02/02/12

As Minhas Aventuras na Repúbica das Bananas, por Ali Bebé

Recebi em casa uma dessas horrendas cartas com o logotipo tenebroso das finanças. Não gosto de lidar com tal gente que considero não recomendável. Tenho sempre a sensação de que estou a ser comido por parvo. Mais uma vez assim foi.

A referida carta era uma «coima» de 15 euros ao abrigo do decreto xpto. Isto não se percebe à primeira leitura porque o arrazoado pseudo-técnico em que estas cartas vêm escritas é feito deliberadamente para não ser entendido. Assim pode ser que o cidadão não perceba mais um pormenor e acabe a pagar mais uma «coima».

Depois de decifrar aquela charada linguística, decidi pagar os 15 euros para não me chatear - eu pago só para não ter que lidar com aquela gente - mas passadas umas semanas eis que recebo uma nova carta, isto é, um novo tratado de má fé. A nova carta «intima-me» a pagar uma nova «coima», desta vez de 68.25 eur. ao abrigo do decreto xzpt e eu consigo perceber que tem uma relação remota qualquer com a «coima» de 15 euros que paguei anteriormente. Telefonei ao P. que é um gajo que sabe da ciência de decifrar manhas e ele explicou-me.

A «coima» de 68.25 eur. (30 de multa e mais 38.25 de «custas», é espantoso!) é porque eu deixei passar o prazo de pagamento da «coima» anterior de 15. euros. Hã?? Pois, traduziu o P., a multa de 15 euros foi porque paguei fora de prazo o imposto de circulação automóvel, certo? Sim... Só que paguei esses 15 euros fora de prazo e por isso tenho agora de pagar 68.25. Mas como é que eu podia saber o prazo em devia ter pago esta multa se a carta não me diz? Também diz - está lá em letras pequeninas, num nevoeiro de palavras ali postas deliberadamente para confundir ainda mais, que o contribuinte tem 10 dias para pagar após o prazo de recepção da carta. Porra, mas porque é que não dizem logo, como acontece na factura da água, do gás, do telefone, da tv, de tudo, enfim, que a data limite de pagamento é x? Suas excelências das finanças nem disso nos informam e um gajo tem que se pôr a calcular/deduzir/adivinhar quando é que vencem os tais 10 dias de prazo. E isto é legal?

Recapitulando: recebi uma primeira carta das finanças para pagar 15 euros não sei quando porque não me informam. E agora recebi uma segunda carta das finanças para pagar 68. 25 num prazo que também ignoro porque não me informam, embora saiba que é dentro de 10 dias a contar sabe-se lá de quando...

Mas pior que isso é que a contagem destes 10 dias está longe de ser uma coisa simples, pelo contrário, é um processo críptico. Acontece que a carta das finanças não diz em lado nenhum em que dia chegou à minha caixa do correio. E ainda por cima eu mandei o envelope fora, ó P. Não mandaste nada, esclareceu-me o bom do P. A carta vem dobrada e picotada. Pois é mas não diz a data em lado nenhum. Calma, tás a ver o código de barras no lado esquerdo da folha, diz-me o P? Pois, por baixo dele estão umas letras e uns números, tipo, 0TR009876549. Fónix, a data vem em código? Não acredito, estão a gozar comigo.... Eu pensava que o P. me ia informar que os primeiros três dígitos correspondiam à hora, os segundos dois ao dia e os últimos ao mês ou coisa que o valha. Mas não. A coisa tem requintes de maior malvadez.


Acontece que o tal código é uma senha de acesso a uma janela de um site dos CTT. Pois, é verdade. O cidadão que quer saber em que data recebeu, oficialmente, a carta dos humoristas das finanaças, temque ir a um site dos ctt, clicar não sei onde, depois seguir para a opção não sei quê, mais uma e outra e só depois, na opção x, introduzir o código. E então e só então sabe a data em que oficialmente recebeu a famigerada carta para a partir daí contar 10 dias!!! Parece o mapa ao tesouro em versão de adultos e para divertimento de um gozão qualquer instalado algures num escritório das finanças!

Pergunto: como é que um cidadão comum, firmemente apostado em pagar os seus impostos, sabe isto? Pode ser uma informação corrente para um funcionário administrativo, para um advogado ou para um génio das finanças... Mas não o é para um carpinteiro, para um trolha, para um médico, para um professor, para um engenheiro nem para um revisor da CP. Mas os senhores das finanças presumem que um gajo saiba esta merdice. E é legal? A lei admite que estes ininputáveis me definam uma data limite de pagamento sem sequer me dizerem claramente qual é? E, pior ainda, obrigando-me a um processo rocambolesco de descriptação? Se isto não é uma forma de assaltar o cidadão o que é? Esta gente devia ser responsabilizada pela utilização destes processos que só têm uma finalidade: extorquir dinheiro ao contribuinte mediante a criação de expedientes manhosos.

Foi assim que se passou comigo: quero cumprir a lei mas sou impedido de o fazer e punido com multas manhosas, simplesmente, porque as finanças não me dizem claramente como fazê-lo, pelo contrário, dizem-mo enviezadamente mediante o recurso a armadilhas dignas de chico espertos. E assim uma pessoa que devia ter pago, suponhamos 50 euros de imposto de circulação automóvel acaba a pagar 50 + 15 + 68 e veremos se não fica por aqui... Sei que os 50 são para as câmaras, mas os espertalhões das finanças arranjaram um processo vergonhoso de embolsarem muito mais nestas multazecas. Conheço uma pessoa que já vai em 400 euros só nestas multas crípticas.

Mas há pormenores ainda mais sórdidos nisto tudo. Por exemplo os 68. 25 que tive que pagar afinal não são 68.25 mas 68.25 - 15, uma vez que os 15 da multa anterior devem, por lei, ser descontados aos 68. 25 Então porque é que não me pedem o dinheiro certo? Pois, porque pega, porque são mais uns milhões a entrar nas finanças à custa da desinformação do cidadão.

Resumindo: recebi uma carta que me diz para pagar uma quantia que não é aquela, numa data que eu não faço ideia de quando seja! Espantoso, legal e ninguém é chamado à responsabilidade por este embuste... Pelo contrário os gajos das finanças ainda se vêm gabar para a comunicação social do seu grande desempenho e como nestes últimos anos conseguiram cobrar mais não sei quantos milhões de euros aos contribuintes! Assim? Pudera... Deviam era ter vergonha na cara.

Mas não é tudo. Kafka não morre assim. Acontece que a tal carta - esta e qualquer outra enviada pelas finanças - é uma carta registada simples. Quer isto dizer que eu não sou pessoalmente notificado da sua recepção, não assino nada que comprove que a recebi. Assim, segundo a lei, a partir do momento em que a carta chega aos corrreios e é entregue ao carteiro eu estou oficialmente notificado! Se a carta se perder, se o carteiro a rasgar, se eu mudei de residência, se um brincalhão me roubou a caixa de correio, nada disso importa - a data de recepção da carta é oficialmente a data do seu registo simples! Ou seja eu posso nunca receber a notificação e andar a vida toda a pagar multas e, no limite ser penhorado, porcausa de uma carta que nunca recebi. Recebesse, o problema é meu! Qualquer dia um gajo vai de férias em agosto e chega a casa em setembro e ela foi vendida por causa de uma multa que não paguei no prazo e de cuja existência nunca vim a saber... Já faltou mais.

E é assim que o estado e em particular essa máquina de má fé e desrespeito pelo cidadão que são as finanças tratam os cidadãos. Aqueles que querem cumprir. Porque aos outros, aos que traficam trutas, salmões, pescadas e robalos de ocasião, a esses ninguém lhes toca e ainda têm leis feitas a dedo para os defender. O pior numa democracia é quando o cidadão cumpridor perde a confiança nas instituições e, pior ainda, percebe que elas são simples máquinas de extorquir dinheiro, apoiadas por legislação iníqua que se limita a regularizar a farsa. Eu sei muito bem do que é que este país precisava. Sei, mas não digo...

1 comentário:

Anónimo disse...

isto é um post que merecia circular pela net como aviso e abaixo assinado


e esta é a ponta do véu.

quando esses carrascos vêm falar de mais 300 milhões cobrados pelo aparelho, isso em regra significa que uma legião de desesperados ficou a dever 100 milhões há menos de um ano e que poucos meses depois levam com multas e juros sobre juros e juros sobre multas até dar os 300 milhões.

por exemplo se alguém tiver algum problema com a cartita do IMI que deixe passar um dia do prazo, repito um dia, ao outro dia o imposto de 250 transformou-se em 500 e passados uns meses recebe mais outra cartita, com mais a a contraordenação coima e custas.

eu quandia lia as proscrições dos romanos e da inquisição com os consequentes processos sumários e as respectivas confiscações totais de bens e valores achava uma coisa inimaginável e mal eu sabia que vivia no mesmo.

e essa malta medieva ainda se dava ao trabalho de nos arrancar a ferros a confissão. agora, a confissão já está pré-determinada quando computador vomita a cartita.

e só nos poupam a fogueira porque não querem gastar dinheiro em fósforos.