29/01/09

Passarada dum raio, por Senhor Lord of the Flies

O caso que vou relatar não é novo, mas é eterno enquanto dura, como dizia o poetinha a propósito das erecções.

Dá-se então o caso de a ponte Rainha Santa Isabel, em Coimbra, ter umas barreiras transparentes com uns pássaros desenhados, que eu pensava que tinham meros propósitos cénicos. Olha que lindas andorinhas; deve ser uma homenagem às andorinhas de louça que as nossas avós e avôs mais apaneleirados penduravam nas paredes de suas casas - dizia eu para mim, sonhador, olhando nostalgicamente para as avezitas, quando por lá passava, enquanto chocava com as traseiras dos volvos em rota para carregar brita em Pombal. Muito fui eu a Santa Clara só para ver as andorinhas da ponte, caramba…

Afinal, soube agora, aquilo não são andorinhas, mas sim aves de rapina destinadas a espantar os passaritos, evitando que choquem com as barreiras. Ora aqui está: toda a gente sabe que os passaritos são demasiado espertos para serem enganados com desenhos. Aves de rapina mas é o tanasdávó! - pensam eles - aquilo alí à frente são é grafites! Bute lá esborrachar as nossas cabeças, malta penosa! Banzaaaai! E pumbas, é assim que muitas lá falecem, indo-se acolher no regaço do São Francisco de Assis. As crentes. As agnósticas ou adeptas do União de Coimbra são simplesmente depositadas no aterro sanitário municipal ou recolhidas para fritadas pelo pessoal do Hotel da Quinta das Lágrimas, ali ao lado, sobretudo para servir a malta que vai lá jogar golfe e almoçar no restaurante, os patos.
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Mas assim ou assado, o facto é que esta mortandade passaral aborreceu algumas associações ambientalistas – de pessoas que se associam para se aborrecer com coisas destas, precisamente - e a Câmara Municipal, motivando reclamações junto da empresa Estradas de Portugal, EP, responsável pela ponte e por desenhar pássaros nas pontes, as propriamente ditas obras de arte das infra-estruturas rodoviárias. Que a coisa não funciona como devia, patati, patata, piupiupiu quáquáquá.

A resposta da empresa pública foi caros senhores, em referência à exposição tantos, temos a informar que nem aquela area está classificada como area protegida, nem aqueles pássaros correspondem a espécies protegidas ou têm algum estatuto de conservação, do que se conclui que os pássaros não têm nada que se queixar, porque a lei não os autoriza a tal atrevimento e aliás aliás nem morrem assim tantos como eles alegam. Ou seja, em rigor e nos termos da lei não há nenhuma diferença entre pedras de granizo e as cabeças destes pássaros rafeiros. Desenhar pássaros nos painéis já foi um zelo excessivo de um homossexual que nós aqui temos amante dos pássaros, se não resulta, não resulta, paciência, a bem da nação, obrigados e sem mais de momento, com os melhores cumprimentos.

Portanto, os pássaros que não pertencem ao Country Club nem têm anilha de brasão, se ninguém o fizer por eles, devem eles próprios acautelar-se preenchendo e entregando um formulário, requerendo pela sua saudinha que sejam dignos de protecção, enquanto vão ao outro lado da ponte buscar minhocas para os seus pobres filhinhos que aguardam no ninho. Ó filhos, vós sois mais que as mães e a gente não dá conta da papelada e olhem lá, morrendo muitos de vocês, talvez a gente vos carimbe com o estatuto de aves raras e se safem vão lá à vossa vida. Assim como há senhoras e mulheres, há aves e há pássaros. Olha, se por exemplo fosse o Pato Donald a dar lá com os cornos, era um valha-me deus de conflitos diplomáticos com a Casa Branca.

Bom, a bem da verdade, que ainda vou a tempo, a irmandade dos Lords of The Bridges também diz, no final do mesmo comunicado, num arroubo de caridade transbordante, que vai ver o que pode fazer pelos animais e fala em monitorização, avaliação da necessidade de reforço de medidas, quaquaqua. O que deve ter sido uma revolução epistemological que merece a admiração geral da Nação. Isto de decidir de repente coisas que não estão previstas em directivas comunitárias e diplomas publicados em Diário da República não está ao alcance de qualquer um, não está não.

Mas ó senhores, até eu, eu que quebrei algumas tibias de passaritos em puto com alguns costelos armados nos pinhais das gândaras e que, por isso, só a salto e de noite devo chegar ao Céu, eu que até comi gaivota (sabe a papel canelado, se bem me lembro), fiquei, como dizer, mais tonto com tudo isto do que se tivesse marrado com a cabeça num pilar da ponte ornitófoba. Compreendeis o que quero dizer, ou quereis um regulamento comunitário para esclarecer?

5 comentários:

Anónimo disse...

Por caridade, alguém me coloca aí uma fotografia de um passarito, um pardalito? Obrigado, como de costume.

Lord of The Flies

Anónimo disse...

O raio da passarada a esmurrar a cornadura no pexiglass da ponte é mau mas é de fácil solução. É evidente que a solução daquilo é a JAE ou o IEP ir gastar mais uns milhões em pexiglass topo de gama que se desvia da malta asada. Mas a solução é muita simples. É permitir que logo em baixo da ponte e do pexiglass e onde a passarada cai se abra um Zé Manel dos Ossos com as frigideiras cheias de azeitinho a ferver a ferver. E a malta abanca e agradece. À passarada, ao Zé Manel e ao pexiglass.

EnginheiroTénico

Anónimo disse...

eu quero é uma revolução epistemológica

lampreia

Anónimo disse...

E pronto Senhor Lord: já lá está o pic. Que melhor homenagem a este magnífico post que uma foto do Mestre no melhor filme sobre passarada que alguma vez foi feito?
Poupas

Anónimo disse...

Está porreiro o pic, obrigado ó passarão.

Lord das moscas