
Já tivemos esta discussão em muitas outras ocasiões: discutiu-se muito se o cinema mataria a leitura, se vídeo ia liquidar o cinema, se o CD liquidaria o vinil, se o telemóvel daria cabo do telefone fixo, etc, etc... Geralmente o advento de um novo medium é contemporâneo de anúncios apocalípticos de outros. E as respostas variam , caso a caso. Nuns casos, sim, há um novo medium que destrói outro ( o CD praticamente anulou o vinil e liquidou de vez a cassete, mas o vídeo apenas alterou o cinema sem o matar em definitivo...).
Agora a discussão ressurge a propósito do Kindle. O Kindle é a nova maravilha da Amazon, a primeira geração de uma nova ferramenta, o livro digital, que a meu ver revolucionará o futuro. Tem a forma de um livro normal, um peso rídiculo e a grossura de um lápis. E não, não me parece que o livro digital acabe de vez com o livro tradicional, mas que vai mudar profundamente o panorama, isso vai.
São-nos familiares os argumentos dos defensores do livro em papel: o cheiro, o lado sensorial do livro, a comodidade de leitura, etc. Balelas! Não que eu não reconheça essas virtudes todas e muitas outras ao livro em papel (por alguma razão sou um leitor compulsivo)... Mas acontece que as imensas potencialidades do Kindle vão arraasr simplesmente a concorrência. Cito algumas:
1. O Kindle permite o carregamento de milhares e milhares de livros num pequeno suporte, levezinho e com a espssura de um lápis. Significa que vamos poder ter a nosa biblioteca toda, aquela coisa que nos ocupa estantes e estantes e divisões lá em casa, num pequeno espaço que cabe no bolso de um casaco. Já pensaram nas possibilidades que isso dá? De agora em diante, quando formos de férias não temos que estar a escolher 3 ou 4 livros para levarmos na mala. Vai a biblioteca toda num pequeno volume que viaja connsoco e está a sempre à mão. Na praia, no campo e na montanha está tudo ali acesível a um click. Acabaram-se as esperas desprevenidas. Com o Kindle podemos sempre ler, seja onde for, temos milhares de opções para matar o tempo. Acabaram-se as secas no médico.
2. As possiblidades interactivas são fantásticas embora não estejam ainda completamente desenvolvidas. No futuro o E-livro terá, obviamente, aceso à internet. Podemos estar a ler um livro sobre pintura e ir ver os quadros - seria uma experiência muito diferente ler, por exemplo, O Pintor de Batalhas do Reverte e poder contemplar ao mesmo tempo o quadro de Brueghel que o inspira. Referências musicais, de cinema, de arquitectura, outros livros, críticas, tudo à mão de semear... E jornais, revistas, blogs, fóruns de discussão, e-mails de passagens mais marcantes para amigos, é impressionante como o hábito da leitura se pode transformar tão profundamente.
3. Já pensaram bem nas implicações profissionais da coisa? Um conferencista, um professor, um advogado, um médico, praticamente toda a gente, passa a ter obras marcantes à disposição imediata. Numa conferência podemos cruzar referências, fazer citações exactas...
4. E ainda há questões de forma. Quando nos dizem que ler no écran é mais cansativo para a vista, respondo que é uma questão de tempo e de hábito. A tecnologia digital vai permitir uma leitura ainda mais cómoda que o livro. Há técnicas que simulam o próprio gesto de desfolhar: com um dedo passamos de uma folha para a outra, como num livro. E,se pensarmos nas limitações do livro, vemos que o E-livro só pode melhorar o cenário. Pensemos na limitação da letra, por exemplo, o tamanho minúsculo de certas edições que, praticamente nos impede a leitura. Com o Kindle podemos aumentar o tamanho de letra, variar a cor, dar-lhe a forma que quisermos. Em matéria de conforto o cenário é para melhorar e não o contrário.
5. Para nós, portugueses, há ainda outra vantagem. É que vamos passar a ter acesso ao imenso mercado brasileiro (e não só). Milhões de livros que não se encontram nas nossas livrarias, porque nunca foram editados, vão passar a estar disponíveis.
6. E o tempo trará, concerteza, o advento daquilo que erroneamente se chama a «pirataria». Mais tarde ou mais cedo vamos poder trocar livros. Olha gostei da poesia do Camões. Toma lá e passa-me a Mensagem do Pessoa. Já imaginaram a facilidade?
7. Last, but not least: o preço. E se todos os outros argumentos não vos convenceram, avanço com o último: o preço. Neste momento um livro que sai a 25 euros em suporte de papel pode ser adquirido por 10 em suporte digital! E a tendência é que o E-livro desça (para não falar na possibilidade já referida da partilha dos ficheiros).
Concerteza que haverá desvantagens. Mas não posso ser eu a fazer tudo. Avançem vocês com as desvantagens do Kindle na caixa dos comments. Entretanto, e até que alguém me convença do contrário, eu declaro-me desde já um adepto do livro digital. Neste momento a coisa sai por cerca 200 ou 300 euros. É uma questão de tempo e todos teremos o nosso Kindle.