20/03/07

O meu Disco Sound, por Travolta do Tovim


Eu sempre gostei do disco sound. Daqueles pianos transformados em sintetizadores, das guitarradas sacudidas à Shaft, dos ritmos wah-wah, das percussões tribalistas-electrónicas a marcar o ritmo numa caixa de sons. Naquele tempo e tardiamente, chegava cá um programa à televisão uma vez por semana com as novidades vindas directamente dos States – começava com a voz de feirante do DJ: “…from Miami, Florida, the capital of disco-sound…. DISCOOOOO SEVENTY SEVEN!”. Depois era um desfile de meia hora numa pista acetinada com loiras boas e sorridentes acabadas de sair de um anúncio da Pepsi, e negras amulatadas com cabeleiras Hair e lábios de broche-batôn-brilhante, calças de ganga apertadinhas no cu e bainhas à boca de sino, a dançar sob as luzes de bolas de espelho e a bombar ancas em close-up volumétrico ao som dos lendários Rasputine e Daddy Cool dos Boney M, do frenético Le Freak dos Chic, e por aí fora, de Love to Love You, Baby, da Donna Summer a Staying Alive dos Bee Gees, sempre a dar-lhe!

E depois, havia toda aquele armário de adereços que fizeram moda, hoje absolutamente caricatos e de gosto duvidoso, kitsch, démodé, obsoletos, ou o que lhes quiserem chamar, mas que atire a primeira pedra quem nunca, uma vez pelo menos, calçou um sapatão de tacão arranha-céus, ou nunca vestiu uma daquelas camisas com colarinho asa delta, os três botões de cima desapertados a mostrar a pelugem na peitaça Macho Man!

Sim, bem sei, ouvia-se o Live in Tokyo dos Deep Purple em cassetes piratas e aquilo era do outro mundo, o Sammy Hagar rasgava a guitarra como só o Jimmy Hendrix o tinha feito até então, os AC/DC regressavam melhores do que nunca no Back in Black, já com o Brian Johnson aos berros como se tivesse um ataque de apendicite, depois da overdose do Bon Scott, e os Led Zeppelin eram a melhor banda de sempre…! Mas, num sábado à noite, quando a febre dos bailes de garagem enroscava uns slows à socapa e uns copos de Macieira à descarada, o que é que se dançava no entremeio? Pois.

Para mim, foi de transição breve, contudo, o disco sound. Os oitenta rebentaram em cena com o rock futurista dos Duran Duran e dos Classic Noveaux, evoluções electrizadas que beberam na caixa de ritmos do disco-sound – subtraíram-lhe os coros, esticaram as batidas, centraram o efeito dramático na voz do vocalista. E resultou muito bem. Foi a morte anunciada do disco-sound e o prenúncio de uma safra de enorme riqueza no advento de estilos desde o Punk ou a New Wave - com a exuberante Lena Lovich à cabeça-, até à evolução disco-pop dos Pet Shop Boys, passando pelos ABC, Tears for Fears, Blondie, Ultravox, Bronski Beat, Soft Cell ou Frankie Goes to Hollywood, para citar apenas uns poucos quantos.

Mas foi no disco sound que tudo começou. Na dance-music de refrão fácil e fatos de lantejoulas, piruetas em palco e berimbaus com efeitos espaciais. Nas vozes apaneleiradas dos Village People e na dor de corno da Gloria Gaynor quando abria I Will Survive: “first I was afraid, I was petrified…” Desde o Tony Manero que engolia o spaghetti católico em casa de segunda a sexta, e depois arrasava a pista na noite de todos os sábados ao som dos Bee Gees, para se manter vivo. Passando pela catedral Studio 54 em N.Y. onde eu nunca fui, até à garagem do Esgalhão, cujo pai era peixeiro e, com a venda do peixe no Tovim do Meio, deu para comprar uma aparelhagem Sharp com colunas, subwoofer e leitor de cassetes. Aí é que eu fui sempre. E aquilo é que era curtir, Meu Deus!

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