Há muitos anos, sempre para mais de 16, quando andava eu nas minhas rondas de paquete jurídico, pelas aldeias dos arredores de Coimbra, dei comigo numa saleta de agricultor, modesta e apertada, onde pontificavam quatro reproduções de pinturas conhecidas. Obviamente más reproduções. Além do eterno e sempre presente Menino a Chorar, com a lágrima a escorrer, uma coisa em forma de assim, que ainda ando para descobrir de quem é, lá estava também a sempre presente Menina a Ler do Fragonard e o eterno Carro do Feno do Constable. Coisas apelativas e sempre presentes neste tipo de saletas rurais. Destoava do conjunto a presença d`Os Comedores de Batatas de Van Gogh. O quadro é uma brutalidade de negritude, rudeza e pessimismo. É uma ode ao negro, é tudo menos apelativo e destoava dos outros três. Cumpridas as formalidades do trabalho jurídico e em plena feitura das honras da casa, com o sempre presente copázio de carrascão, a que era impossível dizer não, lá expus a minha curiosidade:
- Ó Ti Custódio, aqueles três quadros são o oposto daquele ali, aquilo até mete medo, home!
- Ó Dr. aquilo é tudo coisas que nós trouxemos da Bélgica. Aqueles três “xaropes” são da minha mulher e da minha filha. Este aqui é meu. Está aqui desde que a gente regressou e é uma guerra permanente com “as minhas mulheres” mantê-lo ali. Mas dali aquilo não sai. Já me disseram que é de um tal Van Gogo e que é horrível, mas horrível ou não, aquilo é a miséria da minha família em pequeno, que eu bem me recordo de como jantávamos. Aquele é o meu pai, ali a minha mãe e só falta o número certo de filhos, porque nós éramos 9, mas aquilo é a miséria que eu passei antes de ir prá Bélgica e daquela parede aquilo não sai, doa a quem doer!
Nunca mais encontrei ninguém que gostasse tanto d`Os Comedores de Batatas comó Ti Custódio da Zouparria do Monte, e muito pouca gente é capaz de gostar de um quadro tão directo, crú e rude, brutal mesmo. Estava ali, porque o tocou e o emocionou, na sua rudeza de camponês em Portugal e de pedreiro na Bélgica. E dali não saía.
Ao contrário do pensamento comum, só muito raramente os grandes da pintura atingem o nível de obra-prima. Daquelas que basta olhar e nos fulminam a todos, pedreiro ou catedrático. Gauguin das centenas de quadros que fez, ponderava ter realizado 4 ou 5 obras-primas. O resto eram primas da obra. Com os Comedores de Batatas, Van Gogh atingiu o Ti Custódio da Zouparria e atingiu pela primeira vez a Obra-Prima.
- Ó Ti Custódio, aqueles três quadros são o oposto daquele ali, aquilo até mete medo, home!
- Ó Dr. aquilo é tudo coisas que nós trouxemos da Bélgica. Aqueles três “xaropes” são da minha mulher e da minha filha. Este aqui é meu. Está aqui desde que a gente regressou e é uma guerra permanente com “as minhas mulheres” mantê-lo ali. Mas dali aquilo não sai. Já me disseram que é de um tal Van Gogo e que é horrível, mas horrível ou não, aquilo é a miséria da minha família em pequeno, que eu bem me recordo de como jantávamos. Aquele é o meu pai, ali a minha mãe e só falta o número certo de filhos, porque nós éramos 9, mas aquilo é a miséria que eu passei antes de ir prá Bélgica e daquela parede aquilo não sai, doa a quem doer!
Nunca mais encontrei ninguém que gostasse tanto d`Os Comedores de Batatas comó Ti Custódio da Zouparria do Monte, e muito pouca gente é capaz de gostar de um quadro tão directo, crú e rude, brutal mesmo. Estava ali, porque o tocou e o emocionou, na sua rudeza de camponês em Portugal e de pedreiro na Bélgica. E dali não saía.
Ao contrário do pensamento comum, só muito raramente os grandes da pintura atingem o nível de obra-prima. Daquelas que basta olhar e nos fulminam a todos, pedreiro ou catedrático. Gauguin das centenas de quadros que fez, ponderava ter realizado 4 ou 5 obras-primas. O resto eram primas da obra. Com os Comedores de Batatas, Van Gogh atingiu o Ti Custódio da Zouparria e atingiu pela primeira vez a Obra-Prima.
Sem comentários:
Enviar um comentário