29/05/10

Dennis Hopper |1936-2010|, por Mangas



"Falei ao telefone com o David Lynch depois de ler o argumento de Blue Velvet e disse-lhe: David, tens de me dar o papel de Frank Booth, porque eu sou o Frank."

26/05/10

O Melhor Jogo da Minha Vida, por S. Tomé

No dia 27 de Fevereiro de 1977 fui, pela primeira vez na vida. ver um jogo de futebol. O meu pai levou-me a ver o Benfica que defrontou a Académica (na altura CAC) no estádio Municipal de Coimbra. Até aí eu gostava, principalmente, de jogar futebol mas só isso. Não sabia muito das equipas, mas depois desse jogo tornei-me um apreciador a sério da bola. Do Benfica sempre fui, mesmo muito antes desse jogo.

Nunca esqueci a entrada no Municipal... O meu pai foi obrigado a comprar os bilhetes na candonga e entrámos pelo portão do lado do Liceu D. Maria. De repente, ali estava eu, no meio de uma multidão fanática a gritar Hossanas ao Glorioso. Ouvia vozes a berrarem a constituição da equipa do Benfica e a gritarem Chalana como se fosse Cristo, Shéu, Zé Luís, Alhinho e Alberto como se fossem os apóstolos. Foi inesquecível, acho que foi a primeira e única vez que me senti religioso e o medo inicial da multidão deu lugar a um sentimento de beatitude.

Recordo-me de polícias montados nos seus cavalos enormes que me aterrorizavam. De vez em quando havia mesmo umas bastonadas neste e naquele adepto mais nervoso. Mas o tal sentimento de religiosidade foi mais forte que o terror e lá acabei por entrar, não sei como, suponho que levado pelos ares entre a força da multidão e o aconchego do meu pai.

É curioso que eu me lembre de tanta coisa desse dia, aquelas memórias ficaram-me para sempre. Nunca mais me esqueci, por exemplo, da equipa do Benfica que alinhou nesse jogo: Bento na baliza; Bastos Lopes, Carlos Alhinho, Eurico e Alberto;Shéu, Zé Luís e Vítor Martins; Nelinho (Moínhos na 2ª parte), Nené e Chalana. O Benfica começou muito mal esse campeonato. Mas depois, o seu treinador, o inglês John Mortimore, resolveu lançar na equipa três juniores de uma vez, Alberto, Zé Luís e o fabuloso Fernando Chalana, tinha 17 anos na altura. O Glorioso nunca mais perdeu e acabou campeão. Nesse jogo com a Académica venceu 1-0 com um golo do Nené.

Quanto à Académica alinhou assim (não me lembrava de todos mas felizmente existe o livro Académica - História do Futebol e está lá tudo): Hélder; brasfemes, carlos alhinho, zé freixo e martinho; mário campos (rogério), rachão (vala)e gregório; camegim, joaquim rocha e costa. A académica tinha uma grande equipa, a sua linha avançada, principalmente, era temível. O Joaquim Rocha era um ponta de lança muito rápido e explosivo; o Costa foi apenas o melhor jogador de sempre da equipa, um extremo poderoso que levava tudo à frente. E o camegim era um tecnicista nato, um jogador muito fino.

O Benfica ganhou esse jogo para minha felicidade mas não foi nada fácil. Mas a sua equipa era superior, tinha uma defesa inexpugnável, tecnicistas como Shéu e Chalana e jogadores velozes como o nelinho e o zé luís. E depois tinha o nené que não sujava os calções, mal tocava na bola e tinha cagufa, mas que não falhava um golo. Ainda me lembro do que ele marcou nesse dia, uma bola colocada com a parte lateral interior do pé direito, em habilidade, de fora da área quando toda a gente esperava um remate em força. Parecia simples!

Nesse tempo ainda não existiam as normas de segurança apertada de hoje. Não havia torniquetes, nem bilhetes com lugares marcados nem stewards. Havia alguns polícias apenas. O estádio Municipal devia levar umas quinze mil pessoas, mas nesse dia estavam lá dentro umas 30 000. Lembro-me que começámos a ver o jogo na bancada, mas estava tudo em pé, as pessoas amontoadas umas em cima das outras porque se vendiam mais bilhetes do que a lotação do estádio. Se fosse hoje era um escândalo.

Antes ainda de começar o jogo, deu-se a primeira invasão de campo, simplesmente, porque havia gente a mais para tão poucas bancadas. Mas não foi nada de grave. As pessoas foram-se sentando na relva em volta do campo e outras ficaram em pé nas pistas de atletismo. Achei o máximo - tinha a oportunidade de ver os dribles do Chalana e os correrias do Zé Luís mesmo ao pé de mim! Correu tudo bem e só me lembro de uma segunda invasão pacífica dos adeptos do Benfica quando o nené facturou e de outra no fim quando ganhámos o jogo.

Ficou-me para sempre uma vaga memória da plasticidade do jogo, das camisolas rubras do Glorioso, do negro da académica, do arfar da multidão, do delírio do golo e de uma defesa do bento a remate do Joaquim Rocha que desafiou as leis da gravidade. Houve alturas em que julguei que aquela gente não era humana, quando somos pequenos somos profundamente inocentes, afinal, vendo-os hoje, cinquenta quilos mais tarde e muitos cabelos brancos depois eles parecem-me todos tão humanos...

E também me lembro do percurso para o estádio no velho Fiat 128 do meu pai. Coimbra era então muito diferente do que é hoje e a Académica era o verdadeiro clube da cidade (hoje já está muito longe de o ser, perdeu-se a identidade). Os carros dos adeptos do Benfica circulavam em fila, lentamente, e eram insultados das janelas pelos academistas que eram a cidade inteira. Fiquei amedrontado com aquilo, mas percebo agora que o futebol é feito dessas paixões, não é grave enquanto não passar de certos limites. Mas na altura eu era um miúdo e não percebia isso. Assim, até a vitória do Benfica me soube melhor. Quando o jogo acabou e fizemos o percurso de volta, eu não cabia em mim de orgulho e felicidade e os insultos dos adeptos da académica, agora, pareciam-me música. Sentia-me imortal! No fim desse jogo eu tinha decidido: queria ser jogador de futebol durante toda a vida, sonho que, nunca saberei se feliz ou infelizmente, jamais cheguei a realizar.

Mas pelo menos fiquei a adorar futebol. De tal modo que o ano passado levei o meu filho pela primeira vez à Luz para ver jogar o Benfica, por coincidência, com a Académica. Acredito, pela expressão extasiada com que o vi a olhar para o Aimar, para o Reyes, para o David Luís e para o Cardozo, que ele também não vai esquecer esse dia. A história repete-se, afinal... Mas não exactamente como gostaríamos: no jogo em que eu fiz de meu pai e o meu filho fez de mim, o resultado também foi de 1-0. Mas desta vez, para meu desespero e do meu filho, a favor da Académica...

Grandes Vilões do Cinema - Frank Booth (Dennis Hopper) em Blue Velvet, por Mangas

Frank Booth, “O Animal”, de Blue Velvet (David Lynch, 1996). Antes de tudo o resto, Blue Velvet é filme muito, muito bem feito! Fico-me apenas por um singelo pormenor, porque não é sobre a obra em si este texto: David Lynch tem arte e engenho para mudar quatro vezes seguidas de trilha sonora nos primeiros quatro minutos e meio de filme! E resulta sempre bem.

Em cada dessas inflexões consegue uma harmonia perfeita entre os sons e as imagens que funcionam como unidades que se complementam, como sintonias de ambientes que o espectador contempla, cenários e melodias que descrevem a superfície visível e antecipam o mergulho nas trevas. Começa com os inquietantes violinos a lembrar os genéricos dos films-noirs dos anos quarenta, muda para a voz macia como algodão de Bobby Vinton no clássico que dá título ao filme e que serve para ilustrar as cenas do quotidiano pacífico numa pequena cidade do noroeste americano – o slow-motion do carro de bombeiros, as rosas vermelhas contra o céu azul, os miúdos na passadeira a caminho da escola, um velho a regar a relva, e, com o ataque cardíaco deste reformado, a câmara recua à dimensão de uma orelha decapitada, baixos e contrabaixos impõem-se de forma angustiante aos amplificados ruídos dos escaravelhos que a devoram, e tudo termina com uma grande cartaz da cidade madeireira e o jingle da rádio local, a voz de Lumberton. Notável!

Quanto a Frank Booth, bem, esse é um cabrão tortuoso, arrevesado e maligno do piorio que o cinema nos deu! O papel assenta como uma bota a Dennis Hopper, na altura ele próprio em derrapagem acentuada com o uísque e as drogas. Mas Frank, quando mete uns bourbons para dentro e inspira o óxido nítrico da máscara portátil, toca as fronteiras da insanidade, alucina como um cão raivoso, descarrega uma fantasia sexual mista de bondage&incesto sobre a pobre Isabella Rossellini a quem chama carinhosamente “mummy” com a cabeça encostada ao colo antes de lhe pontapear os queixos…! O filho e o marido “à Van Goh”, tem-nos como reféns.

E se tal não bastasse para completar o perfil desta besta tresloucada, como imagens de marca ficam-lhe as lágrimas convulsivas quando na penumbra do bar ouve a sublime Isabella cantar o Blue Velvet com aquela voz enfeitiçada e hipnótica; e o anuncio sonoro antes de mais uma incursão na noite underground que alimenta luz e a alma do filme: "I FUCK ANYTHING THAT MOVES!!" Está tudo dito. O cinema sem Frank Booth era como uma tourada sem ferros.

23/05/10

Ontem deu o Johnny Guitar na RTP 2! , por Dancing Kid

Ainda por cima antecedido por uma introdução de cerca de 10 minutos com o saudoso João Bénard da Costa que fez o favor de nos explicar porque é que este é um dos filmes da vida dele. Foi, portanto, uma grande noite televisiva.

Um canal público de televisão devia servir, precisamente, para isto, para divulgar a qualidade e não para andar a fazer uma concorrência patética aos canais privados e a servir de câmara de ressonância do regime. Ver o Johnny Guitar na 2, leva-me a suplicar mais uma vez: privatizem a RTP 1! Aquela porcaria tem uma única finalidade visível: fazer a propaganda do regime político vigente à nossa custa.

Mas ninguém precisa da fátima não me lembro do apelido do Prós e Prós. Nem precisamos de mais um canal de televisão a concorrer com os programas da treta dos privados com os seus concursos foleiros, as suas telenovelas entorpecentes e as suas overdoses de publicidade.

Nem precisamos de mais nenhum canal sobre futebol. Os que há, chegam e sobram. Nem precisamos de um sorvedouro de milhões de euros do erário público que é o que aquela porcaria consome todos os anos.

Precisamos, sim, de um canal que faça efectivo serviço público. De um canal limpinho de publicidade, de programas para atrasados mentais e de debates bolísticos. Precisamos de um Canal como o 2 mas melhorado. Que passe, não uma vez de dois anos em dois anos o Johnny Guitar, mas uma vez por mês. Precisamos de um canal que não passe só este, mas todos os filmes do Nicholas Ray e de todos os grandes cineastas proscritos trocados pelos gouchas e pelos tavares do regime e por telejornais editados directamente do Largo do Rato. Enfim, precisamos de um serviço público de televisão, foi o que eu pensei, ontem à noite, depois de ver o Johnny Guitar na RTP2!

22/05/10

Still Is Coimbra, por Dr. Formidável


Esta semana abriu, ou melhor, reabriu em Coimbra a velha sede da Académica - OAF no mesmo local de sempre, mesmo na esquina da rotunda do Papa, aos arcos do jardim botânico. A velha sede da OAF sempre foi um local de culto. Passei lá muitas noites nos antigos jardins da AAC com grandes conversas sobre tudo, até sobre futebol. Foi uma pena quando fechou. Hoje voltei lá, os tempos são outros e o espaço é outro.

A AAC concedeu a um privado a exploração deste espaço. Chama-se Still Is Coimbra, foi inaugurado com pompa e circunstância, foi destaque jornalístico na imprensa local, na Bola, na TVI e até meteu a presença do Pantera Negra - que por acaso é do Benfica e chama-se Eusébio. Fui lá esta noite e gostei. Não foi por causa da comida que, por acaso, até era sofrível.

No entanto aquele espaço é quase um Museu. Alguém teve a ideia brilhante de decorar as paredes do Still com as páginas ampliadas do livro Académica - História do Futebol, da autoria de João Santana e João Mesquita (entretanto já falecido, uma pessoa que deixa saudades). Gostei da sensação de andar a passear pelas páginas de um livro!

A edição deste livro foi um verdadeiro acontecimento. Trata-se de um documento impressionante, um manancial de informação rigorosa recolhido pelo espírito minucioso de João Santana, cuja elaboração implicou anos e anos de trabalho dedicado. Mas para além disso o livro conta ainda com a pena brilhante de João Mesquita que lhe confere humanidade e lhe acrescenta a pequena história exemplar, tão bem ilustrada na vida contada de tantas personagens academistas.

Não há nenhum clube em Portugal que tenha uma obra de referência com esta qualidade. E não sei se haverá mais alguma coisa parecida em mais algum clube fora de Portugal... Pois bem, quem não conhece o livro, tem agora uma oportunidade de o conhecer. Basta ir ao Still cujas paredes estão decoradas com as suas páginas, com todas as suas fotos- algumas magistrais! - e com os textos do João Mesquita.

Mesmo não sendo, propriamente, um academista convicto - gosto da AAC mas é o meu segundo clube - gostei do Still e acho que é um espaço original na cidade de Coimbra. Trata-se de um espaço vivo porque as paredes estão carregadas de energia... As paredes e as pessoas que percorrem, comovidas, a história da AAC dispersa ao longo de várias salas e não sei quantos pisos. Grande ideia esta de fazer do livro um restaurante, de fazer do livro a sede da AAC, de lhe dar nova forma e de o fazer viver de outra maneira.

Aquando da inauguração do Still, A Bola escrevia que a decoração e concepção do espaço tinha tido a colaboração do «grande historiador e investigador, João Santana». Está errado: João Santana não é historiador profissional nem de formação. No entanto, depois, desta visita de hoje ao Still eu fiquei com a ideia de que isto é uma outra forma de fazer história. Não a História erudita e tradicional. Mas para que é que serve a História senão para nos dar lições de vida e para, assim, nos fazer sentir mais vivos? Quando vejo tantas pessoas que se passeiam pelas muitas salas do Still, que comentam emocionadas as fotografias e os textos que decoram as paredes, eu penso que a História a sério, também é isto. Senão é isto, então o que é? Um pergaminho inútil? E, neste sentido, o erro da Bola acaba por se tornar verdadeiro: João Santana (e acrescento o nome do saudoso João Mesquita) é, sem dúvida, «um grande historiador e investigador».

20/05/10

Uma Menina De Peito Feito, por Stagliano

A menina era conhecida por duas características base. Os peitinhos em forma de pêra pronunciada e os gemidos sonoros e diferentes de tudo quanto se ouvira até então. Depois, ainda ficou mais conhecida. Meteu tudo dentro da prisão, desde a gerência da agência de modelos Jim South's World, bem como a gerência, staff, actores e actrizes da X-Citement Vídeo, Inc. Foi tudo dentro. Dezenas e dezenas de pessoas, arrastadas num processo que durou anos e anos com acusações federais de violação de menor. Os próprios Ron Jeremy e Tom Byron tiveram que assentar o cu no mocho e defenderem-se numa de Chuck Berry: "Well She Did Looks Old Enough For Me!"

É que a cachopinha mentiu. Fugiu de casa dos papás e mergulhou de peito feito no mundo porno com uma certidão de nascimento na mão que lhe garantia os vinte e dois aninhos. Depois de ter actuado em mais de 107 filmes porno, vem-se a descobrir que a certidão de nascimento era da irmã do namorado e que a cachopa quando começou a contracenar, apenas tinha 15 aninhos. Em 1986 a bomba estourou e só se safou a criancinha. Que em 1986, já tinha 18 anos. E diga-se que o estouro da bomba partiu da cruzada anti-porno do segundo mandato do Presidente Reagan, que em vez de marrar logo com o Muro, resolveu marrar antes com o Porno.

Falamos obviamente de Traci Lords, de seu nome Nora Louise Kuzma. A Indústria sofreu aqui o mais grave dos seus reveses, já que foi obrigada a retirar do mercado todos os filmes que envolviam a menina das peras. Até os milhares de exemplares da revista Penthouse onde se estreou tiveram que ser recolhidos. E os prejuízos acumulados revelaram-se brutais com os custos dos julgamentos.

No entanto, quando já se adivinhavam multas estratosféricas e várias prisões perpétuas consecutivas para metade da indústria porno (afinal, sempre eram dezenas de violações de uma menor), a coisa ruiu como um castelo de cartas e foi tudo arquivado. É que pelo meio dos julgamentos, veio-se a provar que a menina enganou a Indústria, não com uma certidão de nascimento, mas sim com um passaporte do Departamento de Estado Americano. Ora, se o próprio governo foi enganado ao emitir-lhe o passaporte, como é que se poderiam assacar culpas à Indústria? Se não há culpa, não há Crime. Reagan desistiu e foi marrar com o Muro e o Império do Mal. Fez Bem.

19/05/10

Enapália 2010, por Rennie

Vivemos num país que bateu todos os records históricos de desemprego. Mas continuamos a ser «representados« por cerca de 300 parasitas parlamentares (salvo algumas excepções) pagos principescamente e sujeitos de regalias obscenas.

Estamos à beira da falência. Mas mantemos 18 governos civis, autarquias e juntas de freguesia desnecessárias, ministérios desnecessários (já alguém reparou que temos um Ministro para os Assuntos Parlamentares?!), dezenas e dezenas de empresas públicas e comissões regionais, de turismo e afins, tudo isto, simples ninhadas de acolhimento de filhotes políticos.

O governo xuxa anuncia aumento de impostos, primeiro por seis meses, depois até 2011, agora até 2013, mas com a possibilidade de se manterem até «haver necessidade». No entanto o mesmo governo mantém os projectos de construções faraónicas que não podemos pagar, como o tgv até ao Poceirão (!!), o novo aeroporto, a terceira travessia do Tejo e mais umas quantas auto-estradas, tudo, como é fácil de prever, em alegre derrapagem, tudo concessionado aos mesmos eternos suspeitos do costume.

Temos uma escola pública completamente de rastos que precisa de reformas urgentes (que não as sucessivas e irresponsáveis aberrações levadas a cabo pelos governos xuxas). Mas em vez disso o governo diverte-se a dar magalhães aos putos para que estes se entretenham a jogar o Fifa 2010.

Temos uma lei muito moderna e avançada que institui os casamentos homossexuais. E,ao mesmo tempo, há um portugal serôdio e ultramontano que penaliza profissionalmente uma professora que se posou, quase nua, para as páginas da Playboy.

Todo este aparato, toda esta aberrante inadequação entre o fundo e a forma, entre a imagem e o substracto que são hoje a essência do Portugal xuxialista, não podiam ter encontrado melhor símbolo que o primeiro ministro: fato Armani por fora, mas meias rotas e cuecas sujas, por dentro.

Pic da capa do álbum Enapália 2000 dos imortais Ena Pá 2000.

17/05/10

O Museu de Erros de 2666, por Archimboldo

E pronto! Ou melhor, quase pronto, estou quase a acabar uma das maiores aventuras literárias da minha vida, a leitura do excelente 2666 do escritor chileno Roberto Bolaño. Foi uma grande aventura literária porque, para além da sua indiscutível qualidade literária, trata-se de um dos maiores senão do maior livro que alguma vez li: nada menos que 1030 páginas de literatura a sério!

O livro, editado postumamente, foi saudado como o acontecimento literário do século. O Washington Post considerou Bolaño um «imortal», o the Observer «o fora de série da literatura latino americana» e o Time referiu-se a 2666 como «uma obra prima». Não tenho jeito para tais qualificativos, mas acho que estamos, de facto, perante um livro excelente. Melhor, 2666 não é um, mas cinco livros diferentes que o autor pretendia editar separadamente. Foi a editora que resolveu publicar os cinco num só, uma vez que há aqui uma indiscutível unidade de conjunto.

Não gostei dos cinco livros por igual, mas adorei o primeiro, o terceiro e, particularmente o quinto. Acho notável a remissão que o último livro faz para o primeiro, esta noção que subsiste da íntima ligação entre todas as coisas e todas as vidas. Fica a sensação de que esta enorme narrativa poderia começar em qualquer ponto e que, mesmo assim, continua a existir uma unidade que liga todas aquelas histórias. Faz lembrar um jogo de matrioscas literário, cada história, cada personagem encaixando na vida de uma outra num ciclo que é ao mesmo tempo infinito e fechado.

Não vou alongar-me sobre 2666. Quero deixar aqui, apenas, uma colecção curiosa de alguns erros cometidos por eminentes e distintos escritores. Não se trata de asneiras retiradas de uma qualquer História dos Disparates Ditos Pelos Alunos de História de Portugal, ou algo parecido, mas, supostamente, de verdadeiras gaffes debitadas por grandes nomes da literatura.Um Museu de Erros curiosos que Bolaño se deu ao trabalho de compilar e comentar. Ficam alguns, retirados da página 967 do livro:

«Vamos embora!, disse Peter procurando o seu chapéu para enxugar as lágrimas», Lourdes, Zola.

«O Duque apareceu seguido do seu séquito que ia à frente», As Cartas do Meu Moinho, Alphonse Daudet.

«Com as mãos cruzadas atrás das costas Henrique passeava-se pelo jardim lendo o romance do seu amigo», O Dia Fatal, Rosny.

«Depois de lhe cortarem a cabeça, enterraram-no vivo», A Morte de Mongomer, H. Zvedan.

«Com um olho lia, com o outro escrevia», Nas Margens do Reno, Auback.

e, finalmente, a minha preferida:

«Começo a ver mal, disse a pobre cega», Beatriz, Balzac.

Mas serão mesmo gaffes a que, afinal, nem os grandes escritores escapam? Ou, pelo contrário, são apenas exemplos prodigiosos de linguagem metafórica e poética? Terão estas frases algum sentido plausível que nos escapa à primeira vista? A última e minha preferida, por exemplo, de Balzac, parece-me bastante interessante do ponto de vista literário e não creio que seja, simplesmente, uma gaffe cometida pelo escritor francês. E a vocês? O que é que vos parece?

13/05/10

Leituras para bem desligar o televisor, por Cão


“O silêncio é, no processo político, uma fonte documental tão importante como o discurso. Aquilo que se esconde está em luta com aquilo que se ostenta.”

Palavras sábias, estas que o professor Adriano Moreira publicou em 1977 no entrecho de O Novíssimo Príncipe (Editorial Intervenção, Braga/Lisboa). Tenho usado o lápis para cristalizar esta e outras citações da análise que o velho tribuno fez à quase-Revolução de Abril de 1974. Estoutra, por exemplo: “A Pátria não tem processo de inocência. Reflecte todos os actos dos seus filhos.” E esta ainda: “O arrependimento não mata o gosto do proveito.”
Tenho aproveitado esta e outras leituras recentes. Quero partilhá-las convosco, referindo-vo-las. A O Príncipe de Maquiavel, juntei Kaputt e Técnica do Golpe de Estado de Curzio Malaparte. Duas boas madrugadas me bastaram para levar a cabo a leitura de O Obelisco Preto de Erich Maria Remarque. E nos próximos dias vou dar A Volta ao Mundo com Ferreira de Castro.
E então? Então, ler é preciso para que o televisor siga saudavelmente desligado. Tenho caído de mais na asneira de o ligar logo de manhã. Aos gritos caça-táxis da Júlia Pinheiro e aos saracoteios papa-reformas do Goucha, sofro (d)a comissão par(a)lamentar de “inquérito” ao caso da frustrada compra da TVI. Vi o rapaz Penedos, anafadinho e ortoépio, a ser senhordoutorado pelas e a senhordoutorar as figuras que nos deputam. (E nisto do “deputar” vêm muito os tais “filhos da Pátria” do professor Adriano, não vêm? Vêm.) Vi outra vez o Vara (curiosa homonímia do substantivo colectivo da língua-também-pátria). Vi aquele que dizem sobrinho de não sei quem Soares. Vi até desistir de olhar – embora continue vendo perfeitamente, até sem cangalhas.
A solução? Ler: Moreira, Malaparte, Remarque, Castro. O problema é a minha mulher.
Chega a casa à tardinha. Vem estafada do trabalho. Sirvo-lhe um refresco na mesinha em frente ao sofá. Ela pega no comando da televisão. Liga. E pronto. Tudo se deteriora rapidamente. Pego num livro e fecho-me no quarto em silêncio, que agora vós podereis (re)citar como vera “fonte documental tão importante como o discurso.”

11/05/10

CAMPEÕES!, por Zé do Boné

Melhor equipa! Melhor ataque! Melhor defesa! Melhor meio campo!Melhor marcador! Melhor jogador! Melhor treinador! Melhor presidente! Melhor director desportivo! Melhores adeptos! Melhor estádio! Melhor águia! MELHORES!

05/05/10

«Acção Directa», por FP 24

Há dois tipos de espécimes na fauna chuchialista: a espécie grunha ou feroz e a espécie afável ou mansa. A espécie grunha do partido inclui, entre outras, personalidades como o próprio ingenheiro, o silva pereira, o santos silva, o lello, o vitalino canhas, a dupla pedreira & valter (uma associação ao melhor nível da dupla Bucha e estica, aqui numa versão parola), o vara e mais uns quantos.... Ultimamente, em nome do tal lifting que, segundo o ingenheiro dos projectos da covilhã, era necessário fazer no partido, surgiu uma nova fauna chucha: a espécime «mansa». Tal é o caso do patético assis que até nome de santo tem ou da actual ministra da educação ou dos bonacheirões da família soares e barroso..

Veio agora a lume mais um caso escabroso com um membro da primeira espécie, o deputado o açoreano ricardo rodrigues, figura com cargos oficiais na área socialista da ética e da justiça, o que é,reconheça-se, inteiramente revelador acerca do partido. O caso resume-se assim, cito:

«Confrontado com perguntas sobre as suas ligações a um antigo processo de burla nos Açores e a casos de pedofilia, o deputado levantou-se, enfiou os dois gravadores dos jornalistas nos bolsos das calças e saiu da sala , mas esqueceu-se que a entrevista estava a ser filmada, contou à Lusa um dos jornalistas, Fernando Esteves.»

Acho espantoso que o sr. deputado só venha falar nisto depois do Sábado publicar o filme na net. Se não houvesse youtube, o sr. deputado não faria comunicado nenhum, guardaria a indignação para os seus botões?

Acho fantástico o trabalho de efabulação linguística do sr. rodrigues: segundo o mesmo, as perguntas legítimas feitas pelos jornailstas que, no seu direito, querem saber quem é este alto responsável chucha para ética e a justiça, são qualificadas de «pressão intolerável»; usa o termo, cujo significado deve desconhecer por absoluto, «inquisitorial» a propósito das questões que lhe colocaram; fala em “violência psicológica insuportável».

E como é que se designa o acto que praticou de se apropriar indevidamente de gravadores que não lhe pertencem? Pergunta difícil. Eu não sei. Mas o sr. rodrigues sabe e refere-se a isso assim:“não vislumbrei outra alternativa para preservar o meu nome, exerci acção directa e, irrefletidamente, tomei posse de dois equipamentos de gravação digital”.

«Exerceu acção directa?» «Irreflectidamente tomou posse»? Estas expressões encerram, sem dúvida, uma nova fenomenologia. De agora em diante quando me chatearem com questões incómodas eu passo a exercer acção directa e prontos. Tomo, irreflectidamente, posse de coisas que não me pertencem e mai nada. E a expressão «acção directa» é impecável porque possui ainda uma ressonância justiceira esquerdista, faz lembrar aqueles grupos anarquistas e extremistas que advogavam a acção directa como forma de realização da ditadura do proletariado. Lindo, este homem sabe o que diz!

Este «irreflectidamente» é genial. Dá a impressão que o sr. ricardo pegou nos gravadores inconscientemente, sem dar por isso, e os meteu ao bolso. É verdade - e quem ver o vídeo pode confirmá-lo - que ele revela grande destreza e habilidade manual ao meter os gravadores dos jornalistas no bolso(na terminologia dele: exercício de acção directa). Será isso que quer dizer «irreflectidamente»? Como aqueles actos que nós fazemos diariamente sem darmos conta, pela força do hábito, como, por exemplo, poisar a chave de casa em cima do mesmo móvel, apanhar a escova de dentes de manhã sem sequer , sem olhar para ela, etc, etc? Pode ser...

Em suma: o sr. ricardo exagera. Dramatiza as perguntas que os jornalistas lhe fazem: pressão, inquisitoriais, violência, intolerável,só faltou que falasse em mais uma campanha negra... Já o acto de levar ao bolso gravadores que não lhe pertencem e não os devolver é menorizado e classificado como «acção directa» ou «tomada de posse irreflectida». O ps anda enganado ao dar a este senhor um cargo na área da ética - a sua área devia ser outra, como é bom de ver. Tivesse o ps um departamento de filosofia da linguagem e já tinha aqui o seu Wittgenstein...

04/05/10

Sei o que fizeste na Queima passada



" Pré-Scriptum" : Assim que acabei este post encontrei os cartazes. Nabice minha. Retire-se a crítica e mantenha-se o elogio. Melhor assim! Ah... e juro que tinha ideia de que as letras eram brancas...

Pela primeira vez nos últimos anos há um cartaz da Queima que me agrada. Um não, vários - vi dois, até ao momento. Não, não estou a falar do Cartaz Oficial nem daquele com o plano das Noites do Parque. Aqueles de que tenho gostado são os outros. São os que me permitem ir a conduzir e não ficar indiferente quando passo na rotunda do Fórum nem na da Quinta das Lágrimas. Simplesmente porque já sei que é lá que estão (ou estavam, porque pelo menos o do Fórum já não está) com o seu fundo negro e as frases bem escolhidas.

Mas não pensem que isto é só um elogio. Tem uma crítica pelo meio. É que com cartazes tão bons como estes, não se percebe como não consigo encontrar nenhuma foto na net nem sequer uma compilação das frases que fizeram para os cartazes. Nem no site, nem no facebook da Queima das Fitas... Já que fizeram um trabalho tão bom nesse aspecto não será falta de visão não o colocar à distância de um clique?

Lembrei-me disto porque gostava de saber se existem espalhados pela cidade mais do que esses dois cartazes de que falo, por isso vim à net procurar. Não encontro a informação em lado nenhum. Eu sei que isto até pode ser nabice minha - provavelmente é e, nesse caso, retire-se a parte da crítica presente neste post. Mas eu disponho-me já a fazer o papel de publicitário e vou tentar reproduzir (de memória, por isso peço desculpa se houver algum erro) as frases presentes nos dois cartazes de que falo, escritas em letras brancas sobre um fundo negro:

Sei o que fizeste na Queima passada.

Qualquer semelhança é pura coincidência.

E agora, depois de dar os parabéns aos autores, resta-me pedir a quem me lê que me diga se viu alguma frase, para além destas, pelas ruas desta cidade. E já agora deixo a questão:

Alguém (não) se lembra do que fez na Queima passada?