Um dia destes vi um reality show televisivo que ultrapassa largamente a fronteira da idiotia - os vips na tribo ou os perdidos na tribo ou os burros na tribo, mais coisa menos coisa. A ideia é meter uns pseudo-distintos jet-sets tugas a viverem durante um mês entre tribos nativas de regiões tão distantes como a Etiópia ou um arquipélago algures no sudeste asiático ou assim.
Passo por cima da idiotia dos representantes da civilização tuga que os leva a falar em português com os nativos como se eles percebessem alguma coisa do que ouvem. O que me chamou a atenção é que este programa já está a desenvolver nos telespectadores um imbecil efeito de etnocentrismo. Já me aconteceu falar com uma ou duas pessoas que acham que aquela gente é realmente atrasada e que a nossa cultura é muito superior!
Ora isto é um perfeito disparate porque omite que aquilo que vemos na TV é um concurso, um reality show e que, portanto, aqueles primitivos não podem ser tidos como amostra representativa da sua cultura original. Presumir que o que vemos ali é um encontro - ou um choque - de culturas é disparatado pela simples razão que o lado de lá está a fingir e a representar tanto como o de cá. Quando os «primitivos» obrigam os homens-tugas a dormirem com o resto da tribo numa palhota, isso foi programado, não é, certamente, genuíno. Quando os chefes tribais falam com maus modos e dão ordens, em tom agressivo, áquela malta ou comparam as mulheres a porcos, fazem-no porque assim foram instruídos pela produção do programa que está interessada - pelo menos para já - em criar esse efeito de choque cultural.
Não sabemos como seria o encontro genuíno de um tuga mais ou menos bronco como o fernando mendes ou de uma aventesma como o castelo branco com uma tribo da Etiópia. Mas não seria decerto assim. Quem fala pela boca dos chefes da tribo é a produção do programa. Tudo o que vemos ali é artificial, um mero produto de fancaria que pretende confundir a ficção com a realidade. E, portanto, não há nada mais estúpido que encarar aquela coisa como um testemunho sociológico. É só um espantalho, nada mais que um espantalho.
2 comentários:
A tua escrita fluida com algumas palavras caras esconde um absoluto ignorante. Faz uma viagenzita e procura uma destas tribos, garanto-te que te acolhem, mas daí a conseguires ficar por lá...já é outra história! Que a tv está repleta de absolutos disparates lá isso é verdade, mas no mundo dos reality este é sem dúvida um dos mais interessantes, talvez porque as pessoas que lá estão não me dizem absolutamente nada, e para mim são uns quantos portugueses saídos de uma civilização contemporânea desenvolvida, para uma civilização primitiva (procura o significado exacto desta expressão em sociologia ou arte). No fim cabe ao expectador fazer a filtragem do que vale a pena ou não aprender.
Por falar em «palavras caras» (?) não conhecia uma que usas no teu comentário: «expectador». E sabes de sociologia e tudo, fónix...
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