Vittorio de Sica, Ladrões de bicicletas (1948). Vittorio de Sica e este seu Ladrões de Bicicletas é um bom exemplo de como os rótulos são tramados. Este filme levou com o malfadado rótulo de filme neo-realista e uma pessoa fica logo de pé atrás. «Vittorio de Sica? Ná, não gosto de neo realismo». Mas esqueçamos os rótulos e tentemos apreciar o filme apenas pelo que ele é. É excelente!
Foi num magistral documentário de Scorsese sobre o cinema italiano que LB me chamou a atenção. Scorsese adorou-o e eu também! Acho notável a simplicidade sofisticada do argumento: a forma como uma bicicleta é, para um desempregado miserável, a coisa mais valiosa do mundo comove-nos. Uma bicicleta não é nada mas para ele é condição de uma vida digna. Há aqui uma referência ao tema do fetichismo (Marcuse) próprio da sociedade capitalista e à forma como esta impõe o culto perverso dos objectos, um tópico que pode ser levado muito longe...
Mas é o lado humano do filme o que mais enternece. A relação entre o pai e o filho e o exagero sentimental que decorre da sua condição miserável, entre o ridículo e o dramático… A dupla faz lembrar um outro par adulto/criança do cinema - Chaplin e a criança. De Sica dá neste filme uma lição de como é possível andar na fronteira entre a lamúria ideológica e a pieguice sentimental sem nunca para lá resvalar. É um território muito instável e difícil, como caminhar num trapézio sem rede, mas ele consegue-o de uma forma brilhante. Outros mais recentes bem o tentaram, mas, claro, deu asneira e precipitaram-se no abismo da lamechice – falo dos insuportáveis Bellini e Tornatore, incomparavelmente ligeiros ao lado da magnitude de de Sica e deste Ladrões de Bicicletas. Sem dúvida, tarde mas a tempo, este tornou-se num dos meus filmes preferidos (obrigado mais uma vez, L., mafrende!).
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