à prosperidade.


Entretanto aconteceu mais História e a Europa recuperou no Séc. XX o tempo perdido, aprofundado igualmente o(s) seu(s) modelos de democracias liberais. Por ser um sistema político aberto, o sistema democrático liberal que se tem espalhado pelo mundo (um dos fenómenos dos muitos que concorrem para a dinâmica de “globalização”), está em constante aperfeiçoamento e em permanente debate. Não é dogmático nem é tendencialmente estático e conservador, como são as ditaduras ou as monarquias. E essa maleabilidade permite, por exemplo, acomodar as necessidades e os anseios das minorias. Ou mesmo as aspirações e as necessidades de cada indivíduo. E permite corrigir disfunções de forma relativamente harmoniosa – nos Estados Unidos, por exemplo, a disfunção da escravatura foi corrigida muito mais rapidamente do que nos outros países: O país nasceu em 1774 e em 1863, nem cem anos depois, acabou com a prática; um registo, convenhamos, muito mais simpático que o português, por exemplo. Ao passo que num sistema ditatorial a disfunção é violentamente reprimida, as minorias têm que se subjugar às supostas maiorias e a individualidade é oprimida e anulada em nome de um putativo bem comum.


Acontece que não só a “disfunção” é inerente ao ser humano, sucede na própria natureza, como a diversidade individual não se compadece com esquemas totalitários, que fracassam todos precisamente porque não acomodam essa diversidade. O facto é que todos nós, individualmente, regemos as nossas vidas mediante as nossas muito particulares agendas e interesses, que podem ou não coincidir com a agenda dos outros, que podem ou não ser grupais, que podem ou não ser generosas ou que podem até coincidir hoje e não coincidir amanhã. Tudo depende, já que a impermanência é uma lei básica da existência - realidade que os ideais totalitários não compreendem nem aceitam. Isto para dizer também que efectivamente as coisas mudam e que as democracias liberais incorporam melhor a mudança e a liberdade individual na prossecução do tal bem comum e do ideal de felicidade.


O caso dos EUA, da sua democracia e da sociedade que gerou, é particularmente interessante porque também é particularmente visível e mediático, é um país escancarado, aberto, "espectacular" (no sentido de espalhafatoso), super-abundante (a produção científica e artística falam por si) e objecto de todas e mais algumas atenções, ódios e paixões. E se olharmos para o grande quadro, para lá dos problemas tipicamente norte-americanos ou de outros que são comuns aos nossos simplesmente noutra escala, o que vemos é efectivamente uma democracia viva e muito mais madura do que a nossa (portuguesa, já que há outros países europeus com experiências democráticas muito mais interessantes e maduras do que a nossa).


Não obstante disfunções como a que permitiu a eleição de Bush Jr. (a bronca dos votos na Flórida), entretanto discutidas e corrigidas, o que se percebe quando se penetra no verdadeiro debate político por detrás das campanhas eleitorais, para além do tal “circo” que percebe quem apenas acompanha os telejornais, é um debate intenso e amplamente participado, em torno de questões substantivas e não das guerras de alecrim e manjerona em que nos envolvemos por aqui. Discutem-se pessoas, sim, mas acima de tudo discutem-se ideias e projectos.


Além disso a política não se esgota nos partidos e em Washington. Inclui, já agora, a prática do lóbing (grupos de pressão juntos das instâncias políticas), de forma regulada e transparente: Minorias que vão desde os industriais do calçado a gays e lésbicas, fazem lóbing de forma aberta e normal na defesa dos seus interesses, tentando convencer os decisores da bondade dos seus argumentos. Ao passo que em Portugal o lóbing é pecado e a pressão faz-se por baixo da mesa, de forma obscura e propiciadora da corrupção e do tráfico de influências. O mesmo vale para o financiamento dos partidos: entre a transparência norte-americana e o nevoeiro cerrado português vai um oceano maior que o Atlântico.


A alternância bi-partidária em Portugal, por seu turno, é uma caricatura patética do bi-partidarismo norte-americano. Entre uma e outra práticas políticas vai a diferença de 250 anos de experiência democrática de um povo. Comparada com a vibrante e amplamente participada democracia norte-americana, a nossa é um catraio imberbe e imbecil com borbulhas na cara – e para quem acha que não, aconselho mais uma vez a acompanhar com mais atenção as presentes eleições primárias nos EUA, para além das manchetes e dos flashes televisivos.


Os dois partidos do nosso arco governativo são eles próprios caricaturas patéticas de partidos políticos a sério. Ainda são uma espécie de projectos de partido, à escala histórica das coisas. Para já porque não são partidos feitos para servir os cidadãos e o país, estão formatados para servir em primeiro lugar a militância e a clientela e só depois, com o que sobrar, a comunidade. São agremiações de interesses particulares e corporativos e essa realidade é bem patente nas estruturas locais e distritais dos partidos ou nas autarquias, invariavelmente muito mal frequentadas. À democracia nacional falta ainda, como existe noutras democracias mais avançadas, um eficaz sistema de “checks and balances” que permita controlar e limitar os abusos e as prepotências do(s) poder(es) – na esfera autárquica, por exemplo, um passo significativo seria uma maior dignificação das Assembleias Municipais, conferindo-lhe efectivos poderes de fiscalização e controle da actuação governativa do Executivo, mais à semelhança do que acontece entre o Governo e o Parlamento.


E há duas formas de olhar para isto: Ou os partidos são assim porque evoluíram nesse sentido, ou são assim porque ainda são novos e ainda não evoluíram muito. Mas a realidade que a generalidade dos portugueses percepciona é a de que esses partidos se tornaram em pouco mais do que agências de empregos e negócios, sob o pretexto da governação. Resultado: governa-se mal. Cada vez pior, porque os melhores também se afastam cada vez mais destes ninhos de intrigas mesquinhas, favores e carreirismo.


Outro dos sintomas da dor de crescimento das jovens democracias como a portuguesa é o chamado populismo. Trata-se de uma praga a que temos sido relativamente imunes, mas que tem vindo a trilhar o seu caminho de forma tentacular, no PS com Sócrates, certamente, mas sobretudo no PSD e sobretudo desde Durão Barroso. O processo de sucessão na liderança do PSD tem sido exemplar nesse sentido, de revelar os muitos rostos dessa tendência primarista. De facto, só um partido imaturo numa democracia imatura poderia sequer equacionar ter como presidente o Alberto João Jardim, um hino ao grunhismo caciquista de veia totalitária, sub-espécie pitoresca de Avelino das Ilhas. Aliás, qualquer partido que tenha uma figura destas como referência não merece ser levado a sério, mas adiante.


É óbvio que esta não é uma característica exclusivamente nacional, o caso recente de Berlusconi (uma espécie de Jardim à italiana mas muito mais sofisticado e com mundo) é paradigmático. Ou Chavez na Venezuela, ou Putin na Rússia, ou o Iznogud do Irão. Também são expoentes dessa forma básica de fazer política – sobre o ressurgimento de focos de populismo na América Latina, aconselho esta leitura, a propósito de um livro que ainda não foi cá publicado (penso eu). O próprio Bush, nos EUA da mais antiga democracia do mundo, apesar de toda a artilharia pesada ideológica e teórica dos neo-conservadores, foi eleito em grande medida com mecanismos tipicamente populistas, nomeadamente o de oferecer respostas fáceis para questões difíceis. E como é óbvio, espalhou-se ao comprido. Não admira, portanto, que os três actuais candidatos que se perfilam para a presidência constituam um saudável sintoma do regresso da política norte-americana à “normalidade”.


Estes e outros problemas da democracia nacional levam, não só ao afastamento dos mais novos (não necessariamente pela “política”, ou pela intervenção cívica, mas sobretudo pela actual oferta partidária), mas também de cada vez mais eleitorado urbano e educado, classe média para cima, que também se reve cada vez menos nestas formas rasteiras de fazer política e que não tem alternativa senão a abstenção ou o voto em branco - as últimas eleições autárquicas intercalares em Lisboa registaram cerca de 60% de abstenção! Ora, alguém acredita que isto é só “desinteresse pela política” e que só atinge “os jovens”?

23/04/08

Cromos, por Okunowo

Hoje venho aqui aconselhar um blog. Chama-se O Cromo dos Cromos. A ideia é simples: publicar e classificar por ordem alfabética os cromos das coleccções de jogadores de bola de todos os tempos, divisões, tamanhos e feitios. Neste blog podemos encontrar os velhos cromos de personagens míticas do pontapé na xixa como, por exemplo, os fabulosos Camolas, Araponga, Bobó (de seu nome completo Mamadu Bóbó Djaló), Yaúca ou Atraca.

O que mais me impressiona no blog é que cada cromo tem dezenas, quando não centenas de comentários de intelectuais do esférico que sabem lieralmente TUDO o que há para saber acerca dos artistas: a data de nascimento, o nome da professora da escola primária, a carreira desportiva, os golos apontados na partida com o Arrentela prá Taça, o onze que alinhou, o dia da festa de homenagem e até a descedência!!! Quem não se recorda, por exemplo, da célebre linha avançada de uma equipa cujo nome já se me varreu da memória e que era constituída por Babo, Babalito e Bambo, apoiados por Bobó a meio campo? Está lá, é fantástico! O blog é um verdadeiro repositório de sabedoria inútil - é impressionante como as pessoas ocupam os cérebros com tanta informação acerca de coisa nenhuma. Parece uma metáfora do saber em Portugal, onde se ignora quem foram Damião de Góis, o Infante D. Pedro ou Miguel Baptista Pereira mas onde se sabe tudo sobre a vida de Bife, avançado de centro do FCP dos anos 70 recentemente falecido com 57 anos vítima de cirrose hepática. Como é próprio de toda a sabedoria inútil, o blog é um must para quem o lê por devoção e com reverência como para quem nele percebe um registo irónico que o torna atractivo. Eu gosto do Cromo dos Cromos, a sério, e por isso o aconselho e acho que é a primeira vez que aconselho um blog no Tapor.

Como homenagem ao Cromo das Cromos deixo-vos aqui o cromo do célebre médio do Bayer Leverkussen dos anos 70, o inesquecível Franco Foda. Quem não se lembra dos comentadores televisivos a darem uma de poliglotas para evitarem dizer o nome do bom do Franco? Ele era Fuuda, Fuden ou Fôden, tudo menos Foda. Memorável! No http://www.cromodoscromos.com/, um blog perto de si.

22/04/08

Capitão Alatriste, por Manolo

A saga As Aventuras do Capitão Alatriste é uma homenagem do escritor espanhol Arturo Perez-Reverte ao romance de capa e espada e a Alexandre Dumas e aos Quatro Mosqueteiros em particular. Reverte remete aqui para as suas leituras juvenis, apresentando Alatriste como uma versão espanhola de D`Artagnan. Sublinho «espanhola» porque o orgulho, a gana, a cagança tipicamente espanholas são partes integrantes da personalidade de Alatriste. Ele está muito longe, enquanto personagem, da nobreza imaculada, da finesse, do brio tipicamente franciús de D`Artagnan. Alatriste nem é, sequer, um gajo honesto. Saído do exército de sua Alteza Real, o rei Filipe IV (III de Portugal), o capitão vive do aluguer da sua espada em serviços canalhas na Madrid soturna do século XVII.


Perez-Reverte é, como se sabe, um escritor de grande sucesso que, inclusivamente, viu uma obra sua, A Nona Porta, adaptada ao cinema pelo grande Roman Polanski. Se não estou em erro, Reverte é o escritor mais vendido em Espanha e, fora dela, é igualmente um caso sério. Dele, já li O Cemitério dos Barcos Sem Nome, O Hussardo e O Pintor de Batalhas. Gostei muito, mesmo muito, destes dois últimos e menos do primeiro que penso ter sido, também, objecto de versão cinematográfica. Quanto à saga do capitão Alatriste, está na minha lista. O sucesso da série em terras de nuestros hermanos foi estrondoso e por isso ela foi comparada a uma espécie de Harry Potter para adultos no país vizinho


Embora, como disse, não tenha ainda lido a saga do Capitão Alatriste, vi um destes dias, por mero acaso, o filme na televisão e fiquei surpreendido. Agradavelmente surpreendido. Alatriste é um filme espanhol, editado em 2006 e realizado por Agustin Diaz Yanes. Conta, entre outros, com uma interpretação soberba de Xavier Cámara no papel do sinistro rei-sombra de Filipe IV, o conde duque de Olivares. A Cámara conhecemo-lo dos filmes de Almodóvar, em particular, de Habla Com Ella, onde faz um trabalho notável.


Mas, dizia eu, pensava que estava a ver uma simples série para entreter praticantes de zapping de sábado à noite, mas não. Mas não. O filme, de 140 minutos, é de um brilhantismo formal notável. De certo modo segue os passos de Rapariga Com Brinco de Pérola que pretendera transpor para a linguagem cinematográfica o universo pictórico de J. Vermeer. Pois bem, em Alatriste é Velásquez a referência: os seus quadros lá estão citados (A rendição de Breda, Las Niñas, retratos vários, como o de Olivares, etc)… O universo preto e cinzento de Madrid, a luz escura do barroco espanhol, está lá tudo.


A excelência formal do filme justifica largamente o seu visionamento: Alatriste é um filme profundamente espanhol na forma e na ideologia, na evocação do Orgulho, da Honra e da Coragem. A história talvez seja o que menos importa, um olhar crítico pode até encontrar-lhe limitações. Mas atentem nas cores, na luz, no trabalho de composição, no notável guarda-roupa. Isto é super-produção, mas não à maneira americana, com os seus mega efeitos especiais, mas uma mega-produção á europeia, com as suas referências de séculos de história e de cultura estética. Na excelente aproximação à pintura, Alatriste fez-me lembrar o excelente Kubrick de Barry Lindon.


Desconfio mesmo que Alatriste me vai fazer repensar as minhas ideias acerca da ligação literatura-cinema. Como muitas outras pessoas eu tenho a ideia comum de que a a daptação cinematográfica empobrece, geralmente, o livro. Não por nenhuma razão de princípio. Simplesmente a minha experiência pessoal fez-me chegar a essa conclusão. Senti isso em muitos casos. Exemplos mais notórios: A Insutentável Leveza do Ser com Kaufmann a assassinar Kundera, Um Chá no Deserto com Bertollucci a não chegar ao nível de Paul Bowles ou Eyes Wide Shot, com Kubrik a perder para Arthur Schnitzler. A excepção: o referido Rapariga com Brinco de Pérola, que acrescenta de facto alguma coisa - nem tanto ao excelente livro de Tracy Chevalier, excelente na análise psicológica - mas ao universo pictórico de Vermeer. E, mesmo sem ler o livro, mesmo que o Alatriste-escrito seja excelente, isso em nada poderá retirar o brilhantismo formal e ideológico a esta realização cinematográfica de Yanes. Que melhor se pode dizer de um filme que é uma versão de um livro, que ele já é autónomo e já se emancipou da obra que lhe deu origem?

20/04/08

Ponto 8 da Ordem de Trabalhos, por Ugly

E o Pinto de Sousa e a sinistra ministra da educação lá suspiraram de alívio com o recente acordo com os Sindicato de profs a respeito da avaliação de professores para este ano. Há quem diga que os sindicatos nunca deveriam ter assinado tal coisa e há quem diga o contrário. Mas passemos por cima dessa questão. Não foi o acordo que me indignou mas uma outra coisa bem mais perversa e vergonhosa que nem sequer chegou a ser aprovada. Refiro-me a um execrável Ponto 8 da Ordem de Trabalhos proposto pela equipa do ministério da educação. É incrível mas é verdade – m.l.rodrigues, valter lemos e pedreira, tiveram a coragem de ousar propor, para aprovação pelos sindicatos, o dito ponto 8 que rezava assim:

«Ponto8:
Acesso à categoria de Professor Titular para os Professores em exercício de funções ou actividades de interesse público, designadamente, enquanto Deputados à Assembleia da República e ao Parlamento Europeu, Autarcas, Dirigentes da Administração Pública, Dirigentes de Associações Sindicais e Profissionais.»

Estamos perante um marco histórico: este artigo, que mereceu o pronto repúdio da plataforma sindical, vale por tudo o resto. Mesmo não tendo sido aprovado – era o que faltava! – é mais uma prova da falta de ética e de decência do partido no poder. Ousar apresentar uma iniquidade destas vai muito para lá do que poderíamos imaginar. É certo que vivemos num país de «jobs for the boys», onde o mérito é habitualmente ultrapassado pelo cartão partidário, mas queríamos, ao menos conservar a ingénua esperança, de que estas coisas se faziam pela calada, de que havia, enfim, alguma réstea de vergonha. Verificamos agora que não, que o pê-esse eleva o seu modus operandi à categoria de matéria negociável, ponto 8 da Ordem de Trabalhos.

Não sei o que mais lamentar neste ponto 8, se a forma imoral como se propõe que os srs políticos, «em exercício de funções ou actividades de interesse público» saltem directamente dos seus altos cargos para o posto mais elevado da hierarquia docente, quando cessarem as suas comissões, passando por cima de todos os outros que estiveram no terreno e se sujeitaram a um concurso (ele próprio aberrante); se a sinuosa parte final do mesmo artigo 8 em que se acena aos sindicalistas com a sua própria passagem directa a profs titulares, como quem diz, «vocês facilitam os nossos boys e em troca, passam também a titulares»… EXECRÁVEL! Mas no fundo coerente, profundamente coerente com a ética geral deste governo pê-esse.

Esta atitude não é excepcional, ela é só mais um episódio que consagra o pê-esse como um partido medíocre posto ao serviço dos mais rasteiros interesses da oligarquia partidária que nos governa. Mas, ainda assim, representa uma subida, quer dizer, uma descida de mais um nível na ética. Porquê? Porque este ponto 8 não é só execrável; é, ainda por cima, despudorado, sem vergonha… Chegámos a um ponto em que atitudes destas, que envergonhariam qualquer pessoa, já nem se disfarçam, antes se assumem publicamente. Atingimos o nível mais baixo da política socratina: o pê-esse é o grau zero da ética! O pê-esse é como aquele TS que anda na rua vestido só como gabardine a mostrar as partes pudibundas a quem passa. E eu já estou como os outros: «Nas próximas eleições vota à esquerda ou à direita mas não votes pê-esse». É que isto já se tornou uma questão de higiene pessoal!

17/04/08

"Fast and Loose...", por Crítico Cinematográfico

The Hustler, de Robert Rossen (1961) é um dos enormes filmes da história do cinema. Um elenco de luxo, um argumento fabuloso e uma cinematografia fora de série. Tudo superlativo. E essa superlatividade como que se poderia condensar toda nesta cena que aqui vos deixo.
São dez minutos de grande intensidade dramática, onde Paul Newman (Fast Eddie Felson) trava os dois grandes duelos da sua vida, na mesa de bilhar com Minesotta Fats (interpretado por Jackie Gleason) e fora dela com George C. Scott:

16/04/08

Fuga da Arte, por Crítico Radiofónico

Este também é para não dizerem que sou faccioso ou ando para aqui a fazer fretes. O panorama dos programas de autor, na rádio portuguesa tradicional, é cada vez mais árido, é certo, mas ainda vão florescendo algumas preciosidades. A net, essa, está cheia delas, mas isso é outra longa conversa.

Além do Íntima, de que já aqui falei, venho por este post dar merecido destaque e divulgação a outro espaço radiofónico (igualmente disponível na net) de grande gabarito. Excelente música de todos os tempos, excelentes referências literárias, excelente tudo:

O radialista chama-se Ricardo Saló e o programa chama-se Fuga da Arte. Fora da net, onde está sempre disponível, pode ser ouvido em directo na Antena 2 aos domingos à meia-noite.

15/04/08

O Nosso (Falso) Emplastro, por Santo Exupério

José Eduardo Simões ganhou, ontem, as eleições para a presidência da Académica. Isto não interessa muito. Mas ao folhear alguns jornais do dia, A Bola em particular, deparo-me com esta foto brilhante. Dirijo-me agora ao núcleo duro aqui do Porco: reconhecem-no logo atrás do Simões, a enquadrá-lo de forma brilhante entre aqueles dedos eriçados a fazerem o vê da vitória? Pois é, é o Carlos Godinho, o nosso Godinho, o nosso Mankas do saudoso Liceu D. Maria. Em nunca mais tinha tido notícias dele e eis que agora ele salta para a ribalta das vitórias futebolístico-eleitorais. É o mesmo sorriso, o mesmo penteado, a mesma alegria que nos contagiava antes de entrarmos nas aulas de Português, de Francês, de Inglês, sei lá eu... Por isso, para nós aqui do Porco, a personagem central desta foto - pese embora a sua vitória eleitoral - não é o JES. É o nosso Godinho só aparentemente o Emplastro da foto. Ele está nesta como está em quase todas as que sairam hoje nos vários jornais a propósito da vitória eleitoral do Simões. Um mister, o nosso Mankas!
foto - Ferreira Santos

11/04/08

Discos Que Já Ninguém Ouve Mas Que São Excelentes: Joe Jackson- Look Sharp e I`m the Man, por ON OFF














São dois dos melhores discos surgidos da New Wave. Jackson conseguiu conciliar a força do punk com a elegância melódica da Pop e resultado foram estes dois discos que podiam ser um só, duplo. Nunca os consegui reencontrar e tenho saudades daquelas músicas. Valeu-me durante anos uma cassete onde tinha gravadas as principais músicas. One More Time: http://www.youtube.com/watch?v=V6xqtVoD-R8&feature=related


08/04/08

Interlúdio Radiofónico, por Gajo Inter-lúdico

Volto aqui no porco ao precioso Íntima Fracção porque há novidades para os adeptos.

Isto porque Francisco Amaral, o cavalheiro retratado aqui ao lado, garantiu a continuidade do projecto, um dos mais antigos, se não o mais antigo, da rádio nacional, no ar e na web desde 1984 (Antena 1, TSF, etc.).

Ora acontece que o programa foi "apadrinhado" pelo Expresso Online e vai passar a ser divulgado e disponibilizado (em podcast) no site do jornal.

O autor mandou o seguinte email a avisar a malta:

Pela primeira vez na imprensa portuguesa, um jornal tem um programa de música próprio. Estreado por Francisco Amaral há 24 anos na Antena 1, ÍNTIMA FRACÇÃO pode ser ouvido em exclusivo no EXPRESSO a partir de agora. Íntima Fracção vai ter podcast e blogue com vídeos e comentários.


Agradeço a todos os que me têm acompanhado até aqui. Dou as boas vindas aos que quiserem conhecer agora a Íntima Fracção. Obrigado.

De nada. Obrigado nós. E eu pelo menos lá estarei.

07/04/08

Relato do Boavista-Benfica, por Off Side

Hoje venho aqui falar do Boavista-Benfica. Quer dizer, não é bem do jogo que eu quero falar, mas do fim do jogo, daquele momento designado na linguagem jornalística por flash-interview. A flash interview é quando os treinadores e um ou outro jogador, suados e ofegantes, vão à sala de imprensa declarar ao repórter da TV que «a equipa bateu-se bem, esteve consciente das dificuldades, mas por azar não conseguiu a vitória e há que levantar a cabeça e continuar a trabalhar», isto em caso de derrota, ou então, na versão-vitória, «que a «a equipa se bateu bem, esteve consciente das dificuldades e mereceu a vitória e agora há que continuar a trabalhar para levar de vencida os nossos objectivos».

Ontem, acabado o jogo lá estava o repórter da Sport TV na flash interview com o Katsouranis do Benfica, ofegante e suado, preparado para o ritual do costume. Mas desta vez não foi assim. Acontece que o repórter desata de repente a informar-nos que «neste momento, mesmo aqui a 10 metros de mim, estou a ver os jogadores do Benfica a protestarem em altos berros com o árbitro da partida (e o Katsouranis a olhar estarrecido) e agora é o árbitro que se exalta, mas eis que aparece o dirigente do Boavista Manel Barbosa que entra em discussão com rui costa, e óóóo, é incrível, há empurrões e agora aparece Petit que tenta separar os jogadores e dirigentes envolvidos e vêm mais dirigentes e jogadores de ambos os clubes e o árbitro também berra ( e o katsouranis a olhar estarrecido) e por aí adiante».

O que é fantástico é que durante este tempo todo, que foram para aí uns bons 5 minutos, nós, espectadores, não vimos nada, zero, a Sport TV não filmou o que se estava a passar a 10 metros e limitou-se a filmar o repórter que nos contava com um ar estarrecido, parecido com o do Katsouranis, que a notícia estava a acontecer ali ao lado!
Creio bem que vivemos um momento histórico, um verdadeiro happening de anti-comunicação. Deixem-me reconstituir, para mim próprio, para ver se entendo bem o que se passou. A TV está no local, certo? Há notícia, há acontecimento, mesmo ao lado, certo? E a opção jornalística qual é? Filmar, como seria óbvio e natural, a notícia que ocorre em directo? Não. Antes filmar o repórter, estarrecido, que nos conta a nós o que está a acontecer mesmo à sua frente e do operador de câmara. Nem lhes passou pelas cabeças apontar a câmara um bocadinho para o lado...

É certo que as televisões não têm autorização para filmar o que se passa nos corredores dos clubes, mas, valha-nos Deus, se os jornalistas estivessem à espera da autorização para filmarem os casos excepcionais, nunca haveria notícias. Salvaguardadas as devidas proporções, que eu saiba, as autoridades Chinesas nunca autorizaram as filmagens do massacre de Tianamen; os indonésios também não queriam que se tivesse filmado as cenas do cemitério de Santa Cruz; e não consta, muito menos, que as fotografias aéreas dos mísseis soviéticos instalados em Cuba nos anos 60, tenham sido autorizadas pelo Fidel Castro.

Se a moda pega ainda vamos ter uma versão TSF dos próprios jogos de futebol, ou seja, as televisões passarão a filmar os seus comentadores a comentarem as incidências do jogo em vez de nos passarem as imagens do jogo… No limite era engraçado termos televisões em que apenas víamos imagens em directo de repórteres-testemunhas relatadores dos factos, como se a televisão fosse, no fundo, a mesma coisa que a rádio, só que com imagens dos relatadores. Acho isto fantástico!

Ainda por cima o non-sense comunicativo não parou aqui. Enquanto decorria o motim no corredor do Bessa o repórter resolveu começar a entrevista ao Katsouranis. Falando em que língua? Português? Não - Inglês! Ou seja, o portuga comum, perdia aquilo que interessava, que era a notícia a ocorrer ali ao lado, para ganhar uma entrevista numa língua inintelígivel (vá lá, no fim houve tradução e ficámos a saber que o Katsou achou que «o jogo foi muito difícil e que a equipa bateu-se bem, esteve consciente das dificuldades, etc».

E é por tudo isto que eu acho que ontem viveu-se história no Bessa. Não porque o Benfica tenha empatado com o Boavista, não porque a arbitragem do jogo tenha sido, efectivamente, miserável, mas porque a Sport TV conseguiu produzir um verdadeiro momento de non-sense comunicacional. Se isto der no you tube é de guardar o vídeo – vale, sem dúvida, uns 10 ou 20 de alunos a agredirem professores.

Pic retirado de www.bridgeandtunnelclub.com/.../18paparazzi.jpg

Uma Palavra Vale Por Mil Imagens, por Medusa

«Desconcertava-a muito mais com a caneta do que com uma câmara (Dune era uma modelo fotográfica contratada numa agência e Paris). Mais radicalmente do que pelas imagens que, por mais indecentes que pudessem ser, não teriam alterado nada do que ela era, sentia-se capturada, possuída, traída pelas linhas de tinta escura que o meu aparo traçava num bloco. À medida que ela sentia que as palavras eram susceptíveis de arrancar-lhe uma parte ignorada, incontrolável, confirmava a minha ideia de que, se havia uma hipótese, para mim, de recuperar algo de Alfa, era através do poder torturante das palavras:
- Porque é que se cansa a procurar frases em vez de me filmar? – perguntou ela por fim, irritada, torcendo cada vez mais o cabelo (…)
- É para te comer melhor minha filha – respondi eu quase sem pensar.
E, ao ver que a história do lobo e da capuchinho vermelho não lhe dizia nada, traduzi logo: - é porque a violo melhor com palavras, Dune. – Pareceu mais aliviada com a resposta. Se houve sadismo nas nossas relações, não foi, da minha parte, deliberado. Só que depressa me apercebi da espécie de terror que exercia sobre ela o mistério da escrita, e pareceu-me bom usá-lo para tentar extorquir-lhe o que jazia muito aquém dela, e que ela ignorava, já que era outra.»
Olivier Rolin, O Cerco de Cartum, Asa, p. 100.

02/04/08

O Mistério Regressa, por Gajo dos Mistérios

Foi há cerca de 20 anos que as conheci ao vivo e pessoalmente. Isto é, pessoalmente mais ou menos. Ainda existia o Muro de Berlim, a Guerra Fria e uma coisa ainda mais distante e esquecida chamada Pacto de Varsóvia, eufemismo do poder imperial soviético. Era num tempo em que muitos de nós, generosos e estúpidos, nos encantávamos com a sereia do socialismo utópico e dos amanhãs que cantam.

Entretanto, os amanhãs desafinaram, o muro e o Pacto caíram de podre e o país dos sovietes para lá caminha. E muitos de nós acordámos também entretanto. Mas desse sonho restaram, na memória de quem o viveu, experiências belas e exaltantes. A memória que tenho delas é uma. Sobretudo porque a experiência que tive com elas foi do domínio da beleza e não da ideologia.

Elas são artistas. Artistas extraordinárias, herdeiras e transmissoras de uma tradição artística sublime. Elas são búlgaras e são um grupo coral. Cantam folclore do seu país e tudo começou para o mundo assim: Algures nos anos 80, a 4AD, editora fundamental dessa década, descobriu este tesouro vocal e, apesar do Muro e do Pacto, lançou um álbum precioso chamado Le Mystere des Voix Bulgaires. Foi Peter Murphy, vocalista dos Bauhaus (uma das bandas icónicas da 4AD), já agora, o responsável pela internacionalização do fenómeno Vozes Búlgaras e pelo lançamento desse álbum e de um segundo que se seguiria. Foi ele que entregou a Ivo, fundador da etiqueta britânica, uma cassete com registos recolhidos pelo etnomusicólogo francês Marcel Cellier, ao longo de 15 anos em zonas rurais da Bulgária.

Depois foi o que se sabe. Alguns anos depois do lançamento do disco, elas passaram por Portugal. Foi numa Festa do Avante e continuavam a existir Muro e Pacto. Nunca fui militante de cartãozinho, mas era simpatizante e nessa Festa estava em trabalho, era um entre as centenas de voluntários que durante uma semana ali acampavam para montar, apoiar e desmontar o arraial comunista.

Quando as conheci estava designado naquele dia para dar apoio a um cameraman que fazia o registo vídeo dos acontecimentos. E nessa qualidade andava com o precioso cartão de acesso aos "backs stages" de todos os espectáculos. E foi assim que as conheci. Mais ou menos. Éramos um pequeno grupo de quatro ou cinco amigos, há algum tempo fãs incondicionais daquela estranha e arrebatadora forma de cantar. Íamos aos autógrafos, também, mas sobretudo para conhecer, falar, ver de perto aquelas criaturas de outro mundo.

O encontro não correu exactamente como esperávamos. Desde logo porque ainda havia o Muro e, mesmo ali naquela grande festa da fraternidade marxista-leninista, não foi fácil chegar à fala. Os contactos eram limitadíssimos e só na companhia de uma omnipresente mulher búlgara mais velha, presumivelmente do PC búlgaro, ou coisa parecida. Uma das condições, se bem me lembro, era não falar de política. Condição inútil porque ninguém estava ali para tal coisa. Mas acabou por ser uma mera troca de apresentações e simpatias breves, e apenas com uma porta-voz do grupo, a única que sabia arranhar estrangeiro.

“Votre music es’t merveilleux”, “mérci beaucoup”, “pas de quois” e etc. Pardais ao cesto, galhardetes, cortesias, coisas do género. Um pouco constrangedor, devo dizer.

Mas poucos minutos depois deste frustrante contacto, começou a magia da beleza. O espectáculo foi dentro de uma tenda parecida com as dos circos, com péssimas condições acústicas e de conforto. Mas fez-se realmente magia e este tornou-se um dos grandes espectáculos da minha vida. E ali abracei definitivamente o mistério. E ainda hoje sou crente.

Isto tudo para dizer que as moças cantadeiras da Bulgária estarão em breve de regresso a Portugal (provavelmente uma outra geração de moças cantadeiras). Já cá estiveram mais vezes depois daquele Avante, presumo, mas desta vez estão mais perto de casa. Passam pelo Centro de Artes e Espectáculos da Figueira da Voz, no dia 6 de Junho. Bilhetes a 25 euros. É caro mas garanto que vale bem a pena todos os cêntimos. Eu já comprei.




01/04/08

Siesta, por Off Shore

Não percebo a sesta! Como dizia o Sérgio Godinho, «eu tenho a morte toda pra dormir». Acho que é uma coisa meio mexicana, faz-me lembrar gajos de sombrero enterrado na tola, desligados do mundo enquanto os gringos vivem. Não é que não goste de dormir. Gosto e muito. Mas acho um exagero passar sábados inteiros a dormir a sesta.

Os sábados à tarde com a malta no Ranhoso, na Curia, nas Lágrimas, até só a correr no Choupal, são imperdíveis. Quando for velhinho admito abdicar deles. Mas agora parece-me quase herético, parece-me uma desfeita aos deuses que nos deram a vida breve para viver e a eternidade para descansar dela.

O Mangas não perdia uma sesta ao sábado à tarde (digo não perdia porque agora ele começa a aparecer mais e mais, aos sábados à tarde). O Mangas parecia-me o Buda que andava a ver se se livrava da roda dos nascimentos e conseguia atingir o nirvana. O Buda que foi viver para debaixo de uma árvore enquanto os passarinhos lhe cagavam em cima da cabeça. O Mangas que dormia a sesta todos os sábados à tarde parecia-me, justamente, um Buda moderno. Sem passarinhos nem cagalhões na cabeça, mas ainda assim, um Buda moderno a viver o seu nirvana de sábado à tarde. Felizmente, parece que ele se está a deixar dessas coisas e agora enfrasca-se como nós na cafeína das bicas do Ranhoso. Hare krishna, mafrende...