13/05/07

O Elogio de Lourenço

Vitorino Magalhães Godinho, Vasco Pulido Valente, Fernando Catroga e Eduardo Lourenço são, na minha opinião, os mais brilhantes intelectuais portugueses vivos. Todos têm em comum a portucalidade como objecto, o discurso histórico reflexivo como método, o género ensaístico como forma preferida de expressão, a pedagogia indissociável do discurso ideológico, a desmistificação e dessacralização da memória colectiva, o descomprometimento em relação a qualquer ortodoxia, o rumo errante que não compromete a coerência da obra e a profundidade do pensamento.
Filiam-se numa tradição que remonta ao idealismo racionalista e que vê no exercício da crítica um caminho de libertação e afirmação da subjectividade que se compromete, contudo, com a História e com as grandes ideias enformadores da Humanidade. Uma tradição que, em Portugal, recolhe raízes em Verney e prossegue a memória de Herculano, da inquietação da geração dita de 70 e de Antero, o seu vulto cimeiro, de António Sérgio e do seu magistério reformador, para citar apenas algumas referências. É o melhor que Portugal tem.

Vem isto a propósito de uma imperdível entrevista que Lourenço dá à revista «Pública» de hoje. As suas origens, a ruralidade beirã, a memória vaga do Porto, difusa na névoa da primeira infância, a formação em Coimbra e o contacto com os neo-realistas, Torga, Régio, Paulo Quintela, Carlos de Oliveira e outros. O seu catolicismo matricial, o elogio de Bento XVI, o iberismo com fundamento de uma identidade, o contacto com a cultura francesa, a vivência do Maio de 68, o comunismo ortodoxo e o papel da Rússia na relação com a Europa, o juízo que faz sobre Steiner, as suas leituras, Pessoa e muitos outros temas que fazem de Lourenço o mais brilhante analista da portucalidade. Conhecê-lo é conhecermo-nos. Sobre poucos se pode dizer semelhante coisa.

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