13/05/09

Um Dia de Cólera de Arturo Pérez-Reverte, por Manolete




Um Dia de Cólera (2007), o último romance de Arturo Pérez-Reverte publicado entre nós é o seu melhor livro, de todos os que dele li até agora. Dele li o Hussardo (primeira obra de 1989 que me parece, agora, um prenúncio deste mais recente), O Pintor de Batalhas, O Cemitério dos Barcos Sem Nome, O Mestre de esgrima e, da saga capitão Alatriste, li O Capitão Alatriste, Limpeza de sangue e O Sol de Breda.

Este mais recente Um Dia de Cólera retrata os trágicos acontecimentos do dia 2 de Maio de 1808, ocorridos em Madrid por altura da ocupação da cidade e de toda a Espanha pelas forças imperiais de Napoleão Bonaparte. Reverte começa pelas horas de tensão acumulada que antecedem os primeiros motins até à explosão de violência brutal que dura todo o 2 de Maio.

Mas o modo que escolheu para construir este romance não deve nada ao facilitismo. Reverte fez uma pesquisa aturada, baseada nos relatos da época das multidões de anónimos espanhóis que morreram durante esse dia em luta contra os gabachos (nome pelo qual nuestros hermanos tratavam os franceses. Embora o termo «gavacho» tenha outras raízes aqui inexploradas que se prendem com questões mais esotéricas). Assim o livro é um desfile de centenas de anónimos, de curtas vidas que passam como cometas pelas páginas do livro. Há personagens que aparecem e desaparecem numa frase ou num parágrafo; muitas vezes é uma simples referência ao nome, morada, profissão e naturalidade das vítimas; noutros passos as personagens são mais permanentes. O grande pintor dos acontecimentos dessa noite, o magnífico Goya pintor dos Fuzilados do 2 de Maio e da Carga dos Mamelucos merece uma página inteira… Mas há dois heróis, as personagens centrais da narrativa, que percorrem todo o livro: os capitães do exército espanhol, Pedro Velarde e Luiz Daoiz. Presumo que sejam personagens conhecidas pelo espanhol comum, se não são deviam ser e Reverte faz-lhes aqui uma justa e sentida homenagem.

Foram estes dois oficiais que levaram a sua divisão à subvelação contra os gabachos na esperança vã de que outras unidades militares madrilenhas se lhes juntassem. Velarde e Daoiz simplesmente não aguentaram o sentimento de humilhação nem a cobardia de ficarem a assistir à chacina dos seus compatriotas populares às mãos dos franceses. Enganaram-se quando pensaram que o seu exemplo de coragem levaria o exército espanhol a sair para as ruas de Madrid em apoio da revolta popular. Morreram em luta contra os franceses mas o seu exemplo havia de perdurar no levantamento de toda a Espanha.

3 comentários:

Anónimo disse...

Falta aqui a leitura do Território Comanche, para mim a mais conseguida obra do Reverte.

alquimista

PS: Ainda não li nem a Colmeia do Cela, nem este aqui referido do Reverte, mas pela sinopse de ambos não há alguma similitude na estrutura de ambas as obras, nomeadamente nas multiplas personagens que aparecem e desaparecem.

Anónimo disse...

faltou em cima o ponto de interrogação.

alqimio

Anónimo disse...

A Colmeia e este são muito diferentes. Têm esse ponto em comum, de facto...

Quanto ao Território Comanche esqueci-me de referir que não gostei. É daqueles livros que larguei em desgosto, não aprecio particularmente aquele estilo de livro de repórter de guerra. E já que falamos nos Revertes que menos gostamos, também não apreciei por aí além O Cemitério dos Barcos Sem Nome, demasiado «cinematográfico» para meu gosto. Quanto aos outros: polegar ao alto para eles e em particular para Um Dia de Cólera!
Manolete