29/04/10

O Jogo Eterno, por Camões Alves


Quando Portugal perdeu a final do Euro 2004 com a Grécia, escrevi aqui este texto amargo, em que faço referência ao jogo eterno que se trava no futebol. Ontem teve lugar mais um capítulo desse jogo eterno. Num jogo em que o barça teve 75% de posse bola (!!!!!) e 555 passes contra apenas 59 do inter (?!?!), num jogo em que o victor valdez, o guarda redes do barcelona, jogou, literalmente,no meio campo, abriu-se um nova escalão na prática do futebol-anti jogo. Talvez a equipa de Mourinho tenha, desta vez, um bom pretexto para justificar tal atitude: jogou com 10 a partir da meia hora de jogo. Mas isso é um mero pretexto: porque as equipas do «às das táticas» jogam assim, por norma e filosofia, e porque, mesmo com onze, a tática já era aquela coisa brilhante de meter 11 gajos na grande área a dar chutos para a frente. Fica o texto escrito há 6 anos após a final do euro, que me parece mais actual do que nunca: desta vez, o Barça foi Portugal e a Grécia foi o Inter:

Há duas famílias opostas na história do futebol: a família das equipas que praticam o jogo, querendo ganhar e a das que o praticam para não perder. À primeira família pertencem equipas como o Brasil tri campeão dos décadas de 50, 60 e 70, mas também o Brasil perdedor do mundial do Espanha 82; o Ajax vitorioso de Cruijjf ou o bayern de Bekenbauer, a laranja mecânica de Rinus Michels (que nunca ganhou um mundial) ou a Holanda de Van Basten, etc, etc, etc. A lista dos membros desta família é enorme e é feita, tanto de vencedores como de perdedores. Bem mais vencedores que vencidos, felizmente, para quem já me está acusar de ser lírico…

Depois existe a outra família, a das equipas cínicas, parasitas do jogo alheio, que esperam pacientemente o erro do adversário até o matarem numa oportunidade o jogo. É o caso da Alemanha campeã contra a Hungria de ataque de Puskas numa final violenta donde saem dois jogadores magiares lesionados, logo na primeira parte. É também o caso da Itália de Rossi e Gentile – que não era uma equipa bacteriologicamente pura, mas teve de defrontar o Brasil de Zico e Falcão e foi obrigada a fechar-se -, da Juve da última década, do Steua de Bucareste de Ducadam, da Alemanha do mundial de Itália ou do Brasil do mundial dos EUA…

Estas duas famílias «ideológicas» constituem duas formas de entender o futebol e enfrentam-se no mesmo jogo eterno ao longo da história. Umas vezes ganha uma e outras, outra. Eu sou um adepto incondicional do primeiro estilo. Por razões éticas e estéticas: porque acho que essa família de equipas que jogam para ganhar, e não a outra, é que faz a grandeza do futebol. Mesmo quando a outra família ganha…
Por isso quero que a minha família futebolística ganhe sempre e, mesmo quando Portugal não está em competição, eu sinto-me sempre representado por uma ou por outra equipa que eu reconheço na mesma tradição familiar. E acho que de cada vez que uma equipa de rapina ganha uma competição importante, o futebol regride uns anos.

Ontem virou-se mais um capítulo deste jogo eterno. Portugal, obviamente, representou o estilo de futebol ofensivo que eu aprecio. E os gregos foram os outros. Portugal perdeu e foi pena para o futebol. Eu vi e revi o jogo e, em particular no resumo da sport tv, pude confirmar que os gregos defendem, sistematicamente, com 11 – onze-11 jogadores atrás da linha da bola. Como no jogo com os Checos, deram cerca de 70% de tempo de posse de bola a Portugal. É muito difícil marcar um golo a equipas assim e essa é a sua vantagem: elas partem do princípio que o 0-0 já é um bom resultado e que nos penaltis até podem ganhar.

Eu acho que há uma solução para ganhar a equipas destas, mas esse caminho é uma traição – embora realista – ao estilo e à família de futebol que eu prefiro. É o que fez o Brasil do mundial dos EUA que defrontou a Itália na final mais vergonhosa de todos os tempos. Os brasileiros trocaram as voltas aos italianos e, dessa vez, não assumiram as despesas do jogo. Fizeram como a azzurra tinha feito no Espanha 82 e passaram 90 minutos mais a meia hora do prolongamento a trocar a bola no seu meio campo Resultado: zero oportunidades, ausência absoluta de emoção e, possivelmente, oportunidade histórica perdida de lançar o futebol nos States. No fim, ganhou o Brasil na lotaria dos penaltis como poderia ter ganho a Itália. Foi o título mais amargo da história do futebol brasileiro!

No jogo de ontem, Portugal (ou scolari) não quis fazer o mesmo e foi fiel à sua família ideológica. Perdeu o jogo por 1-0. Mas se me perguntarem se preferia ter ganho, fazendo o mesmo que os brasileiros fizeram no mundial dos Estados Unidos com a Itália, eu digo que não. É só uma opinião, mas prefiro ter perdido o jogo e continuar a acreditar que é possível que as equipas mais espectaculares ganhem grandes competições, jogando o jogo pelo jogo. Paradoxalmente é isso que dá brilho às vitórias de equipas como a Grécia. O entusiasmo com que aquela vitória é saudada vive do arrojo e da desenvoltura de selecções como Portugal ou como a República Checa que, jogando ao ataque, contribuíram para lhes dar a noção de que tinham alcançado um feito superior às suas capacidades.
Mas imagine-se uma final entre a Grécia e outra equipa igual: alguma delas teria vontade de festejar? E se a atitude de todas as equipas fosse a da Grécia, alguém acha que continuariam a encher-se os estádios de futebol? Eu acho que não. Mesmo perdendo, a selecção portuguesa merece o meu aplauso por ter permanecido fiel ao futebol e aos valores desportivos e lúdicos que fazem de mim um adepto da modalidade.


PS – Também é claro que, se eu fosse treinador profissional de futebol e me entregassem uma equipa como a dos gregos, não teria outro remédio que não fosse metê-la a jogar como fez o Renhagel, contra o gozo de adeptos como eu. E nisso, é claro que o homem tem mérito. Não me peçam é para dizer bem daquilo. Parabéns pela vitória, é tudo o que lhes posso dizer.

PS 2- Este é o pior campeão europeu da história, pelo menos desde 72 – no euro desse ano o campeão foi a Alemanha de Bekenbauer, Breitner e Netzer. No seguinte ganhou a Checoslováquia de Panenka e Nehoda; em 80 a Alemanha de Kaltz, Schuster e Rummenige; em 84 a França de Platini, Giresse e Tigana, a seguir, a Holanda de Van Basten e Gullit. Em 92 foi a a Dinamarca de Laudrup e Poulsen e em 96 a Alemanha de Sammer e Klinsmann e depois tivemos mais França com o grande Zidane. A semelhança entre esta equipa da Grécia e qualquer uma das que citei é … Bem, eu não vejo nenhuma…

6 comentários:

Catanacio disse...

Eu quer-me parecer, Camões, tu desculpa, que não te deste conta de um equívoco monumental: o futebol, como qualquer desporto, não foi inventado para essa espécie exótica que, à falta de melhor, designaremos por “amantes da modalidade”. O futebol, tu desculpa, é para as equipas que estão em campo e seus adeptos. Tu pensa nisso devagarinho e com calma, retira as devidas ilações e depois diz mais alguma coisa. Uma pista: tu imagina um campo de batalha. Estão dois tipos a assistir ao combate no alto de uma colina. Diz um: méne, tu repara na suprema graça com que aqueles archeiros levantam seu arco e disparam suas setas num ângulo perfeito. Diz o outro: dá gosto, méne, é batalha espectáculo. Olha, repara agora naquele valoroso soldado de infantaria que corre para o adversário com sua espada desembainhada a voltear no alto da cabeça, enquanto canta o hino nacional! Espectáculo. Pois é, só é pena aqueles cabrões do outro lado que não saem de trás dos canhões a disparar contra os adversários.

A sério, irritam-me solenemente aqueles gajos do Barcelona, com a porcaria da arrogância da superioridade moral e desportiva do barcelonismo e do catalanismo. Não há pachorra. Ganda Mou, que meteste os gajos no sítio! O seu único compromisso é com os jogadores e com os seus adeptos e o Inter está outra vez, passados tantos anos, numa final dos campeões. Isto é a alegria e felicidade dos adeptos. O resto, é treta.

Anónimo disse...

catanacio tu falas como adepto do inter. Se te desses ao trabalho de leres o que escrevi no post - e eu percebo que não valha a pena, aquilo é um lençol, mas o blog é meu e escrevo que quero e lê quem quer - percebias que eu faço uma distinção clara entre o olhar do adepto e do apreciador da bola. Eu sou do benfica. Como adepto do benfica quero sempre que o benfica ganhe nem que seja à mourinho. Por isso compreendo os italianos do inter. Festejem à vontade...
Mas não estando o benfica em causa- para mim tanto se me dá o inter como o barça - quero sempre que ganhe quem pratique bom futebol pelas razões que exponho. O que não compreendo é como gajos que não são, nunca foram do inter, como suponho ser o teu caso, digam bem daquela merda. Ou melhor, percebo: são adeptos do mourinho. O que também é compreensível num país triste que à falta de coisas melhores endeusa um treinador que se distingue a pôr em prática um tal futebol negativo. Diz assim, tu e os tugas que aceitam a propaganda nacional: o nosso clube é o mourinho porque é tuga! Eu compreendo, ok, é como eu que sou do benfica. Não me peças é para dizer bem daquilo.

Catanacio disse...

Camões, não estando em jogo nenhuma das equipas de que “gosto”, tanto se me dá que joguem bom como mau futebol. Aliás, não sou capaz de ver um jogo de equipas que não me interessem, tipo o Hertha de Berlim contra o Osasuna, mesmo que aquilo seja um festival de futebol (se lá houver um tuga, é outra história...) Quando um deles marca um golo, é suposto um gajo saltar da cadeira? Eu sou um mau adepto de futebol, eu sei, e nisso não sou exemplo para ninguém. No caso, apoiava o Inter, confesso, mas foi um apoio conjuntural: de um lado estava o Mourinho, e aí sou suficientemente parolo para apoiar até qualquer clube de ping pong onde jogue ou treine um português, e do outro lado estava o Barcelono, e eu não gosto do Barcelona, por causa da mistura que aí se faz entre politica e futebol, mais as manias de superioridade étnica e moral dos gajos. E depois (ai vais-te rir) eu quero que em Espanha ganhe o Real Madrid por causa do Cristiano Reinaldo. Eu sei que tudo isto é triste, tudo isto é fado, mas olha é o que se consegue arranjar ;)

Catanacio disse...

FUCK YOU TOO MADARFUCKER!!!

Tás a ver, isto é que é viver o tutebol com paixão e joy de vivre. Este deve ser do Barcelona.

MESSI ES UM CHULECO QUE NO VALE UM CARACUEL Y PUTA MADRE COJONES!

Anónimo disse...

Camões, FUCK YOU AND THE HORSE YOU RODE IN ON !!!!!!!!!!!!!!


assim é que está bem.


Cattannaccio, vem a meus braços irmãoe querido!

Anónimo disse...

Pois, pá, tá tudo dito nos teus comments: somos dois tipos de adeptos completamente diferentes que gostam de futebol por razões completamente diferentes.
Camões