27/09/07

As Ditas Duras, por X-Méne

São situações como as da presente revolta popular pela democracia na antiga Birmânia que me fazem, mais uma vez, perguntar: O que fazer às ditaduras do mundo? É óbvio que é uma questão batida, crónica e tem dado muitas dores de cabeça à chamada “comunidade internacional”, mas torna a agudizar-se perante imagens como as da violenta repressão do regime militar da Myanmar.
De vez em quando, como desta vez, as populações oprimidas dão “um ar da sua graça” e tentam arremedos de revoluções, que regra geral falham. E é sobretudo nestas alturas que saem da toca os amantes da liberdade e os paladinos da democracia e os arautos da luta contra a tirania. Sobretudo o povo da esquerda, que é sobretudo muito amante das lutas anti-tirânicas. Sobretudo se a tirania não for de inspiração marxista ou não tiver um toque etno-socialista.
Bem, mas isto para dizer que estes arremedos de luta e indignação são apenas ocasionais. Por norma, as ditaduras passam bem nas suas excelentes vidinhas e, à excepção de uns quantos militantes profissionais dos direitos humanos ou da liberdade de expressão, de ONG’s a isso dedicadas, as “massas” ocidentais nem pensam muito no assunto. O que não significa, obviamente, que os povos oprimidos não continuem a ser oprimidos. São-no, mas sem dar nas vistas.
E isso leva-me, por exemplo, ao caso do Iraque de Saddam e ao que fazer, afinal, com esta gente simpática que brutaliza as suas gentes e desgoverna os seus países? Deixá-los cair de podre, como advogavam certos críticos da invasão iraquiana? Ou “ingerir”? Ou bloquear? Por norma, também, os bravos países ocidentais nem umas nem outras. Às vezes, nos casos mais evidentemente gritantes, como a teocracia iraniana ou a monarquia maoista norte-coreana, bloqueia-se, mas quando podem, ou quando não podem fazer mais nada, fazem negócio, como no caso da China, da Rússia, da generalidade dos fascismos islâmicos e das cleptocracias africanas. Assim como assim, há sempre a desculpa de que o mercado liberta. Mais cedo ou mais tarde. Eventualmente. Seja como for, mantém-se a patine diplomática da não-ingerência.
E quando se ingere, normalmente os cámones, que são quem mais tem a mania e o poder de ingerir, então, é um ái jasus nossa senhora! porque os porcos imperialistas a saldo do grande capital estão a ingerir outra vez e a meter o bedelho onde não foram chamados para ir chupar o petróleo aos indígenas e transformar os arrozais em campos de golfe, ái jasus!
Enfim, é um bico-de-obra com dois bicos. Mas a minha questão inicial mantém-se e lanço-a para debate: O que fazer com esta escumalha? É ético não-ingerir? É moral não interferir? A soberania nacional deve sobrepor-se à dignidade humana e à liberdade? Direitos humanos ou real politik? A força do direito ou o direito da força? Quid juris?

25/09/07

E o Tibete, Porra?, por Cicuta

O grande estadista, ingenheiro pinto de sousa, pronunciou-se hoje num forum internacional na qualidade de representante da União Europeia acerca da situação da Birmânia e da Palestina. Ousou, imagine-se dar moral...
Mas este indíviduo não se enxerga, porra? Não tem noção do rídiculo? Não tem vergonha na cara? Não fica vermelho quando vem falar nestes assuntos? É que, ainda agora, como notámos aqui no Porco, uns posts abaixo deste, ele recusou receber o Dalai Lama. A atitude foi ainda mais chocante quando a Angela Merkel, primeiro-ministro alemã, declarou que vai receber o líder tibetano, apesar dos protestos diplomáticos dos carniceiros chineses. Pinto de sousa, pelo contrário, amochou.
E é capaz de invocar, agora, a causa dos direitos humanos e de dar conselhos a palestinianos e israelitas? Pró Tibete já não?...Vaidoso como é, este homem patético, nem percebe que se transformou num Batatoon político. Seria cómico se não fosse tão triste...

Beija-me Mano!, por Socretino


Pelo Público de hoje, fica-se a saber que quando os jornalistas do mesmo jornal contactaram pela primeira vez o Pinto de Sousa, em 15 de Março de 2007, para que este comentasse a questão do Diploma, o rapaz desatou de imediato a fazer ligações telefónicas para o reitor Luís Arouca, e este para o professor Morais e vice-versa. E tudo isto foi escutado e gravado pela Judiciária. E transcrito para o processo de averiguação da procuradora Cândida Almeida, de onde constavam.

Constavam, porque já não constam. Foram mandadas destruir pela mesma procuradora antes de facultar o processo ao Público, já que aquele passou a ser consultável com o arquivamento. Para a procuradora não houve favorecimento. Houve regabofe, mas todos, Pinto de Sousa incluído, tiveram acesso a ele.

Agora, a senhora procuradora, alega que as gravações provam a “boa-fé” do Pinto de Sousa e manda destruir tudo. As anotações que ficaram no processo sobre as gravações e que o Público transcreve deixam algumas dúvidas no ar. Como numa onde se lê “Luís Arouca desaparece proc. engº” e relativa à gravação de uma conversa entre o prof Morais e o reitor Arouca.

Ora, pergunto eu, se as gravações eram tão inócuos e tão claras na boa-fé, para quê a sua destruição? Então, não há uma vontade cristalina de abertura e de provar a boa-fé do Pinto de Sousa? E se este estava de consciência tranquila e de boa-fé, qual a necessidade de desatar a telefonar aos responsáveis da Farinha Amparo, digo, da Independente? Falaram do tá-de-chuva” e do “abaixo-o-governo”?

24/09/07

Rega Por Expressão, Jeóvas E A Igreja Da Geografia, por Tinonio


Hoje, na parte de trás de uma caminheta:

“Executam-se jardins de todos os tipos, incluindo rega por expressão”.

No outro dia o grão contou-nos o caso que se passou entre ele e uma senhora Jeová, à porta do seu escritório. A pobre ter-se-á enganado na geografia e o grão, sendo grão, pregou-lhe de volta uma seca bestial.

Eu tenho outra táctica quando em casa me aparecem as senhoras jeovás. No outro dia, palavra de confrade, estabeleci mais ou menos a seguinte conversa pelo intercomunicador do prédio:

- Boa tarde. Eu e a minha companheira gostaríamos de lhe falar do reino de deus. Não demora muito, tem um tempito?
- Tenho sim, diga lá, se faz favor.
- O senhor conhece o reino de deus?
- Não, não. Por acaso não.
- Tem uma bíblia?
- Tenho sim.
- Então leia Mateus, 25
- Com licença, deixe-me apontar. Vou agora buscar um lápis e um papelito... pronto, pode repetir, por favor?
- Mateus, 25
- Mateus...25... certo. Apontei e vou mesmo agora ler. Muito obrigado. Mais alguma coisa?
- Não, muito obrigado pela atenção.
- Ora essa, obrigado eu. Muito boa tarde.

E assim se foram as minhas evengelizadoras convencidas que me deixaram na boa companhia do Mateus 25 e com a alma conquistada para a causa. Estou livre por uns tempos. Está claro que esta táctica só dá resultado se a conversa se estabelecer através de intercomunicador. Não dá com confrades rurais sem aparelhos de intercomunicação e que mal abrem a porta de casa estão logo na rua à mercê dos apóstolos e não podem fingir que vão buscar papelitos.

Já agora, não vale a pena irem a correr ler o Mateus 25, porque tanto pode ser este como outro qualquer.

Agora, o grão que esteja caladinho, que eu bem sei o que ele faz aos fins de semana....

- Bom dia, senhora. Eu e o meu companheiro andamos a espalhar a geografia e gostaríamos de conversar consigo.
- Ai, ai... Tem de ser rápido que tenho a cafeteira ao lume!
- A senhora conhece a geografia?
- Ó senhor, eu e o meu marido não ligamos muito a essas coisas; não leve a mal.
- Pois olhe, minha senhora, eu sou muito mais feliz desde que aderi à geografia. Dantes, bebia muito e fazia má vida em casa e depois um amigo puxou-me para a geografia e agora sou outro homem.
- Mas ó senhor, a gente é gente simples, a gente já está habituada à missinha do senhor padre carlos. Mas pronto, diga lá, antes que chegue o meu marido.
- Então hoje andamos a divulgar o reino do Tuvalu. Conhece?
- Não estou bem certa de conhecer, não.
- Não tem mal. Depois deixo o nosso almanaque para a senhora ler. Ora, o reino do Tuvalu tem 20 mil metros quadrados e um pib per capita de vinte dólares e produz sobretudo soja e água de coco. Não é assim irmão?
- Palavra do senhor.
- Ora, a capital do reino do Tuvalu é Porto dos Macacos e o seu ponto mais alto é o Pico dos Macacos com cinco mil metros de altura. Produz três barris de petróleo por ano. Há almanaques que dizem que são quatro barris, mas esta é que é a verdade. Não é assim, irmão?
- Palavra do senhor.
- E Tuvalu é atravessado por três rios onde se pesca o barbo e a boga e tornou-se independente em 1920, após um golpe de estado e é uma monarquia absolutista...
- Olhe, muito obrigado, mas já tenho o café a levantar fervura e daqui a nada está a deitar por fora. Olhe, deixe cá o livrinho, que depois leio.
- Aqui tem. Muito obrigado e desculpe a maçada; passamos cá para a semana para falarmos mais um pouco.
- Mas olhe que eu para a semana não estou! Ai a minha vida...
- Então fica a senhora convidada, mais o seu marido e filhinhos, para ir assistir às nossas sessões de geografia na Casa do Povo de Alcarraques, aos domingos de manhã. Começamos por cantar os hinos dos países, e depois recitamos textos escolhidos do almanaque. Esta semana o tema é “Topografia e Curvas de Nível”. E uma contribuiçãozinha, por pouco que seja, também é bem vinda. Então, muito boa tarde.


PS: Mail do Automotora, da era Pré-Porco, em 03 de Setembro de 2003

Malapatta! Vudu Au Dragon! por Zandinga


No passado Sábado, dia 22, realizaram-se as Vindimas do Sitio da Caveira, com duas ocorrências dignas de registo. O Nikki limpou nas rifas a botelha de Pera-Manca, e o Mister, aka, Sábio, o home que mais percebe de futebol nesta casa pronunciou-se e vaticinou que este ano quem ganhava o campeonato era o FCP.

Azar! Malapatta! E logo agora que a coisa estava a correr tão bem! Tamos arrumados, ó Jesualdo! Aposta na Taça ou nos campeões, que do campeonato já limpámos as manitas. Se o Mister diz que o Porto é campeão, é certo e sabido que a chicha vai passar ao lado. Fatal comó destino. Nem o enguiço das camisolas cor-de-rosa ou das bostas de erva alevantadas nos vai safar. Irra! Não havia necessidade! Por mim já pus o coração ao alto. Pode ser que a gente se safe na taça, mas é preciso que o Mister não diga nada…

22/09/07

Dobres – por Cão

No futuro, ou seja, hoje mesmo, as cidades de Portugal são aldeias. Em troca, as nossas aldeias são microcidades. Acho eu. Digo eu. Ontem (no futuro também, portanto), dei por mim numa pastelaria urbana de vila pequena a escrevinhar a prosa que se segue. Aviso já: é prosa melancólica, um tanto armada ao pingarelho literatóide. É o meu costume, enfim. O vosso beneplácito, aliás, só o tem agravado. Cá vai.
Das torres não mana já o bronze pulmonar dos sinos mas a cassete irrisória como a fé do pároco local. Prédios daninhos vegetam onde houve montes, blocos cúbicos vigiados de baixo por cubículos bancários e pastelarias com agência de apostas mútuas numa sorte que nunca há-de vir. Autocarros da modernidade carreiram de nenhures para lado algum, no bojo portando a antiguidade mal reformada dos nossos velhos, últimos que ouviram dos sinos o éreo dobre. Madonas de peitaça inchada como hematomas de leite cachorritam trelas mijonas entre lojas de trapos e pastelarias assombradas por cronistas pingarelhos. Andropausas em fato-de-treino luzem as carecas, como cus a prumo, pelos circuitos aeróbicos do parece-bem. Tasquinhas e feiras medievais, inevitáveis como o cancro, clonam-se umas às outras à pala dos orçamentos municipais geridos por imitadores de serviço. Milhares de suiniculturas geridas por porcos implicam a razão directa de um quilo de fiambre por um milhar de peixes fluviais mortos. A produção-ficção dos canais televisivos do alvará patriótico alzheimera tudo e todos, dos presídios da terceira idade às cristãs salas de chuto. O novo Código Penal é p’ra punir o bem e incentivar o mal, coisas que, aliás, nenhum Governo deixou de fazer nos últimos 864 anos. E, no futuro imediato, à porta das escolas fechadas criancinhas idem rezam para que as respectivas mães se não lembrem de ter irmãozinhos em partos de ambulância.
De modo que, por tudo isto e por todo o etc que não digo por contenção gráfica de coluna, cada vez sinto mais que, mesmo de cassete, quando os sinos dobram, é por nós que dobram.

Curb Your Enthusiasm (Calma Larry) Na RTP 2, por Newman

Larry David é o argumentista de Seinfeld, a série de TV mais genial alguma vez concebida pelo homo sapiens desde a idade das cavernas. Seinfeld durou anos e anos até que se finou. Mas o génio de Larry David, o cérebro dos enredos, manteve-se em actividade. Larry resolveu continuar a sua série sobre nada, mas agora sem Jerry nem Helen nem Costanza nem Kramer. Assim nasceu Curb Your Enthusiasm que é praticamente o Seinfeld sem o Seinfeld e os seus. Os episódios são sobre o dia a dia de Larry. É outra vez uma série «abut nothing» e é fantástica.

A RTP 2 começou por dar aquilo timidamente num horário impróprio para Octávios Malvados: todos os dias de semana a partir da 1.30. Passam dois episódios por noite. Felizmente agora baixaram o horário para as 0.30 e, com um bocado de sorte, ainda vamos conseguir ver o Easy Larry a horas de gente normal. Até lá eu aguento estoicamente pelas 0.25 na 2. Nos melhores dias ainda consigo ver um episódio. E vale sempre a pena.

20/09/07

A Queda, por Gabi Metenojo

Ontem caiu o Mito do Grande Treinador de Futebol. Abramovic correu com Mourinho embora a versão oficial fale em «rescisão amigável do contrato por acordo das partes envolvidas». O balanço da passagem do Especial pelo Chelsea só pode, pois, ser negativo. Não me venham com paleio do género, «o clube não ganhava um título há 50 anos» (não há sequer comparação possível entre o orçamento actual e os antigos, mesmo que em termos relativos) ou «Abramovic só pediu o título britânico» (versão estratégica cá para fora). A realidade é outra: Mourinho, nos últimos três anos, dispôs do maior orçamento do mundo. Comprou os jogadores que quis durante dois anos e o saldo foi dois pífios títulos de Inglaterra. Se julgava que o milionário russo ia continuar a enterrar dinheiro para continuar a ganhar títulos britânicos, pois, parece que se enganou. Abramovic queria, nada mais nada menos, que o título europeu. Foi para isso que foi buscar Mourinho ao Porto... E, volto a sublinhar, com o maior orçamento do mundo que conseguiuo especial? Nunca passou das meias finais. Muito pouco, pra tanto investimento... A sua passagem pelo Chelsea, em função das condições, praticamente ilimitadas de que dispôs, foi, pois, um fracasso. Não total, é certo (também era melhor), mas um fracasso, ainda assim. Já sei que estas afirmações vão fazer uma comichão do caraças aos nacionalismo ferrenho dos tiffosi porcinos, mas paciência...

As razões do fracasso de Mourinho são várias, mas em primeiro lugar destacado, está a sua política de contratações. O homem gastou 20 milhões de euros em Paulo Ferreira que nem na Académica tem lugar. Apostou em Ballack e cedeu à aquisição de Shevshenko. Entretanto, enquanto o Chelsea desbaratava os seus milhões, o Barcelona, por exemplo, comprava Deco que Mourinho não quis «porque o Joe Cole era melhor». Ia buscar Etoo perdido no modesto Maiorca e, sobretudo, andava a ver as camadas jovens argentinas onde descobriu Messi. Ainda agora, enquanto Mourinho comprava o consagrado Ashley Cole, o Barcelona apostava noutro miúdo, o mexicano, Giovanni dos Santos. Nos últimos anos o Barça foi campeão europeu e o Chelsea que investiu bem mais ficou a celebrar a Taça da Liga. Mourinho, dispondo de todo o dinheiro do mundo, investiu mal, em jogadores patéticos ou em primas donas consagradas.

Só para se ter uma ideia dos meios postos à disposição do homem, basta lembrar a recente tentativa do Real Madrid em adquirir Ballack ao Chelsea. Segundo o treinador merengue, Shuster, «foi impossível porque isso desiquilibraria totalmente a folha de vencimentos do Real» (sic). Raul, o futebolista com o salário mais chorudo do Madrid, limpa 6 milhões de euros ao ano; Ballack 8 milhões! E não é o mais caro do Chelsea, não ultrapssando Lampard (que o Barça não conseguiu comprar) nem Shevshenko, estando ao nível de Terry. E ainda há quem diga que o Especial é o melhor treinador do mundo? O tanas, com aqueles milhões todos até eu ganhava um taçazita da liga.

E já não falo na qualidade do futebol apresentado pelo Chelsea, uma coisa sinistra, onze matulões sem criatividade que não dão espectáculo. Até por aí, Mourinho tinha a vida facilitada. Pedia-se-lhe que ganhasse, não que desse show. Compare-se este nível de pressão com a pressão imensa do Real Madrid, por exemplo, onde não basta ganhar. Ainda agora, Capello foi despedido depois de ganhar o título espanhol. Motivo: a baixa qualidade do futebol praticado. E Del Bosque, aqui há uns anos atrás, foi demitido depois de se ter sagrado campeão europeu. Mourinho não tinha esta pressão acrescida: Abramovic e a aficcion pediam-lhe o título europeu, nem que fosse transformando jogadores de futebol em máquinas. Nunca ninguém lhe exigiu que apresentasse a qualidade futebolística de um arsenal ou de um Barça. E mesmo assim, ele falhou! Os exigentes adeptos do Real Madrid jamais aguentariam Mourinho e o seu futebol robótico um mês, quanto mais dois anos e tal, como fez Abramovic. Muita paciência ( e milhões) teve o russo...

Nos próximos tempos, o Especial há-de vir para a rua mais rico e mais vaidoso e os media portugas hão-de continuar a promover os livros dos «especialistas em mourinho», uma legião de discípulos cujo curricula é terem-se cruzado, nalgum momento da sua vida, com o treinador de Setúbal. E havemos de fazer os possíveis e os impossíveis para evitar esta simples e mortal pergunta: em face dos milhões de que dispunha, Mourinho foi um sucesso ou um fracasso no Chelsea? Quanto a mim foi um fracasso. Mas já sei que estas coisas custam a ouvir.

Pois é, Tó-Zé – por Cão



Já não bastava o Governo. Já não bastava o Scolari. Agora, até o Tó-Zé Brito está de volta. Só me apetece chorar.

Eu e os grunhos carecas da extrema-direita amamos muito a Pátria, claro. Mais Deus ali, menos Família acolá, amamos muito a Pátria. Olá se amamos. Mas caramba: Governo, Scolari e Tó-Zé Brito? É muita coisa junta a perdoar ao mesmo amor.

Dou por mim fumando as aritméticas da utopia. Género: Scolari com Tó-Zé Brito mas sem o senhor do fax. Ou: Tó-Zé Brito, Mike Sergeant, Teresa Miguel e Isabel Ferrão ressuscitando os Gemini de 1976, mas sem o Scolari e sem o senhor do fax. O Scolari obrigado a cantar o repertório de 1972 dos Green Windows acompanhado pelo senhor do Governo a tocar percussão na tampa do fax. O Tó-Zé Brito a cantar a lambada à brasileira, primeiro, e ao sérvio, depois.

Nisto, entra em tango o José Cid só de tanga. Atrás dele, à bateria, o Paulo de Carvalho. Ao lado, o Carlos Mendes a meter cunhas para o filho continuar a mostrar a placa na rêtêpê. Um bocadito mais ao lado, dá-se o inevitável: aparece o Tony Carreira a tocar cavaquinho ao ritmo diário das licenciaturas por fax e dos despedimentos por SMS. Mas não é tudo.

Irritado por ter nascido só uma vez, surge o José Mourinho com o seu inglês de mecânico de bicicletas a dizer mal do Scolari mas bem do Tó-Zé Brito. “Isso não se fax, isso não se fax”, diz o rapaz que era tradutor da União de Leiria. “Quando eu for seleccionador, o senhor Scolari nem nas Janelas Verdes tem entrada”, promete o rapaz que está para o senhor Abramovich como os arrumadores estão para o vereador do trânsito. Esta boca do José é muito apreciada pelo Tó-Zé, que sabe muito bem que Janelas Verdes são Green Windows em inglês, ah pois é, Tó-Zé.

Para não chorarmos em público, eu e os grunhos da extrema-direita costumamos ir à Shell (que agora é Repsol, a gente sabe, mas é que somos tradicionalistas) e cervejamos as mágoas cantando coisas dos Heróis do Mar com a mesma devoção com que os nossos compatriotas da selecção de rugby cantam o hino antes de amocharem na pá com cento e tais da Nova Zelândia, país que, exportador mundial de ovelhas e de carneiros, nos percebe melhor do que ninguém, à excepção do Scolari, do senhor do fax e do Mike Sergeant, que significa Tó-Zé Brito em inglês.

19/09/07

As Capitais, por Capitalista

Eu sempre me gabei de saber todas as capitais. Mas a coisa começa a ser difícil. É que elas saltam como rãs em charco de água choca. E uma pessoa por mais atenta que esteja, perde-se!

Já não basta o Casaquistão largar Alma-Ata, ou Alma-Atai para fazer a capital em Astana, agora é a maldita mudança da capital do leitão! A Mealhada pra mim sempre foi pacificamente a Capital do Leitão. Mas agora Águeda, intitula-se como a verdadeira Capital do reco de aleitamento. E com isto um capitalista começa a perder as referências e a certeza na resposta. O que não parecendo, é grave!

Miranda do Corvo puxando dos pergaminhos da antiguidade, passou a ser a Capital da Chanfana. E ainda me questionava eu sobre a necessidade de uma Capital da cabra velha assada em caçoilla de vinho tinto, quando Poiares, larga fogo e atira com a Confraria da mesma e proclama-se a Capital Universal da Chanfana. E reitera e insiste no Universal. E faz sucessivos Capítulos da Chanfana, seja lá o que isso for. Eu não sei se um Chinês ou um Guatemalteco, sabem o que é a Chanfana e por isso acho mais difícil que qualquer um dos dois venha a saber que a capital Universal da mesma seja em Poiares. Mas eu, registo. Se a Arábia Saudita pode ter três capitais, porque raio não há-de a Chanfana ter duas! Capitais, é pra decorar, carago.

Só que depois, Penacova delibera ser a Capital da Lampreia. Montemor-O-Velho também quer, mas a Torre do Tombo não lhe dá razão. Aguarda-se a resposta. Violenta, até porque Montemor ainda não digeriu bem a guerra perdida das Espigas de Montemor, agora unicamente fabricadas e vendidas em Tentúgal, a verdadeira e única capital das espigas de Montemor. E a batalha da Capital da Queijada de Pereira? E a arrufada, por onde andará a Capital da arrufada? Paciência, há que esperar a resolução, afinal o Nauru também não sabe lá muito bem se a capital é Nauru ou Yaren. A lampreia aguarda a mesma decisão.

Mas a coisa complica-se mais ainda. Agora, é Foz de Arouce, que berra ao vento que é a Capital do Sarrabulho, perdão a Única e Verdadeira Capital do Sarrabulho. Mas que diabo, há por aí alguém que queira roubar o título a Foz de Arouce, para que eles sintam necessidade de se proclamarem a Única E Verdadeira Capital do Sarrabulho? Quem é alma danada que quer roubar o Sarrabulho a Arouce? Será a Lousã ou a Ponte da Mucela? Será manobra do Automotora, essa eterna serpente venenosa? Vai haver guerra! Deixem o Sarrabulho em paz e na sua capital: Foz de Arouce Forever!

PS: Arganil avançou agora como capital do Bucho e Mira proclama-se capital do Grelo! Anotem e registem!

18/09/07

Pata Negra, Bellota, Ibéricos e Ali-O-Quimico, por Zé Critério

A pata negra é um mito. O que interessa é a bolota. Esse é o segredo do grande presunto. Por aqui, insiste-se na raça de porco preto, que dá o conhecido Pata Negra e vende-se a coisa um preço estúpido, por vezes superior a um bom Bellota, só porque vem do bicho preto. Idiotioce.

Certa vez a caminho do Romerijo de El Puerto de Santa Maria, e ao atravessar a Sierra de Aracena, junto aos Picos de Aroche, prestes a poisar noutro mito, a casa Sanchez Romero Carvajal em Jabugo, intentou-se na explicação. Ali, à vista das varas de Ibéricos soltos nos Alcornocales e ao cheiro dos pés descalços do Ali-O-Químico, procedeu-se à explicação da quinta-essência do Bellota.

Infelizmente, o Químico voltou com outro dos seus ataques do “não me fodam questes pézinhos, que não deitam cheiro” e a coisa perdeu-se no meio da berraria e chacina de tão nefandas e mal-cheirosas extremidades porcinas. Maldita tara de argumentar, metendo os presuntos nas bentas alheias! Não há bollota que resista!

Pois agora volta-se ao presunto. O porco ser preto é irrelevante. O que interessa é ser porco de raça Ibérica, ou no nosso caso, de raça Alentejana. E isto porquê? Porque é o único bicho que sabe e consegue descascar a bolota. Parece incrível, mas é verdade. O Ibérico e o seu primo Alentejano são os únicos porcinos que sabem retirar a casca – de digestão difícil – e comer apenas o interior da bolota.

O engraçado da questão, é que, como o Ibérico (preto ou não) é de crescimento e maturidade lenta, os peritos já por várias vezes tentaram o cruzamento com outras raças mais precoces. Contudo, o suíno daí resultante perde a habilidade de descascar a bolota e ao comê-la inteira, a carne torna-se mais amarga e menos gorda e perfumada. Donde nos resta concluir que logo no porco, o Ibérico é gourmet.

Estes bichinhos ao pastarem a bolota lentamente e ao longo de três ou quatro anos, dão origem a uma carne raiada de veios de gordura, brilhante, sápida e plena de cheiro. Alambazar tal coisa é ascender a algo próximo do divino. Um bom bellota de boa cura, derrete-se e desliza na boca, tornando a mastigação quase irrelevante. A boca enche-se de perfumes silvestres adocicados e a descida à terra apenas se opera se o tinto for mau.

17/09/07

Conversa Patriótica de Café, por Cão

Derivadó facto do Scolari andar a fazer da Selecçãogue maspéce de matraquilhos de praia com sotaque baiano, ameaçando inclusivé trocar à gente a Senhora de Fátima p’la de Caravajo ou lá como se chama a Fátima dos brasileiros, prontos, é assim, a gente estávamos um bocado pó indignos com isso e mais coisas, o caso Medi e assim, qué-se d’zer, cenas ca malta de cá não curte, indagora no Mundial de Ragby e no Euro de Básquéte a gente éramos só nós, prontos, aquilo do Obiquevelo também foi uma falsa partida que fizeram à gente mas o Évora lixou os gajos e a filha do Venceslau Fernandes tamãe.
Modos que, é assim, tá certo co Luxemburgue já não dá pa todos, mas os brasileiros tamãe querem mazé, prontos, calor da noite e assim, depois vai-se a ver os estádios do Euro-2004 e a gente não ganhámos à Grécia e eles não tinham brasileiro nenhum e chamaram à gente mas foi um Figo, o euro é que veio lixar isto tudo, sagente for a ver uma spébóque agora nunca é menos de centicórenta paus em lado nenhum e é um mimo, café bebemos em casa de cevada.
Telemóveis e a porra tamãe é tudo munto bonito e munto giro, fotografias e o caraças dá pa tirar tudo, mas ele é sempre a carregar no muntibanco, um gajo no trabalho é que tem de ligar pó encarregado da obra e zunga, carrega no muntibanco e é se queres.
As mulheres da gente agora tamãe nem sessenta contos tiram ó mês a fazer de caixa no com-tenente e é se queres a recibo sem segurança social pubaixo da mesa, ora pubaixo tá o cão na cena de cair um osso, só falta agora tá-se mêmo a ver é o Liedson e o Sócrates, não é este do fax, é o Sócrates quera capitão do Brasil no Mundial de 82 qué médico, esse é que podia vir em vez do Scolari, é assim, sempéra maizum, que salixe, pena é o Luxemburgue já não.

O Caso Dalai Gama, por Dalai Mama

O Dalai Lama voltou a Portugal para embaraçar, pela segunda vez, a pequenez dos nossos medíocres governantes. Todos estamos recordados de como ele foi excomungado pelo católico Guterres aqui há uns anos atrás. Agora voltou para fazer corar de vergonha o intrépido, o corajoso, o frontal, o arrojado, o homem de convicções (tudo encómios com que já o ouvi brindar-se a si próprio) primeiro-ministro, josé pinto de sousa. O mesmo político que enche a boca, constantemente, a proclamar a sua firmeza, o seu rigor, o novo homem do leme que não se desvia um milímetro da rota traçada e que afronta, corajosamente, os interesses estabelecidos (quais? O Belmiro? O Berardo? O Amorim? A TV Cabo? A PT? A CGD? A Banca? As cimenteiras? O Parlamento?), fez agora anunciar que, por dificuldades de agenda, não vai poder receber o líder espiritual Tibetano.

Tendo em conta a nossa própria história recente com Timor é lamentável. É vergonhoso. Pinto de Sousa não teve qualquer problema em deslocar-se à China com uma abundante comitiva. Apoiou, na ocasião, o estrambólico discurso do ministro pinho da economia que nos foi apresentar aos chineses como «o país da mão de obra barata». Mas agora não há agenda para o representante do povo tibetano, humilhado, espezinhado e chacinado pelo gigante chinês. Esta é a coragem de pinto de sousa que só engana quem quer ser enganado. Pinto de Sousa não recebe oficialmente o dalai, como é seu dever e obrigação, porque, pura e simplesmente tem cagufa da China. Simples e óbvio!

Entretanto, sua excelência, arranjou tempo para andar pelo país fora, ele mai-los 20-vinte-20 ministros a oferecerem computadores, aproveitando um generoso (para quem?) protocolo com a IBM. É o pensamento Valentim-Loureiro-dos-frigoríficos no seu último desenvolvimento. Prevejo um futuro radioso – qualquer dia ainda vamos ver o governo inteirinho e ao vivo a oferecer torradeiras ou micro-ondas num qualquer mercado próximo de si… É a propaganda em todo o esplendor da sua mediocridade. É a escala de valores deste governo sem valores.

Entretanto, arranjou-se maneira de receber o Dalai Lama no Parlamento. Sempre é melhor – pensaram os génios da propaganda governamental – que recebê-lo num hotel, como da última vez. Faz as honras da casa um homus-pê-esse, um exemplar da nova gente que, enfim, toca tudo, piano, bombo ou concertina, como é próprio da espécie, assim sopre o vento, o presidente da assembleia da república, jaime gama. E é por isso que este caso é muito mais o Caso Dalai Gama que o caso Dalai Lama.

15/09/07

Dancing Days, por John Tri-volta

Sempre tive para mim, enquanto fui jovem, que não há indicador mais fidedigno da nossa entrada na etapa etária de ex-jovem, na idade madura, na idade dos cótas ridículos e retrógados do nosso imaginário juvenil, do que começar a aprender a dançar.

Refiro-me a Dançar Dançar. Não a dançar dançar. Eu dançar dançar já dancei muito e com grande sentimento e empenho, sobretudo nas extintas States ou ETC., lendárias discotecas conimbricenses – como estou cerca de um grau geracional abaixo da restante vara de tapores, esses sim ex-jovens feitos e antigos, frequentava mais a States, já que a ETC. para nós jovens-jovens, era já coisa assim a modos que já a dar para a cótagem, aliás, era mais ou menos uma coutada dos fricólés “da pesada” (isto é, pesados), não obstante o bom som dos sixties e a róckalhada decente. Num lado ou noutro, porém: Saltava-se.

Mas isto foi há cerca de vinte anos, nos extintos anos oitenta. Do século passado! - Falar nostalgicamente de coisas que fizemos apaixonadamente “no século passado” é outro indicador evidente e irremediável de ex-juventude...

Entretanto muito mudou, como é bom de ser, e para o caso vertente da minha ocorrência, refiro-me mesmo a Dançar Dançar, e não aos saltos e encontrões violentos e desconexos a que chamávamos eufemisticamente dançar, ao som de Bauhaus, Cult, Talking Heads, Ramones ou Siouxsie and the Banshees. Muito mais próximo do que se poderá chamar uma dança decente e coordenada, eram por exemplo as danças das tribos mais convencionais, que procuravam outras pistas e outros ritmos; entre outros tugúrios da bétagem, na Scotch, ali na margem esquerda, mais a puxar para as Madonnas e os Michael Jacksons. Sons que apelavam a uma maior coordenação psico-motora e a um nível de sofisticação dançarina superior.

Quando passava temporadas veraneantes na aldeia, frequentava outros sítios de maior aprimoramento dançarino: os bailes. O Baile, aliás, dá matéria fascinante de poste… Aqui sim, havia o cuidado consciente e metódico de não desafinar o passo, ou pelo menos, de não calcar o parceiro(a). Aqui nem me atrevia a entrar na pista! Encostava-me ao balcão do bar ou a um canto e simplesmente aprendia. Aprendi muito mas não pus em prática.

De modo que a minha experiência nas pistas de dança se resumia basicamente a estes contextos. Até que… Até que, hoje, comecei a aprender (aprender a sério, observação e prática) a dançar danças de salão. Bom, não são propriamente danças de salão, o próprio casal de mestres bailarinos fazem uma certa demarcação: São Danças Latino-Americanas. Aulas de iniciação.

Desenrasquei-me, apesar do tosco historial e de todas as parceiras de dança que tive me criticarem (ou gozarem) os gestos emperrados e contidos, dizem que próprios dos europeus, povos regra geral com pouca expressividade corporal. Mas, não obstante ser um europeu perro, sempre me encantou a capacidade expressiva e criativa do corpo. A Dança! Do bailado clássico à kizomba, passando pelo trabalho de coreógrafos contemporâneos fabulosos como Pina Bausch ou por danças rituais como a dos derviches, passando por tipos como Gene Kelley, Fred Astaire, Ginger Rogers ou mesmo John Travolta. Pelos folclores riquíssimos das mais diversas latitudes! Passando em geral pela história, pelo mundo, há todo um universo fascinante de formas de dar vida ao corpo. De dar alma ao corpo.

Não é por acaso, aliás, que a Europa cristã, imersa durante séculos numa teologia social que abomina o corpo, o toque e o desejo carnal, seja tão pouco dada à dança... A dança, de resto, foi banida na generalidade da Europa católica como prática pagã durante a Idade Média. De resto, basta atentar na diferença, por exemplo, entre um Tango e os empertigados e frios Minuetos e Quartilhas dos bailes da nobreza e base da nossa tradição de dança de salão. Até o fado, a música tradicional urbana nacional por excelência, é música de ouvir sentado e estático!... A Valsa, por outro lado, já começou a abrir caminhos creio eu no sentido da paixão da dança. Além disso, apesar dos costumes vigiados pelo altíssimo, cresceram e multiplicaram-se pelo velho continente muitas tradições folclóricas populares bastante interessantes e belas.

Mas o facto é que os povos tropicais, sobretudo, desde sempre libertos de constrangimentos morais em relação ao corpo, têm uma expressividade corporal e uma abertura ao ritmo muito maior que a nossa: Aqueles corpos africanos ou sul-americanos são dança! E dançam, muito. A boa notícia, é que por estas bandas mais frias a moral já não é o que era e que há cada vez mais gente a tentar desenferrujar a musculatura e a aprender coisas como Salsa, Merengue, Son Cubano e outras exóticas artes do corpo. O corpo liberta-se. Até já há filas de senhoras em Lisboa a aprender a dançar no varão e tudo! As escolas de dança do ventre estão cheias, etc.. Sem falar nas missas dançarinas evangélicas, que também são um mundo fascinante.

Enfim, anda muita gente a dançar. Foi, então, neste contexto que tive hoje a minha primeira aula de danças Latino-Americanas. Devo dizer que gostei muito, pois, e que vou continuar. Foi uma experiência muito agradável. Gostei particularmente dos passos básicos da Salsa. Além disso soltei o esqueleto, dei uma alegria à cara-metade, fiz as pazes com a minha velhice e fiz exercício. É mau?

14/09/07

Há Dias Conheci Finalmente Um Gajo Que Come MegaMass, por Mike

No ginásio Basófias há uma enfiada de prateleiras cheias de MegaMass para vender. São boiões e bojões tamanho-família, alguns de 20 kg cada e meio metro de diâmetro, que se multiplicam em imagens de gajos musculados que fazem o Arnaldo Schwarzzenegro parecer um menino de coro. Tais bombas, prometem doses super-extra-turbo de creatina e outras merdunças terminadas em “ina” e em “oides”, que só de olhar enjoam e fazem dar um salto atrás.

Como todos, já conhecia aqueles bojões de mega-mass das horas de insónia, em que madrugada a dentro, se fica espojado no sofá a engolir os Mikes e os Melgas das televendas.

– Atão Melga, gostastes das três colheradas de Mega-Mass?
– Excelente Mike, já me sinto super-hiper musculado e com o brinde de quatro massajadores faciais ao preço super-hiper barato de 500€ o bojão, vou já comprar 300 unidades!
- É assim mesmo Melga, tu és a prova viva do bem que faz o Mega-Mass 3000 Turbo!

Pois, agora há pouco conheci uma pessoa, um atleta que come daquilo. E um dos verdadeiros, inchado de músculos e tudo e não um daqueles como eu, que de atleta só tem o pé. Ao vivo. Se não visse, não acreditava. O rapaz compra o Mega-Mass Super Turbo 3000 em bojões de 20 kg lá no ginásio, come, gosta e recomenda.

Os profs de ginástica que lá estavam na mesa, cascaram no rapaz e a discussão e argumentação que se seguiu seria de superior interesse se eu tivesse conseguido perceber alguma coisa dos beta-carotenos, radicais livres, creatinas e esteróides à volta dos quais os ginásticos se afadigaram. Por mim fiquei calado, afivelei um sorriso beato, e ali fiquei a apreciar extasiado uma manada de Mikes e Melgas, juntos e ao vivo, em cornada assassina. Que a creatina faz efeito, faz. - Boa, Melga. - Não me fodas, Mike!

13/09/07

O sentido e a morte, por Quem Sois

A morte é o tabu por excelência no ocidente. Instalou-se a noção de que falar da morte ou pensar a morte é algo de "mórbido", próprio de uma mente doentia e sem o sentido do pudor. Tal como outros povos e culturas contemporâneas, as sociedades antigas europeias, tenho para mim, tinham da morte uma mentalidade mais desdramatizada e despreconceituosa.
Pode parecer um paradoxo, mas a maior proximidade da natureza, dos ciclos vitais e da morte nesses tempos, aproximava também mais o homem da sua condição finita (ou transitória). Refiro-me aos tempos pré-seculares, quando se morria por todo o lado de velhice aos quarenta ou de guerra, acidentes e doenças em qualquer idade. Vírus hoje inofensivos, arrassavam comunidades inteiras num fósforo: Tempos de muito poucas esperanças de vida e muita presença de morte.
Também estávamos mais próximos da realidade da morte dado que o pensamento religioso era, de facto, vivido por todos com efectiva intensidade e consequência. As crenças religiosas tinham, na antiguidade ou na Idade Média, uma real preponderância no pensar e no comportamento, da mesma forma que tem preponderância o chamado "pensamento mágico" na vida concreta de um indigena animista.
Hoje, era de liberdade, prosperidade, ciência, laicismo, dúvida e sofisticadas técnicas e tecnologias de prolongamento da vida, já não é assim. E a morte, por estar mais distante, tornou-se uma espécie de "monstro" (mal)fechado no armário escuro onde encerramos os tabus e os traumas. Deixou, de certa forma, de ser uma coisa natural para ser algo de que nem se fala e se esconde, limitando-se aos silenciosos e constrangedores momentos fúnebres como funerais ou dias de finados - Esta dramatização envergonhada é ainda mais evidente nos países latinos, pela nossa cultura mais dada a saudades e emoções fortes.
É um assunto reservado, não obstante ser um dos temas centrais do pensamento filosófico e teológico... Obviamente, visto ser o tema existencial por excelência.
O facto de ter falecido recentemente alguém próximo e querido dos amigos que fazem este blog, suscitou algumas reflexões interessantes sobre o tema, que é um tema profundo e enriquecedor que não deve ser varrido para debaixo do tapete das ideias e das palavras. Para "aceitar" e pacificar é fundamental encarar de frente o medo e o sofrimento.
Vem isto a propósito de ter há bastante tempo no pc um texto magnífico do escritor brasileiro Rubem Alves, que me apeteceu nesta ocasião partilhar com os confrades do blog e com os leitores do tapor, antes que o tema desça para o oblívio das catacumbas milenares do porco. Com a devida vénia:

Sobre a Morte e o Morrer por Rubem Alves

«Já tive medo da morte. Hoje não tenho mais. O que sinto é uma enorme tristeza. Concordo com Mário Quintana: "Morrer, que me importa? (...) O diabo é deixar de viver." A vida é tão boa! Não quero ir embora...
Eram 6h. Minha filha me acordou. Ela tinha três anos. Fez-me então a pergunta que eu nunca imaginara: "Papai, quando você morrer, você vai sentir saudades?". Emudeci. Não sabia o que dizer. Ela entendeu e veio em meu socorro: "Não chore, que eu vou te abraçar..." Ela, menina de três anos, sabia que a morte é onde mora a saudade.
Cecília Meireles sentia algo parecido: "E eu fico a imaginar se depois de muito navegar a algum lugar enfim se chega... O que será, talvez, até mais triste. Nem barcas, nem gaivotas. Apenas sobre humanas companhias... Com que tristeza o horizonte avisto, aproximado e sem recurso. Que pena a vida ser só isto...”
D. Clara era uma velhinha de 95 anos, lá em Minas. Vivia uma religiosidade mansa, sem culpas ou medos. Na cama, cega, a filha lhe lia a Bíblia. De repente, ela fez um gesto, interrompendo a leitura. O que ela tinha a dizer era infinitamente mais importante. "Minha filha, sei que minha hora está chegando... Mas, que pena! A vida é tão boa...”
Mas tenho muito medo do morrer. O morrer pode vir acompanhado de dores, humilhações, aparelhos e tubos enfiados no meu corpo, contra a minha vontade, sem que eu nada possa fazer, porque já não sou mais dono de mim mesmo; solidão, ninguém tem coragem ou palavras para, de mãos dadas comigo, falar sobre a minha morte, medo de que a passagem seja demorada. Bom seria se, depois de anunciada, ela acontecesse de forma mansa e sem dores, longe dos hospitais, em meio às pessoas que se ama, em meio a visões de beleza.
Mas a medicina não entende. Um amigo contou-me dos últimos dias do seu pai, já bem velho. As dores eram terríveis. Era-lhe insuportável a visão do sofrimento do pai. Dirigiu-se, então, ao médico: "O senhor não poderia aumentar a dose dos analgésicos, para que meu pai não sofra?". O médico olhou-o com olhar severo e disse: "O senhor está sugerindo que eu pratique a eutanásia?".
Há dores que fazem sentido, como as dores do parto: uma vida nova está nascendo. Mas há dores que não fazem sentido nenhum. Seu velho pai morreu sofrendo uma dor inútil. Qual foi o ganho humano? Que eu saiba, apenas a consciência apaziguada do médico, que dormiu em paz por haver feito aquilo que o costume mandava; costume a que frequentemente se dá o nome de ética.
Um outro velhinho querido, 92 anos, cego, surdo, todos os esfíncteres sem controle, numa cama -de repente um acontecimento feliz! O coração parou. Ah, com certeza fora o seu anjo da guarda, que assim punha um fim à sua miséria! Mas o médico, movido pelos automatismos costumeiros, apressou-se a cumprir seu dever: debruçou-se sobre o velhinho e o fez respirar de novo. Sofreu inutilmente por mais dois dias antes de tocar de novo o acorde final.
Dir-me-ão que é dever dos médicos fazer todo o possível para que a vida continue. Eu também, da minha forma, luto pela vida. A literatura tem o poder de ressuscitar os mortos. Aprendi com Albert Schweitzer que a "reverência pela vida" é o supremo princípio ético do amor. Mas o que é vida? Mais precisamente, o que é a vida de um ser humano? O que e quem a define? O coração que continua a bater num corpo aparentemente morto? Ou serão os ziguezagues nos vídeos dos monitores, que indicam a presença de ondas cerebrais?
Confesso que, na minha experiência de ser humano, nunca me encontrei com a vida sob a forma de batidas de coração ou ondas cerebrais. A vida humana não se define biologicamente. Permanecemos humanos enquanto existe em nós a esperança da beleza e da alegria. Morta a possibilidade de sentir alegria ou gozar a beleza, o corpo se transforma numa casca de cigarra vazia.
Muitos dos chamados "recursos heróicos" para manter vivo um paciente são, do meu ponto de vista, uma violência ao princípio da "reverência pela vida". Porque, se os médicos dessem ouvidos ao pedido que a vida está fazendo, eles a ouviriam dizer: "Liberta-me".
Comovi-me com o drama do jovem francês Vincent Humbert, de 22 anos, há três anos cego, surdo, mudo, tetraplégico, vítima de um acidente automobilístico. Comunicava-se por meio do único dedo que podia movimentar. E foi assim que escreveu um livro em que dizia: "Morri em 24 de Setembro de 2000. Desde aquele dia, eu não vivo. Fazem-me viver. Para quem, para que, eu não sei...". Implorava que lhe dessem o direito de morrer. Como as autoridades, movidas pelo costume e pelas leis, se recusassem, sua mãe realizou seu desejo. A morte o libertou do sofrimento.
Dizem as escrituras sagradas: "Para tudo há o seu tempo. Há tempo para nascer e tempo para morrer". A morte e a vida não são contrárias. São irmãs. A "reverência pela vida" exige que sejamos sábios para permitir que a morte chegue quando a vida deseja ir. Cheguei a sugerir uma nova especialidade médica, simétrica à obstetrícia: a "morienterapia", o cuidado com os que estão morrendo. A missão da morienterapia seria cuidar da vida que se prepara para partir. Cuidar para que ela seja mansa, sem dores e cercada de amigos, longe de UTIs. Já encontrei a padroeira para essa nova especialidade: a "Pietà" de Michelangelo, com o Cristo morto nos seus braços. Nos braços daquela mãe o morrer deixa de causar medo.»

Texto publicado por Rubem Alves no jornal “Folha de São Paulo”, Caderno “Sinapse” do dia 12-10-03. fls 3.

SR SCOLARI A GENTE VIU, PÔRRA!, por Prognóstico

Toda a gente viu na televisão o Scolari afiambrar um murro no gigantone sérvio. Mais, toda gente viu o gigantone a levar a murraça e a procurar responder e o Scolari a refugiar-se cobardemente lá atrás. Foi feio. Muito feio. Voltou-se à cavalice do não saber perder com um mínimo de dignidade. Mas isso, paciência, é o calor da luta e a efervescência dos nervos.


Mas, pôrra, meia hora depois, a frio, lá veio o cavaleiro da triste figura, para a conferência de imprensa com a velha e gasta arrogância a dizer que não se passou nada, que não deu murro nenhum, que não tem nada de pedir desculpas, que estava a defender outro jogador, que foi um bate-boca, etc, etc. É demais. E o homem está mais. Haja alguém de bom senso que lhe explique aquilo que fez. E que aquilo não se faz. Porque ele, arrogante como sempre, é incapaz de ver. Olha, olha, mas não vê. Ala que se faz tarde.

12/09/07

Ginásio, Sauna, Castanhas & Alheiras, por GigaBite


Aqui há cerca de dois anos, a malta do Porco, malhava forte e feio no Ginásio Basófias cá do burgo. No final da malhação, seguia-se em regra uma sessão de Sauna. Para o efeito, o Basófias dispunha e dispõe de uma sauna finlandesa, vulgo, um cubo de madeira de 2 metros de lado e de altura, onde se arrumam três enxergas de madeira, tipo beliches, e onde se espojavam os três fanáticos da sauna: Alquimista, Mangas e Nini.


Ali, num suadoiro intenso e despudorado, as três alminhas debatiam sofregamente o sentido da vida e o destino do mundo, sob a égide da forte essência de eucalipto. Lá pelo meio da coisa, a malta começou a reparar que aquelas pedrinhas em brasa que faziam o suadoiro, eram um desperdício de todo o tamanho. E se bem se pensou, melhor se fez. Ou como diz o povinho, um diz mata e o outro diz esfola. E quem diz esfola, diz assam-se umas castanhas.


A modos que, na sessão seguinte de sauna, um veio munido de papel de alumínio para por em cima das pedras em brasa, outro veio munido de sal e outro trouxe meio quilinho de castanhas já retalhadas. Aí sim, passou a sauna a ser uma obra de gosto e sabedoria. Enquanto se batia no governo, ouvia-se o sal a crepitar e as castanhas a assar. E garanto-vos que nada sabe tão bem como umas castanhas assadinhas, depois do esgotamento do ginásio e a exsudação da sauna.


Infelizmente, o aroma intenso do castanhame assado sobrepôs-se à essência de eucalipto, e aquele tresandou para o corredor de acesso ao balneário das senhoras, imediatamente contíguo à sauna. E o maldito género segundo, extenuado e famélico, tratou de ir bufar à gerência o aroma a castanhas assadas que as incomodava. Logo depois entra-nos a gerência pela sauna a dentro a investigar e a vociferar. Obviamente que a malta pediu ao gerente para virar as castanhas. Fosse lá como fosse, o projecto seguinte que seria a assadura de uma alheira ficou adiado.


Agora voltou-se ao local do crime. Em face da concorrência a gerência já oferece free sauna à sexta-feira. A malta impôs como condição o fundamental e inegociável direito à alheira. A gerência aceitou. De modos que, Sexta-Feira lá estaremos na sauna e de volta de uma alheira de caça transmontana. Castanhas, só mais lá pró frio, ou talvez uma Copita de Barrancos, logo se vê. Isto sim, é um ginásio. Mangas, como é?

11/09/07

1000 Postas. Esta É A Milenária!, por Armários Imensos

Esta Posta é Milenária. Fora dois ou três repetidos, que se não contabilizaram, este poste comemorativo, é o número 1000 do Porco. Estamos todos de parabéns e no bom caminho do Quarto Aniversário que se regista no próximo dia 01/01/2008. Em jeito de Torre do Tombo aqui se repesca o Primeiro Post, qual primeiro berro da criança recém-nascida:


“01/01/04

Malta, o Blog tá disponível!”


Eis assim o nascimento do Porco, pela mão do criador Luzi. E como falta aqui habilidade para mandar foguetes pela net, aqui se deixa o registo dos maiores postadores, também em jeito de critica a vários malandros que bem podiam produzir mais.


Ao longo destes 1000 postes, o maior postador é o Vice com um total de 251 postes, segue-se o Grão com 229 e o Luzi com 212 postes. Depois surge o Mangas com 75 postes e o Cão com 53, logo seguido pelo Jótta com 48. O malandrão do Tino contabiliza 45 e o filho que nos abandonou e que se espera pródigo, Kzar de seu nome, soma 26 postas.


Segue-se esse grande prodígio de imaginação e variedade, que dá pelo nome de Nemo com 11 postas, e uma série de preguiçosos encartados: Xeko, 6 postas, Nini, 6 postas, Nikki, 5 e o Mau, outro supremo preguiçoso com 4 postas. O Beaujolais brindou-nos com 3 postas e o Mister com 2. Depois existe um rol de malta que se dignou escrever uma única vez. Esses são porcos dos quais a história não vai rezar.


Mas reza sim senhora das noveis aquisições do Porco, que em 2007 se traduziram em belíssima contribuições, embora logo se registasse uma baixa. A Jumpseat que fez 2 postes de rajada e um terceiro que se perdeu pelo caminho, não aguentou a critica nos groinks e levantou voo de novo. Mas em 2007 tivemos ainda a contribuição do Seven, da Minga, da Patty Labelle, da Medalhinha e da Truta Salmonada.


O Porco é bicho da pesada, que precisa de toda esta gente para conseguir continuar a voar. Mas como bicho pesado que é, também exige algum estômago aos postadores e visitantes. A patada reina por aqui e se alguma coisa caracteriza este bicho é isso mesmo. Não aqui há aqui a eterna louva-deus da procissão de gente que diz bem e elogia cada poste como obra de génio. Aqui não há génios, apenas porcos que querem discutir temas, histórias e assuntos e cultivam a patada forte como marca da casa. Vamos lá aos 100.000.

10/09/07

Não Será a Noite Cada Vez Mais Noite?, por Leviatã

Ainda ouço o padre a dizer «Amamos a Deus Todo Poderoso. Obrigado Senhor pela Vossa infinita bondade». Mas vem-me à cabeça o sofrimento indizível do amigo que partiu. Penso em todos aqueles meses horríveis que ele era o último dos últimos a merecer. Penso como foi tudo tão monstruoso quanto gratuito. Se temos que morrer, não tem que ser daquela maneira.

Talvez Deus exista mesmo. Talvez seja, como diz o padre, «supremamente bondoso». Mas será que Ele nos pode levar a mal se duvidarmos, quando temos tanta razão para tal?


pic de
FRIEDRICH, Caspar David

09/09/07

Requiem, por Leviatã

De cada uma das raras vezes que entro numa igreja, saio de lá com menos fé que quando entrei. Não seria correcto dizer menos fé em Deus, mas, pelo menos, menos fé em certos padres. Agora aconteceu outra vez.

Fui a uma missa em homenagem a uma pessoa a quem muito queria. Mas, às tantas, o padre resolveu dividir as pessoas que ali estavam em dois grupos:
- Só se está aqui por uma de duas razões, disse ele, ou porque se tem fé ou numa de social. Quem está porque tem fé, está bem. Mas os que estão cá numa de social, não estão cá a fazer nada.

Apeteceu-me logo sair dali. É que eu não tenho fé. Não sei o que hei-de fazer para ter fé, mas acontece que não tenho. Também não tenho a certeza contrária, isto é, a de que Deus não existe, mas vejo tantos motivos de razão para acreditar Nele como para o negar. E do ponto de vista do coração, não sinto fé, prontos, embora gostasse de sentir. Digamos que estou aberto, que sou um agnóstico com desejo de fé.

Mas voltando à missa, não tendo eu fé, mas não sendo mau em Lógica, entendi das palavras do padre que fiquei automaticamente catalogado como um membro do grupo dos «sociais». Ora não é assim, não há apenas duas razões para ali estarmos, como não conseguiu discernir aquele padre na sua miopia dicotómica. Eu fui àquela missa por outra, por uma terceira razão.

Fui porque se tratou de uma oportunidade de reencontrar um pouco da pessoa que perdi nos bocadinhos dela que estão espalhados pelos muitos que lá estávamos e que o amámos. Nós todos éramos, somos um pouco do que ele foi. Nós somos ele, um pouquinho só, mas somos. Foi essa razão desesperada que lá me levou - a de o rever na saudade dos olhos dos outros e na partilha comum. Infelizmente foi como se me tivessem posto na rua. Foi como se o padre tivesse dito: «isto é um clube privado. De acesso reservado e só para clientes habituais». Foi ele quem reduziu tudo a um cruel «aqui somos todos azuis e os amarelos não são bem vindos».

Como é que a Igreja quer ser um espaço comum se exclui assim aqueles que não são os seus? Eu devia sentir-me ali bem recebido e não escorraçado. Até porque a fé, acho eu, não cai do céu, num repente, zás. Não se nasce com fé, pelo menos alguns de nós não nascem. A fé constrói-se, é um processo que cresce lentamente (ou não). Como é que um padre não entende isto? Como é que desperdiça a hipótese de acolher aqueles que, ao menos naquele momento, sentiram que ela, a Igreja, podia ter feito alguma coisa, quanto mais não seja, dar a todos os presentes a possibilidade de recordarem aquele que amaram? Não entendo.

No passado – e até no presente – a Igreja foi missionária: saiu dos claustros da sua Hispânia, da sua Roma, do seu Vaticano e foi espalhar a palavra evangelizadora aos outros, aos africanos, aos índios, aos americanos, aos chineses, aos japoneses… Agora somos nós os índios, os africanos e os chineses - mas quando vamos à igreja sentimo-nos repelidos em vez de acolhidos.

Foto- Cartier-Bresson

07/09/07

Um País De Incompetentes!, por Salmanazar

Ontem andei de passeio por Viana do Castelo. Incompetência, claro. Vi-me lixado para entrar na porcaria da cidade, com várias ruas e estradas cortadas. Conseguir chegar à pastelaria Natário no centro da baixa e estacionar foi um martírio, com mais ruas e ruelas cortadas, policias em todo o lado e os parques de estacionamento impedidos por carros de televisões e de reportagens. Um inferno, congestionado e policiado, à conta de uma tal Reunião de Ministros de Negócios Estrangeiros da União Europeia.

Fintando gincanas, barreiras e polícias, zarpei rapidamente da cidade e rumei a Ponte de Lima. A meio do caminho, comecei a ouvir na rádio a tourada e tiroteio que se passou na mesma zona da baixa de Viana onde estive. Quatro ou cinco idiotas encapuçados de passa-montanhas e metralhadoras na mão resolveram executar um plano cuidado de assalto à Ourivesaria Freitas (a maior e um ícone em Viana) e ao Museu de Ourivesaria, contíguo e dos mesmos donos. Diziam os empregados, que os ladrões tinham aquilo bem estudado, uma vez que se dirigiram rapidamente às montras onde estavam as peças mais cotadas. Sabiam ao que iam.


Contudo, esqueceram-se ou da dita Reunião da UE. Na rua do assalto havia três polícias fardados e dois à paizana, de imediato alertados para o assalto pelos tiros para o ar com que os meliantes assustaram o povinho da loja e museu. A coisa não saiu bem. Tiroteio com força, dois patifes baleados e outros tantos policias a lutar pela vida contra o chumbo Um assaltante engaiolado e outro a monte mas já identificado. A joalharia ficou espalhada pelos passeios à espera do fim da metralha e do sangue a correr.


Ora digam lá se isto não é um país de incompetentes. Nem os gatunos se safam. São do mais incompetente que há no mundo. Mas será que nenhuma destas abstuntas se lembrou de ver uma simples agenda de um jornal e que verificar a agenda da cidade para o dia? Será que nos dias imediatos nenhuma dessas avantesmas estranhou a concentração de jornalistas, barreiras metálicas e fitas plásticas da policia? Não viram que à conta da dita reunião, aquela zona ia estar pejada de policias? Será que nenhum reparou que se tivessem assaltado uma ourivesaria em qualquer outra zona da cidade ou vila da zona não haveria lá nenhum policia pra chatear? País de incompetentes, que nem gatunos de jeito tem. E isto já não vai lá com escolaridade ou formação. É genético mesmo.

05/09/07

Sinistra da Educação, por Sinistro Total

Este ano ficaram sem colocação cerca de 49 000 professores, na sua maioria jovens recém-licenciados que, ou não conseguiram entrar na carreira ou entraram e perpetuaram a sua situação de precariedade até ao despedimento sumário que acabou de ocorrer.

Os números são impressionantes: é o maior despedimento colectivo de que há memória na história de Portugal. Se pensarmos que o Ministério da Educação Francês anunciou, recentemente, com todo o cuidado, que no próximo ano vai ser obrigado a despedir 12 000 profs, ficamos com uma ideia da violência dos números portugueses, repito, cerca de 49 000! A França tem cerca de 60 milhões de habitantes e nós não chegamos a 10 milhões. Eles despedem 12 000 no próximo ano, nós 49 000, imediatamente! Mas obviamente os franceses são uns míseros pigmeus ao lado dos ideólogos do nosso ministério, gente sagaz, do pensamento, gente culta e erudita como o valter lemos e um pedreira que aparece às vezes na TV.

Mas ok, vamos admitir a leitura primária da ministra da educação que acha que os portugueses não procriam, que não há crianças e, portanto, que não precisamos de profs. Ainda assim, nada justifica as declarações que escutei à senhora na TV. Segundo Maria de lurdes, cito de memória, mas com todo o rigor:
- Esse não é um problema dela nem do seu ministério (deve ser do ministério do ambiente ou da agricultura) . É do país (como dá jeito esta entidade abstracta, o país…) e dos próprios jovens que ela aconselha a dedicarem-se a outra coisa (à pesca? Ao fado? Não explicam, ninguém explica...).

A crueldade e o cinismo destas afirmações são inqualificáveis e, pela milésima vez, num país civilizado que não no nosso, justificariam a demissão imediata da senhora. Estes ditos são ofensivos e irresponsáveis. Chocam! Estas afirmações são uma falta de respeito por milhares e milhares de pessoas que chegam ao fim de anos de trabalho para ouvirem esta seráfica ministra a dizer-lhes, primeiro para adiarem o futuro que já não há lugar para eles; e depois para se dedicarem à pesca ou à apanha de caracóis… que o problema não é meu, ó larila...

Isto é de uma crueldade e de uma insensibilidade social grotescas. E ainda que tivesse toda a razão do mundo – que não tem, já que é o ministério da educação quem promove, certifica e operacionaliza os cursos a que se dedicam estas multidões de jovens incautos - nada justificaria palavras tão azedas. Mais que a gravidade do facto em si (lançar mais 49 000 pessoas no desemprego) o que choca é a profunda insensibilidade de uma pessoa que devia ter outro estofo e um mínimo de empatia para poder exercer um cargo tão importante. É uma questão de comunicação – ou de coração – e não é pequena. Como se fosse preciso, é só mais um episódio revelador da imensa teia de insensibilidade social que este governo se diverte a tecer.

Pic - Nicolaes Maes

Curral da Memória, por Automotora

Ainda a propósito de livros, aconteceu-me uma coisa curiosa no outro dia. Quanto tinha para aí 15 anos li um livro chamado Três Homens num Bote, do J.K. Jerome, um clássico da literatura humorística inglesa do Sec. XIX, sobre uma viagem de três gajos pelo Tamisa abaixo. Uma das recordações da minha adolescência é precisamente rir às gargalhadas quase até sufocar com a porra do livro. Passados muitos anos voltei a comprar o livro, que entretanto tinha perdido, voltei a lê-lo, e apanhei uma decepção: saiu-me um sorriso quase amarelado. Ou aquele humor se tornou ingénuo ou fui eu que me tornei cínico. Conclusão: é arriscado voltar à infância através dos livros. Ou de qualquer coisa com que fomos felizes, já agora. É como entrar na sala de aula da nossa primária e pensar como raio algum dia coubemos em carteiras tão pequeninas. Saímos dali com a memória atrofiada, não é? É por isso que acho que nunca mais vou ler Júlio Verne, ou o Salgari, e muito menos Os Cinco ou Os Sete.

Quando era miúdo, ouvi no rádio um conto da Sofia de Melo Breyner, chamado (acho eu) O Tesouro. O fundo sonoro, como vim a descobrir muito mais tarde, era um dos Gimnopédie, do Erik Satie, uma pequena jóia que para mim ficou sempre ligado àquele conto. Nunca tentei comprar o livro, e apesar de ter um disco com aquela música, raramente o ouço. Volto lá muito de vez em quando, para me comover, e sou obrigado a aturar, irritado, as vezes em que se servem dele como fundo de programas que nada têm a ver com o meu conto. Se se quebra a magia das nossas recordações de infância o que restará dela?

04/09/07

O Homem Que Deitava Livros Fora, por Alquimista


Deitada a filharada e entregue a mulher às delícias encantatórias da Floribella, Asdrúbal abriu o botão das calças e desapertou o cinto para deixar dilatar à vontade a almoçarada. Com medo da indigestão, Asdrúbal tirou a ideia duma sesta, e amandou a manita por cima do sofá para agarrar um romance que lhe tinham dado.

- Bem, vamos lá a ver que boa merda é esta, pra mo darem não é coisa boa, mas foda-se a cavalo dado não se olha o dente. Adiante. Asdrúbal lê e começa a franzir o sobrolho. Logo na primeira página saltam quatro personagens e duas frases cujo sentido lhe escapa por completo. Começa a ficar irritado. Na segunda página, saltam mais duas personagens e há um parágrafo inteiro de metáforas esguias que se lhe escapam como enguias. É demais. O pobre perde a conta à multidão e começa a resmungar pelos cantos da boca. A mulher manda-o calar que lhe está a estragar a Floribella.

Asdrúbal, dá mais uma chance ao livro e avança a custo e a cuspo prá terceira página. Um martírio, mais duas personagens novas, quando ele já esqueceu as seis primeiras e meia dúzia de frases armadas ao pingarelho, que o deixam enraivecido por as não ter percebido.

- Ora, foda-se, mas custa muito escrever um livro cuma história que se perceba? Era enrabar estes cabrões todos destes escritores de merda cum anti-depressivo pelo cu acima que os fodia a todos. Asdrúbal, espumava e vociferava. O livro enraivecia-o. Sentia a mãos a suar o romance a escorregar. Aquilo era um insulto ao seu ser mais profundo.

Olhou pró livro com ódio, como se de um cabrão personalizado se tratasse. A besta imunda queimava-lhe nas mãos e já não tinha coragem de a voltar a enfrentar. Largá-la e sair da arena era pior. Era dar parte de fraco. Era dar a vitória ao demo e uma derrota pessoal. Olhou pró livro como certa vez olhou pró sogro em hora desenganada. Um ódio profundo ao maço encadernado subiu-lhe pelas entranhas acima e rebentou-lhe num arroto sonoro que lhe azedou a boca e o cérebro. O cabrão do livro gozava e ria-se dele.

- Tu tás fodido, ganda cabrão, não te ficas a rir. Asdrúbal esperneava e saltava no sofá. A mulher olhou-o com medo e Asdrúbal decidiu que não era tarde nem era cedo. Era já e ali. Ele ou eu. A rir é que o cabrão se não fica. Asdrúbal, acelerado e raivoso, abotoou as calças e fez-se ao elevador. Desceu os oito andares da torre e correu até ao cimo da rua. Esbaforido, abriu a tampa do contentor do lixo e com raiva assassina, forçou o sacana do livro nas entranhas da estrumeira. Fechou tampa com quanta força tinha e respirou fundo. Só então se sentiu aliviado. - Toma, cabrão, agora ri-te meu filho da puta!

03/09/07

A Ilha dos Mortos de Arnold Böcklin, por Grunfo

Olhamos para o quadro e o que sobressai é o mistério. Como quando se olha para a morte. Nem um nem outro são fáceis de equacionar, nem são fáceis de digerir. Quando a morte nos toca, quando nos passa de raspão pelo adeus de uma pessoa querida, a ferida aberta obriga-nos a cair de rastos e a olhar para dentro, humilhados, impotentes e ofendidos. Tentando compreender e sem jamais conseguir perceber. Como raio é possível? Como raio se explica!


Bocklin sentiu o mistério e compôs a sua Ilha. Os peritos descrevem-no como uma visão mística e onirica da morte, recorrendo aos mitos clássicos e com ar de ilha mediterrânica. O pintor suíço, romântico e simbolista, mas também fantástico e precursor dos surrealistas, fez cinco versões da sua Ilha, a partir da evocação do Cemitério Inglês de Florença, onde vivia e onde estava enterrada a sua filha bebé, Maria.


Uma reprodução deste quadro ornamentava o gabinete de estudo de Sigmund Freud e marcava presença no quarto de dormir e leito de morte de Lenine. Strindberg inspirou-se no quadro para fazer a “Sonata dos Espectros” e Rachmaninov compôs o poema sinfónico “A Ilha dos Mortos” a partir da obra. O cabo austríaco apaixonou-se por um original e comprou-o num leilão em 1936, trazendo-a sempre consigo a partir daí. É o mesmo quadro que os Russos pilharam no bunker de morte da besta e levaram para Moscovo, de onde foi depois recomprada pelos alemães, que agora a expõem no Museu de Arte Moderna de Berlim. Existem outras versões expostas em Basileia, Nova Iorque (Metropolitan Museum) e em Leipzig.


A versão da foto deste poste, é a versão mais dramática, com as nuvens de tempestade por cima da Ilha e é a que se encontra no Museum Der Bildenden Künste, em Leipzig. Parece-me a mais conseguida das cinco versões. A Ilha, qual entidade fantástica abre-se em abraço soturno à barca de caronte que se aproxima. O título da primeira versão (A Ilha dos Mortos) não lhe foi atribuído pelo pintor, mas sim pelo seu mercador de arte, a quem Arnold Bocklin levou o quadro dizendo: “Aqui têm, como desejaram, um quadro para sonhar. Ele terá de parecer tão silencioso, que nos assustamos se alguém bater à porta.”


O quadro suscita-nos um grande número de perguntas. Quem está no barco dobrado ao peso da morte? Que lugar é aquele? De culto ou de sepultura? Quem morreu? Qual é a história por detrás da cena? Que Ilha é aquela? O Silêncio de que falava Böcklin é quase palpável. E terrífico. O quadro transmite uma inquietude e uma intranquilidade esmagadoras e deixa-nos todas as perguntas sem respostas. Como a morte. Que nada nos responde. Apenas nos esmaga sob um peso incomensurável.


Lembrei-me da Ilha agora que uma pessoa querida nos escapou entre os dedos impotentes. Era fã do Tapornumporco e companheiro de muitas memórias. Era um dos nossos. Um amante incondicional da boa prosa, da boa discussão, do bom vinho, da boa comida e da viagem. Costumava dizer que desde que lhe não batessem na cabeça, gostava de tudo. Adaptava-se e apreciava. Apreciava a vida como poucos e é uma crueldade que tão cedo tropece na morte Um conversador nato, que embevecia e encantava quem o ouvia. A sua morte, na flor da vida, leva-nos a questionar a mísera condição humana. E a não gostar do retrato, nem da maldita Ilha. Um de nós partiu e não voltará.