Na semana passada fui jantar a um restaurante fantástico e disse logo que tinha de fazer um post aqui pró Porco. O Porco já se transformou numa espécie de Forte Knox das experiências dos que nele escrevem e eu não podia deixar passar esta em claro. Fui jantar ao Arcadas da Capela, o fabuloso restaurante da Quinta das Lágrimas em Coimbra. Foi soberbo!
O Arcadas é o único restaurante a sul do Tejo que possui, actualmente, uma estrela Michelin. Não há mais nenhum de Lisboa para norte que a mereça, segundo os eminentes críticos da mais prestigiada instituição crítica de gastronomia do mundo. Para quem não faz a mais pequena ideia do que representa uma estrela Michelin ou pensa que a Michelin é, simplesmente, uma marca de pneus digo-vos só que, aqui há uns anos atrás, houve um chef de cuisine parisiense que se suicidou porque o seu restaurante perdeu uma estrelita! Matou-se, pum, pum! Este esclarecimento sobre o significado das estrelas Michelin é muito importante porque ainda há pouco li na imprensa portuguesa uma referência às suas famosas estrelas «miquelinas». Adiante.
Demorei uma semana para fazer este post por uma razão muito simples: é que não consegui decorar o nome das muitas iguarias que experimentei. Lembro-me dos sabores, guardei muitos deles num canto qualquer da minha memória. Como fui ao menu degustação, não veio lista e os pratos eram simplesmente anunciados pelos garções. Os nomes dos pratos, compreensivelmente, não há cabeça que os decore, aquilo é mais complicado que um livro de Martin Heidegger… Até que neste fim de semana tive a oportunidade de encontrar o responsável pelo Arcadas a quem pedi a lista do menu degustação que tive o privilégio de experimentar. Assim de memória ele deu-me a lista que eu escrevi num bilhete de comboio. Tenho aqui e, com algumas falhas (porque nem ele se lembra de tudo nem eu percebo bem a minha letra escrita no maldito bilhete), aqui vai a lista. Roam-se de inveja, carago!
Começámos com uma flute de Champagne Pommery ao que se seguiu um amuse bouche. O amuse bouche é a expressão francesa que designa a preparação das pupilas gustativas para o que se segue. Como o amuse bouche é muito variado, dependendo da criatividade de momento do chefe de cozinha, o meu informador não me soube dizer o que é que provámos ao certo à uma semana atrás. Lembro-me que na altura fiquei a olhar para aquilo porque não me havia talheres, mas a Joaninha que me acompanhou e sabe destas coisas explicou que a terrina em que a coisa estava servida era uma espécie de colher. Aquilo bebia-se. Foi o que fiz e era bem bom.
Veio a seguir um vinho que serviu como aperitivo, uma colheita tardia, Casal Figueira, devidamente adocicado mas sem excessos. A coisa prometia, o escanção era comunicativo e puxava por nós. Veio primeiro prato.
Primeiro prato - terrina de foie gras com pistachios e alperces e vinagreta de maracujá. Tudo acompanhado por um vinho branco de cujo nome nem eu nem o meu informador nos lembramos.
Segundo prato – Creme de cebola gratinada com tostas de queijo. Trata-se de um sabor muito forte e o vinho que se lhe seguiu foi uma verdadeira obra-prima: um Quinta dos Roques de uma secura extrema que combinou, por contraste, com o sabor personalizado do creme de cebola. Foi um dos momentos altos da noite e por aqui se vê como é de todo impossível que um jantar destes seja acompanhado só de água ou de arrghh!, coca cola e quejandos. Um miserável abstémio que aqui se fique pela sua fanta de laranja, pura e simplesmente, não pode perceber a combinação, a subtileza ou o contraste puro e duro de sabores. Eu acho que deviam proibir os abstémios de entrarem em sítios destes. Por mais dinheiro que tenham, não dá, é ridículo, é como ir ver um concerto do Caetano Veloso com um ouvido tapado, prontos. Os abstémios são os para-olímpicos da gastronomia!
Terceiro prato- não me lembro o que era, mas sei que era com tinta de chocos, vieiras e já não me lembro do resto… Aqui veio outro vinho excelente, um belíssimo branco. O escanção lançou-nos o desafio de o servir sem nos dizer o que era. Claro que ninguém foi capaz de o identificar, mas era excelente: um Luís Pato Vinha Formal. Entretanto aquilo que me parecia ser uma multidão de empregados de trato impecável, mas eram apenas dois ou três bons e atentos profissionais, mudava de copos de cada vez que era servido um novo vinho. E de pratos e de talheres também, claro.
Quarto prato – seguiu-se camarão, lavagante e pregado com molho de vinho moscatel, gengibre e pimenta nova. Um mimo!
A seguir veio um sorvete de limão com a função de preparar a transição para o prato de carne que foi:
Quinto prato – Lombo de porco preto, foie gras e molho de trufa preta. Tive, enfim, a oportunidade de provar a mítica trufa, essa espécie de cogumelo subterrâneo ou lá o que é que os franceses pagam como se fosse caviar e que, reza a lenda, encontram usando porcos para darem com elas pelo cheiro (actualmente parece que são cães devidamente treinados a fazerem de suínos). E perguntam vocês, que tal a trufa? Pois, aqui devo dizer que não fiquei com memória nenhuma da especialidade. Como a trufa é estupidamente cara só tivemos direito a uma lasca (literalmente). Entretanto foi servido o único tinto da noite, um Jota do enólogo Jorge Moreira de taninos apurados, as tradicionais notas de frutos vermelhos e uma intensidade memorável. Um vinho que só por si já fazia a noite e nos fez reflectir de novo acerca da deficiência que é ser-se abstémio e não se poder apreciar devidamente obras primas como estas.
6º prato- chegámos aos queijos o que, para mim, é sempre um momento altíssimo de qualquer refeição. A tábua dos respectivos era simplesmente divinal. Foram trazidos por uma menina muito apresentável que os anunciou como quem anuncia a entrada de diplomatas. Dos mais fracos para os mais fortes, estava lá do melhor: Niza, serra da estrela, da ilha de s. Jorge (mas não tinha nada a ver com os que eu compro no Belmiro), de Castelo Branco, os camembert, bries, roqueforts (Societé e tudo!), Gorgonzola e Shilton, entre outros. Os meus companheiros de luta escolheram três ou quatro e eu fui a quase todos e só não fui a todos porque a jornada já tinha puxado muito por mim. Moderação? Não. Tudo em excesso, a moderação é prós monges!
7º prato – Sobremesas: leite creme queimado e aromatizado mais gelado de café e telha de sementes de sésamo e papoila para os cavalheiros (quem nós?) e soufflé de chocolate com pêssego gratinado e gelado de amêndoa amarga para as senhoras. E no fim ainda vieram uns brigadeiros sensacionais. Confesso que não sou grande adepto de sobremesas mas gostei mais do soufflé de chocolate das ladies. A acompanhar um Porto Vintage de 98, mas já não me lembro de onde. E no fim de tudo isto, rejeitámos os digestivos e optámos por um excelente chá verde com aroma de menta de cuja marca não me recordo, mas que era bom, era.
O jantar começou a ser servido por volta das 20 30. Era 23 40 quando nos levantámos da mesa. Estivemos num ambiente de excepção e fomos tratados principescamente por profissionais irrepreensíveis. Não registei uma única falha no serviço, nem uma única. Acho que nem o nosso Grão conseguiria embirrar com aquela malta. No fim pensei que naquela noite não teve lugar um simples jantar: foi como ir ver um concerto, um bailado, uma exposição. Foi mais uma experiência estética dirigida ao palato, criada e organizada por verdadeiros artistas. Fiquei a pensar que os artistas deviam ter vindo ao palco fazer as vénias do costume no fim das suas actuações. Se o tivessem feito, garanto-vos que me levantava do meu cantinho perfeito e aplaudia-os como aplaudiria o Ryuchi Sakamoto, o Lou Reed ou os Samshing Pumpkins. E quando me lembro que já paguei mais de 100 euros para ver os Stones em Alvalade, fico a pensar que o «concerto gastronómico» do Arcadas da Capela até foi barato…
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