02/02/09

Guerras e Campanhas Militares da História de Portugal, por Viriato dos Santos

Apesar de ser um leigo na matéria, a História sempre me interessou. Infelizmente o sistema educativo e mediático português tem desconsiderado e muito esta importante disciplina, ao ponto do português culto comum ( se é que isso existe) ser, hoje, pouco mais que um ignorante na matéria, mesmo quando falamos em História de Portugal. É uma evidência. A generalidade do português comum não faz a mais pequena ideia de quem foi o Infante Santo, D. António Prior do Crato, D. João II ou os Távoras e acha que as casas de Avis ou de Bragança são palacetes algures ali para o Norte. Os responsáveis por este estado de coisas não são os nossos concidadãos, é claro, que são mais vítimas que outra coisa. Os responsáveis são sim a chusma de governos e políticos ignorantes que se têm sucedido e que têm promovido a desvalorização da formação humana em nome de uma noção neo- positivista e imbecil que identifica a cultura com a tecnocracia (vide os actuais episódios do famigerado Magalhães). Pode ser que um dia seja a própria História a julgar estes ininputáveis que nos governam...

Neste contexto de verdadeira pobreza franciscana é assinalável o esforço de algumas entidades privadas que teimam em remar contra a maré. É o caso da Academia Portuguesa de História que se vem distinguindo pela edição de um conjunto de obras que merecem aplauso. É o caso da excelente colecção dedicada à História de Portugal intitulada Guerras e Campanhas Militares. Os autores são especialistas portugueses que estudaram algumas das campanhas mais importantes da nossa história. Li dois livros desta excelente colecção (e tenho mais alguns em lista de espera) que aconselho vivamente: Aljubarrota de Luís Miguel Duarte e aquele que julgo ser mais recente título da colecção, A Perda da Independência - de Alcácer Quibir aos Açores, 2008, da autoria de Carlos Margaça Veiga.

Esta colecção, parece-me, pretende superar alguns dos problemas que o leigo, como eu, interessado em História, encontra em alguma da bibliografia que se publica entre nós, nomeadamente o seu academismo excessivo, a sua tecnicidade e o preço elevado. Ao contrário de uma certa tradição editorial, os autores desta colecção escrevem para o público e não se limitando a publicar as suas teses de doutoramento. Pelo contrário nota-se nestas edições um esforço notável de traduçlão de conteúdos mais técnicos para uma linguagem mais acessível ao leitor comum. Há a consciência clara de que receptores diferentes exigem linguagens diferentes. Trata-se ainda de edições simples, graficamente cuidadas que incluem imagens de boa qualidade e num formato quase de bolso. Muito diferente dos calahamaços enciclopédicos com mil e um anexos de grande interesse académico mas pouco ou nenhum interesse para o leitor médio. Além disso, last but not least, o preço destes livros é extremamente acessível: 4.90 euros na Fnac!

Nos países anglófonos há muito que este trabalho de edição histórica acessível se efectuou, existindo, hoje, um vasto público consumidor deste «género literário». Em Portugal está tudo por fazer e o esforço da Academia Portuguesa de História é um passo importante que merece ser assinalado. No país das licenciaturas tiradas aos domingos de agosto, se estivermos à espera das medidas do governo dos magalhães bem podemos esperar sentados... Mais facilmente alteram a Zona de Protecção Ambiental de um qualquer estuário perto de si.

13 comentários:

Anónimo disse...

Não li os livros que aconselha, mas vou procurá-los. A história militar é hoje oficialmente desprezada mas forçosamente interessa o historiador, que sabe que a história se fez com duas coisas básicas, comércio e guerras. Quando escrevi o meu “Vida do Marquês de Sande”, vi-me na necessidade de estudar acções militares e, ainda hoje me lembro com que interesse procurei reconstituir a batalha de Montijo (1643) à base dos documentos coevos. Que não faltavam, e que tão pouco aproveitados foram. Não sei se os livros agora publicados pela Academia focam o aspecto fundamental da organização – forma de abastecimento, por exemplo - da acção militar. Tenho uma “fonte” reservada para um dia escrever sobre isso. Não gosto de recomendar livros, mas de vez em quando caio nesse defeito.
Sobre Alcácer Quibir recomendo, como obra exemplar:
E. W. Bovill THE BATTLE OF ALCAZAR
an account of the defeat os Don Sebastian of Portugal at El-Ksar el-Kibir London, The Batchwrth Press

Anónimo disse...

Na opus magnum de Norman Mailer, OS NUS E OS MORTOS, é extraordinária a narração da preparação da batalha.
Literatura e História não têm de antagoniazar-se. Pelo contrário.

Anónimo disse...

antagonIzar-se.

Anónimo disse...

Theresa: aconselhe os livros que quiser à vontade, por mim, só lhe agradeço.
Os livros que indico no post também abordam os aspectos que refere relativos à organização das batalhas em causa. Mas se o livro de Luís Miguel Duarte sobre Aljubarrota se concentra na descrição mais ou menos pormenorizada da batalha, já o de Carlos Margaça Veiga é muito (a meu ver demasiado) sucinto no que toca à batalha em si.Em contrapartida os aspectos organizativos da batalha de Alcácer Quibir merecem do autor, comparativamente com o outro, um estudo mais aprofundado - aspectos como o recrutamento de mercenários, a negociação com Filipe II e com o rei marroquino deposto que foi apoiado pelos portugueses, os comandantes designados, a logística, o recrutamento interno,o financiamento, etc, tudo isso está ali documentado.
Aproveito para lhe indicar um outro livro da mesma colecção que está aqui na minha estante de História em lista de espera e que suponho ser do interesse da autora do A Rota da Pimenta. Trata-se de Campanhas da Índia, Sofala, Goa e Malaca de Maria Benedita Araújo. Ainda não o li, mas como é a sua área fica a sugestão.
Volte sempre ao Porco que é muito bem vinda...

Dog: inteiramente de acordo com a tua observação sobre a relação literatura-história. Houve uma altura em que, como reacção a uma certa História mais romanceada, caiu-se no extremo oposto, em que os livros de História só falavam de taxas de produção de beterraba, de consumo do milho e da castanha nos períodos y ou z na região do alto douro e coisas que tais.
Talvez seja possível um meio termo, uma História menos árida sem resvalar para o delírio romanesco. Até porque a literatura é uma forma devidamente habilidade de dar a ver as verdades.
Viriato dos Santos

Anónimo disse...

habilitada
Viriato burro dos santos

Daniel Abrunheiro disse...

Completamente de acordo, Viriato. É ver o caso absolutamente maior de um gigante da historiografia abençoado pela arte da escrita: Georges Duby.

Anónimo disse...

Porra, escapou-me o nome.

Anónimo disse...

Ah és tu cão... Eu tava a ver, daniel abrunheiro, daniel abrunheiro, but who the fuck is daniel abrunheiro?
Viriato dos santos

Anónimo disse...

Ah és tu cão... Eu tava a ver, daniel abrunheiro, daniel abrunheiro, but who the fuck is daniel abrunheiro?
Viriato dos santos

Anónimo disse...

A Viriato dos Santos.
É simpatico ser bem vinda num club de homens, mas não tenciono abusar, só quando houver assunto ao meu alcance, como foi este seu post, darei o meu contributo. Agora vou ler os livros sobre Aljubarrota e Alcacer Kibir e logo que os tiver lido, lhe darei a minha opinião. Ainda não apurei como é que isso se faz, mas lá chegarei. E, já agora aproveito para me meter na sua conversa com Dog, Não sei se é o mesmo que Cão.. Theresa S. de Castello Branco
A Dog
Quando se trata de literatura-história, no campo especial de história militar, a literatura tem pouco a dizer, porque a verdade supera toda a imaginação. Não sei se o livro de Norman Mailer é aceite “quase” como história, se os historiadores . e, o que também conta, os participantes – o sentiram como verdadeiro. A Guerra de 1914 produziu nessa materia unicamente o ‘A Oeste nada de Novo’. Para a guerra franco-alemã de 1870, é que há um livro que - apesar de se apelidar de romance - podia ser incluido numa sua bibliografia, é “La Débacle” de Zola. Esse sim, que se leia o livto antes ou depois dos livros históricos que se ecreveram sobre essa guerra, sente-se que Zola está a escrever sobre o que aconteceu e como aconteceu. Houve um tempo em que faltaram os testemunhos dos participantes, mas. logo que os houve, a historia militar passou a ser escrita de outra forma, e basta consultar na Amazon amerciana a rubrica “World War Two”, para constatar que qualquer memória de militar alemão -- desde o mais baixo ao mais alto -- é imediatamente traduzida, comentada e lido com avidez. E isto apesar de excelentes historiadores militares.Theresa S. de Castello Branco

Anónimo disse...

Quando a Theresa diz que "a verdade supera toda a imaginação", imagino que se refere à fixação objectiva dos "factos" sem interferência de metaforizações mais ou menos estéticas.
De facto, uma coisa é assentar a fundação da nacionalidade numa terça-feira de 1143 e bem outra é cercar essa manhã afonsina de brumas sebastiânicas. OK. Tudo bem. Mas pergunto cortesmente: é lá possível imaginar, por exemplo, a história da Irlanda do século XX sem o "Ulysses" do Joyce!?
E as expatriações franquistas, aqui mesmo ao lado, sem o "Galíndez" do Montalbán? E na II Guerra Mundial à la français, o "Vol de Nuit" do Saint-Exupéry? E toda a Guerra Fria sem o Le Carré?
Já vê, Theresa, que a verdade tem tantas arestas quanto a imaginação.
Mais: ficção por ficção, é na "História" à la portugaise que ela mais mora e demora: veja-se o anedotário dum tal "professor" JHermano Saraiva...

Anónimo disse...

Tem razão, Cãodog. A minha bacorada nasceu da prévia conversa com Viriato que era sobre batalhas, sobre actos poramente militares. Meti-me na vossa conversa, ainda às voltas com esse assunto, quando o seu era completamente diferente. Eu estava a falar em História militar, era em relação a essa, e à nova forma de a encarar e escrever que eu falava. Estávamos a falar cada um para seu lado. O que qm todo o tipo de conversas pode acontecer. Pelos vistos até em blogues. Desculpe a bacorada Theresa S.de CºBº

Anónimo disse...

Theresa, bacorada nenhuma. Faz todo o sentido o que observou. E Deus me livre de ter a razão do meu lado. Acho apenas isto: que nenhum lado da realidade (ficção incluída) é escamoteável. A Theresa também, certamente. "Guerra e Paz" do Tolstoi é tão historicamente napoleónico, por assim dizer, quanto o Napoleão lui-même. Venha sempre cá, Theresa, e perdão pelas outras bacoradas com que nos entretemos uns aos outros.