Na sexta feira passada lá fomos jantar pela segunda vez em dois anos ao melhor restaurante conimbricense ( e não só), o Arcadas da Capela. Aquilo não é bem um jantar: é mais uma experiência estética, não é por acaso que o Arcadas é o único restaurante a norte do Tejo com uma estrela Michelin. Sobre a excelsa qualidade do repasto não me vou alongar, até porque me repetia. Há por aí um post atrasado onde já me pronunciei sobre o Arcadas, é irem ao searcher do blog, quem tiver curiosidade... Mas durante a jornada houve uma ocasião em que nos embrenhámos numa discussão teórico-filosófica na qual muito aprendi e que desejo aqui partilhar.
Começo por esclarecer que sou um apreciador de nichos de sabedoria. Adoro aqueles gajos que sabem tudo acerca de coisas que não passam pela cabeça de ninguém, é que adoro mesmo, quero logo saber tudo sobre essas matérias insólitas, às quais se dedicam meia dúzia, se tanto, de cabeças eruditas. Ouço com prazer discussões apaixonadas sobre os melhores defesas laterais do mundial de 1962, leio compêndios sobre stress galináceo, aprecio dogmas sobre os maiores exportadores mundiais de água pé, explicações detalhadas sobre filósofos romanos estóicos e contendas sobre a capital do Brunei. É uma tara como outra qualquer e, ao menos, não prejudica ninguém.
Ora no nosso último jantar, tivemos o prazer de contar entre os convivas com um dos maiores especialistas vivos em... bacalhau. O J. sabe tanto de bacalhau que é um prazer ouvi-lo. E foi o que fizemos a determinado momento quando ele começou a dissertar sobre o fiel amigo: qual é o melhor bacalhau, em que altura se pesca, as complexidades da sua produção, até o insuspeito, para mim, problema da manipulação do bacalhau, que eu jamais sonhara que pudesse existir. Foi um prazer e uma oportunidade de nos cultivarmos, ouvir o J. falar com autoridade insuspeita sobre bacalhau.
Mas o mais espantoso foi quando ele denunciou a foca como principal inimiga do bacalhau. Eu não fazia a mínima ideia de que a foca podia ser uma verdadeira peste negra para o bacalhau. Pelo contrário, como toda a gente, sempre encarei as focas como uma espécie em vias de extinção, que devemos defender a todo o custo da perseguição de codiciosos perseguidores. A foca, de resto, como o golfinho ou a baleia anã, é até um dos ícones do ecologismo... Compreende-se: as focas são kiduchas, têm um look simpático e parecem pacíficas. Ainda por cima contaram com a Brigitte Bardot na luta encarniçada pela sua defesa. Ora acontece que, segundo o J., não é assim. O J. arrasou-nos com os dados esmagadores que nos apresentou. Parece que as focas comem bacalhaus... Sabiam que cada foca consome, ao fim de um ano, centenas de quilos de bacalhau? Ah, pois é, uma só foca é responsável pelo morticínio anual de milhares de pequenos e grandes bacalhaus.
Um gajo nunca pensa nisto. As causas ecologistas parecem ser sempre muito simples - mas quem é que, em perfeito estado de saúde mental não se sensibilizaria com a nobre causa da B.B.? Claro que sim, vivam as focas, abaixo os criminosos! Mas depois de ouvirmos o J. percebemos que afinal as coisas são muito mais complicadas. A natureza é cruel e obriga-nos a optar: somos pelas focas ou pelo bacalhau?
A polémica instalou-se à mesa e o N. defendeu as focas e considerou um cirme ecológico o que lhes fazem. Que se lixe o bacalhau, há que proteger as coitadas das focas indefesas e fofinhas. Mas o J. assanhou-se na posição contrária e considerou que era por causa do ar inofensivo dessas predadoras que qualquer dia deixamos de ter bacalhau à mesa. É isso que queremos? As putas das focas, só à paulada, se queremos ter bacalhau. E a conversa ia-se desenrolando nestes termos, até que o G., naquele seu jeito meio aristotélico de encontrar a media res, decretou do alto dos seus 12o kilos de autoridade gastronómica:
- Pois eu sou a favor dos dois, da foca como do bacalhau. Um bom bocalhau com broa ou à zé do pipo, pois é verdade que cai sempre bem. Mas porque raio é que não começamos a experimentar umas postas de foca? Quem pesca o bacalhau, fazia mais umas horinhas e apanhava também umas focas. Ficávamos todos a ganhar: os comilões, os bacalhaus e as focas que assim como assim também devem estar preocupadas com o equilíbrio ecológico.
...E prontos, agora venham lá dizer que não se aprende nos nossos jantares... O Arcadas da Capela é mesmo um restaurante fora de série!
6 comentários:
Com uma foca daquelas (da foto), comia o bacalhau todo!!!
É boa! Quer dizer, nós comemos bacalhau vai para milhões de anos, desde que há focas e desde que há bacalhau. Há meia dúzia de anos, mais ou menos, os tugas começaram a vir aqui buscar o bacalhame e nós é que somos predadoras? Querem que a gente coma o quê? lasagna? O tal J. não está a ver tudo ao contrário? Podemos ser fofinhas, mas não somos parvas!
J. se estás a ler-me rebate-me este argumento do terceiro anónimo, pá. Tu não te desgraces...
O problemazito é que as focas tinham dois predadores naturais que iam dando conta da proliferação kiducha: o urso polar agora em extinção e os esquimós que as papavam por inteiro, além de que se vestiam com elas, faziam armas e ferramentas, além de kayaks e trenós.
era todo um modo de vida á custa da bicha. agora vão para a bicha da segurança social canadiana.
A malta do iglo foi proibida de estragar a fotografia e de mexer nas bichas.
por outro lado os canádios proibiram praticamente a pesca do bacalhau.
resultado: excesso de focas e importa reter que cada uma come cerca de 25 kgs de bacalhau dia. 25 kgs cada. e não engordam. aquilo são autênticas fábricas de merda à custa do nosso gadídeo.
e sobre a merda das focas e as malditas lombrigas, ah isso seria posta.
The Son Of J.
porra, sempre que leio o título leio sempre "fodas e bacalhaus". cum catano. que raio de coisa. isto quererá dizer algo?
ypsilon
Fait divers à parte, já comprei um facalhão japonês de 24 polegadas para o nosso anfitrião dessa noite memorável cozinhar bacalhau e mailo k lhe apeteça no Ameal.
Enviar um comentário