Ramon soltava zunidos e inventava esgares ao som do baixo de Take a Walk on the Wild Side. Emborcava uma garrafa de aguardente comprada nos chineses para esquecer a solidão calcinada por dentro. Durou aquilo algum tempo até ter decidido ir sentar-se na esplanada, estoiravam foguetes sobre o rio, a superfície das águas sangrava vermelho, branco e depois verde. Pais com os filhos às cavalitas, sogras em cadeirinhas de encosto desdobráveis, putas abraçadas a militares, cisnes que deviam achar aquilo tudo muito estranho, de pescoço empoleirado para o cheiro a pólvora queimada e farturas. Ramon pensou na amante no instante em que saiu de casa com um pontapé a meia altura na maçaneta da porta. Palpitou-lhe que se regressasse, ela ainda lá estava. Sem mexer um dedo. As garras hesitantes na asa partida de um falcão. Se a encontrasse morta, nunca se saberia ao certo o que tinha dado cabo dela, se as garras, se o falcão. Saiu dali para fora. Caminhou ao longo do rio até perder de vista o Lou Reed.
Encontrou uma acácia e enroscou-se nela. Falou-lhe para o tronco. Longos monólogos, tagarelava para dentro, frases deixadas a meio. Redemoinho no rio. Campos de milho no lusco-fusco. Cheirava a erva húmida e bosta de cavalo. Sons de folhas ao vento como castanholas abafadas. Sentou-se na margem do rio e ateou uma fogueira. O negro anilado da noite, esparso, cortado aqui e ali pelo frio silencioso e inegociável. Deu um pontapé nas brasas, acendeu o cigarro com uma delas e lembrou-se de ir mijar contra o tronco da acácia. Circundou-a com o jacto de urina como se lhe estivesse a humedecer as raízes. Ela não esboçou nenhum protesto. Tirou a navalha do bolso das calças e gravou-lhe na casca um R. Prometeu-lhe que viria por ela um dia. Até lá, que se mantivesse por ali, que não se afastasse para muito longe porque vir rega-la seria sempre mais perto.
Ramon descalçou-se, caminhou até ao fogo, sentiu a caruma picar-lhe os pés. Daquele lugar, pouco ou nada conseguia ver para além do rio, mas era uma grande vista. Depois, deitou-se e adormeceu com a aurora, a pensar que não havia maneira de ser noite outra vez.
Encontrou uma acácia e enroscou-se nela. Falou-lhe para o tronco. Longos monólogos, tagarelava para dentro, frases deixadas a meio. Redemoinho no rio. Campos de milho no lusco-fusco. Cheirava a erva húmida e bosta de cavalo. Sons de folhas ao vento como castanholas abafadas. Sentou-se na margem do rio e ateou uma fogueira. O negro anilado da noite, esparso, cortado aqui e ali pelo frio silencioso e inegociável. Deu um pontapé nas brasas, acendeu o cigarro com uma delas e lembrou-se de ir mijar contra o tronco da acácia. Circundou-a com o jacto de urina como se lhe estivesse a humedecer as raízes. Ela não esboçou nenhum protesto. Tirou a navalha do bolso das calças e gravou-lhe na casca um R. Prometeu-lhe que viria por ela um dia. Até lá, que se mantivesse por ali, que não se afastasse para muito longe porque vir rega-la seria sempre mais perto.
Ramon descalçou-se, caminhou até ao fogo, sentiu a caruma picar-lhe os pés. Daquele lugar, pouco ou nada conseguia ver para além do rio, mas era uma grande vista. Depois, deitou-se e adormeceu com a aurora, a pensar que não havia maneira de ser noite outra vez.
Foto: Wood Nymph, de Maggie-Me
4 comentários:
aqui já temos um misto de telúrico com poeta maldito. gostei mais. já não há estridências como o sabre e o voluptuoso.
ass: gajo das marés vivas sem pamela
sim, é um texto ligeriamente menos guei, menos torguiano. tá bem escrito, sincenhor.
nota-se co gajo tem pano pa mangas.
PERGUNTA:
Vocemecês sabem porque é que já não existe o CONTRA INFORMAÇÃO?
RESPOSTA:
Perguntem ao Pinto de Sousa.
ASS:
a dúvida metódica
olhem la.. mas o ke é ixto de andar a marcar as arvorezinhas...?!...entao ja nao bastava andar a "humedecer-lhe as raizes" senão ainda mais a "marca-la a canivete"?!... oh meus senhores...!!!
... ahh, mas já agr, e não concedendo,... pic mt apropriada ;)
ass: A gaja das árvores
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